Passeando um dia pelo interior do país, deparei-me com um imenso canavial. Vi um menino cortando cana. Era negrinho, da cor da cana queimada.Era uma criança miúda, doze ou treze anos, ligada com a pureza pelo cordão umbilical. De mãos hábeis. Manipulavam o facão com uma força sem igual. Cada golpe forte, brutal, trazia a ganância do usineiro que explorava mão-de-obra infantil, como se fosse normal, como é pelo interior do Brasil. Num segundo eterno a tragédia fez do menino uma vítima fatal: o facão tão amigo, companheiro, virou seu inimigo e ceifou-lhe a inocência de uma infância angelical. Virou um aleijado bóia-fria, agora um escravo da produção de açúcar que na manhã adoça meu café, que bebo e jogo o resto na pia. Todo dia, jogamos um pouquinho do menino-bóia-fria, pelo sujo ralo da pia.
Nota do Editor: Douglas Mondo é advogado, escritor e presidente da Tv Japi Mais.
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