Você sabia que o bichinho voador que mordeu seu tornozelo, que está coçando de forma infernal, é um Simulium spp, ou melhor, um díptero pertencente à família Simuliidae, conhecido popularmente como borrachudo? Pois é, essas amáveis criaturas de diminutas dimensões (de 1 a 5mm de comprimento), cor escura, pernas curtas, asas largas e jeitão de corcunda, estão prestes a invadir nossas praias, com conseqüências imprevisíveis para o turismo. Na verdade, só estou escrevendo estas "mal traçadas linhas" porque a invasão já começou, mas só foi sentida com a chegada do calor, bastante atrasado neste ano santo de 2004. O Litoral Norte de São Paulo é um excelente habitat para esse insetos, que passariam desapercebidos não fossem as fêmeas apreciadoras de sangue. Elas primeiro seduzem os machos, verdadeiros santos, que se alimentam de seiva vegetal e, depois de saciar sua lubricidade, ainda mordem nossos calcanhares. Pérfidas! Tudo com o intuito de produzir borrachudinhos, que exibem orgulhosas para as amigas perguntando: - Não é uma gracinha? Os ovos são postos em água corrente, sendo as cachoeiras ou corredeiras de água límpida, sobre pedras, os principais criadouros. São capazes de voar longas distâncias, mas permanecem geralmente perto dos criadouros. Em regiões montanhosas com cachoeiras e em algumas praias, a população de borrachudos pode crescer a ponto de prejudicar o turismo. São ariscos e sua picada é característica: terminada a refeição vampiresca, em que o sangue da vítima é sugado, surge no local da picada pequena tumoração, com um ponto central vermelho. Pessoas sensíveis podem manifestar forte irritação, dor e edema, além da indefectível coceira que dá vontade de pegar o borrachudo, amarrar na ponta de um alfinete e torturar, arrancando patinha por patinha e depois as asinhas! E no fim dizer para o toquinho restante: - Conheceu papudo!

Combate aos borrachudos em Ubatuba

No Litoral Norte, a primeira iniciativa de controle dos borrachudos deu-se em 1957, com aplicação de DDT e BHC de forma aleatória nos rios, com a finalidade de diminuir a densidade larvária. A partir de 1971, a SUCEN (Superintendência de Controle de Endemias) através do Programa de Controle de simulídeos, passou a utilizar inseticida químico, para terror dos bichos-grilo, até que em1986, o laboratório de Simulídeo de Caraguatatuba da SUCEN implantou, depois de estudos preliminares, um novo larvicida biológico a base de Bacillus thuringiensis var. isrealensis (B.t.i.) que é utilizado até hoje. A partir de 1995 o serviço foi municipalizado, isto é, os funcionários da SUCEN passaram para o controle do município, e aí começou a ser desenhada a situação que existe hoje.

Como agir de forma eficiente?

Fiz essa pergunta para um técnico. Como varrer esses seres malignos da face do planeta? Ele respondeu que isso é impossível, mas dá para manter as praias freqüentáveis. Para isso são necessários 36 homens, divididos em 5 equipes, cada uma com um veículo. Com esse time seria possível cobrir os 793 focos, onde há 2685 pontos para serem tratados. É isso mesmo, os funcionários têm de entrar no mato, lutar com cobras, onças e o escambau, subir montanhas e colocar o tal do B.t.i. em cada um dos pontos, a cada catorze dias. É mole? Essa seria a situação ideal. Como sabemos, entre o ideal e o real há uma certa diferença.

Como agir de forma eficiente com o que temos?

Primeiramente vamos comparar o que temos com o que precisaríamos ter. Precisaríamos de 36 homens, temos 14. Precisaríamos ter 5 veículos, temos 4, quando eu colhia estas informações 3 estavam fora de combate, durante a entrevista chegou a notícia da quebra do quarto. Então resumindo: temos 14 homens e nenhum veículo para cobrir 2685 pontos de criação desses verminhos alados - detesto borrachudos! - pontos estes espalhados por 100 quilômetros! Dois abnegados funcionários têm feito o que dá com suas bicicletas. Apesar da louvável boa vontade, o resultado é pífio, como não poderia deixar de ser.

Como está a situação?

Certas perguntas, seria melhor se não fossem feitas, mas já que perguntei, vou responder. Do ponto de vista do combate aos borrachudos, o município de Ubatuba divide-se em três regiões.

Região Sul - Compreende desde a divisa com Caraguatatuba até a praia da Enseada. Lá não se aplica o B.t.i. desde o dia 22 de junho.

Região Centro - Desde a praia das Toninhas até Itamambuca, passando pelo alto da serra. A última aplicação foi feita no dia 6 de agosto.

Região Norte - Vai de Itamambuca até a divisa com o Rio de Janeiro. Nesta região ainda estavam sendo feitas aplicações. Poucas é verdade, mas sinceras. Com a quebra do veículo restante, cessarão, restando apenas as feitas com bicicletas, antes que furem os pneus.

Finalizando

Esta é a situação calamitosa em que se encontra o controle dessa praga que só serve para afastar turistas. Turismo é disciplina de múltiplas faces, dentre elas, conforto ambiental. Nada mais desgastante do que ser atacado por borrachudos, dá vontade de ir embora, muitos turistas fazem isso. A cidade gostaria de saber a razão de tanto descaso com um setor tão importante para todos que aqui vivem. Com a palavra as autoridades responsáveis.