Hoje, ao procurar crédito, o bom pagador paga pelo mau, pois o risco de inadimplência é repassado de forma igual
Muito se fala sobre o aumento da inadimplência e do endividamento da população. A evolução do crédito para pessoa física, muitas vezes rotulado como crédito fácil, e as elevadas taxas de juros são freqüentemente apontadas como justificativas para o fenômeno da inadimplência. Em parte, são. Resta saber quais são os outros fatores de impacto, além da Selic. É necessário elencar também a metodologia para concessão de crédito, pois as partes envolvidas são duas: o consumidor e o concedente. O crédito é o grande financiador da atividade econômica em qualquer economia moderna e competitiva, pois financia o consumo e a produção, gerando emprego e renda. Por isso, o crédito na China representa 102% do PIB e nos EUA 86%, entre tantos outros exemplos. No Brasil, o crédito é 32,6% do PIB. O atual crescimento do crédito no país não é uma questão conjuntural. É estrutural. A expansão do crédito chegou tarde, por conta da inflação crônica, mas veio para ficar. O que os agentes econômicos devem ter em mente na questão do crédito e da inadimplência é que em nenhum contexto se baixam juros por decreto. Os pontos estruturais para esse movimento nos juros são: a queda do recolhimento compulsório sobre os depósitos bancários e a redução dos impostos incidentes sobre o crédito. Ambos têm forte participação nos "spreads" e dependem de mudanças nas políticas monetária e tributária. Essa última exigirá negociação no próximo governo, bem como a monetária dependerá de diretriz do Banco Central. As formas de concessão de crédito (vendas a prazo e empréstimos) por boa parte do mercado, contemplando a tecnicidade e a qualidade nessas decisões, por meio de avançadas tecnologias de crédito, precisam ser aprimoradas. O cadastro positivo tem sido apontado, inclusive pelas autoridades monetárias e econômicas, como uma importante solução para a redução das taxas de juros. E é. Não só no Brasil, mas já comprovada em várias partes do mundo. Esse instrumento é muito utilizado nos países reconhecidos como excelência em crédito, como EUA e Reino Unido, nos quais as taxas de juros são consideradas referências. Vários países emergentes, como a Austrália, a Nova Zelândia e a África do Sul, estão implantando o cadastro positivo, com vistas ao crescimento sustentado de suas economias. Estudo de John Barron (professor da Purdue University, EUA) e Michael Staten (professor da Georgetown University, EUA) mostra que a inadimplência em 50 países que adotaram o cadastro positivo chega a ser 43% menor do que naqueles que utilizam só informações negativas. Além disso, com a cultura e prática das informações positivas, há um aumento de 90% no número de pessoas que solicitam crédito e são atendidas. Qual a grande mágica do cadastro positivo? Não há mágica. O cadastro positivo é uma metodologia moderna de conceder crédito, no qual o comportamento financeiro de seu pretendente (ao crédito) é analisado a partir de informações compartilhadas entre os diversos setores da economia (mercado financeiro, comércio, indústria e serviços). Assim, o que se considera é o relacionamento financeiro dos consumidores, no qual são valorizados os fatos positivos, ou seja, os pagamentos honrados, e não os eventuais fatos negativos, que são os pagamentos não honrados, e que hoje no Brasil são superdimensionados. No atual mercado de crédito brasileiro, o bom pagador paga pelo mau pagador, pois o risco de inadimplência é repassado a todos os que procuram crédito, o que gera uma elevação na taxa de juros de forma indiscriminada. Com o cadastro positivo isso não ocorre, pois cada um paga o risco que efetivamente representa. O próprio contumaz pode se candidatar ao crédito, porém ele pagará, individualmente, o seu alto risco, enquanto o bom pagador, a grande maioria dos brasileiros, pagará taxas menores. A par dessa avançada, e até por que não falar justa e democrática, solução para concessão de crédito, a Serasa a mantém pronta para o mercado brasileiro desde 1997, após cinco anos de desenvolvimento, com a denominação de Credit Bureau, mantendo motores ligados para implementá-la a qualquer momento. É oportuno que se resolva agora a questão do cadastro positivo, que está suspenso como conseqüência de decisão judicial que tornou os custos operacionais inviáveis. Ele certamente contribuirá para o crescimento econômico do Brasil às taxas almejadas por todos. Nota do Editor: Elcio Anibal de Lucca, administrador pela EAESP-FGV, é presidente da Serasa.
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