O Projeto de lei nº 122, de autoria do senador Marconi Perillo (PSDB-GO), aprovado em janeiro, já tramita em regime de prioridade na Câmara dos Deputados, onde foi apensado a outras duas proposições similares. O PL determina que os candidatos aprovados em concurso público, no limite das vagas oferecidas no edital, têm direito à nomeação no período de validade do concurso, desde que existam cargos vagos suficientes. O objetivo é coibir a chamada "indústria do concurso", situação na qual órgãos públicos realizam concursos com milhares de candidatos e depois não nomeiam os aprovados. Junto com outro projeto que já tratava do assunto - o Projeto de Lei 6778/2010, de autoria da deputada Angela Portela (PT-RR), no dia 17 de março a proposta de Perillo entrou em regime de prioridade para apreciação conjunta e, em abril, teve apensado outro projeto que proíbe a realização de concurso público "na existência de outro válido", do deputado Roberto Magalhães (DEM-PE). Depois de aprovado pelo Senado, o PL de Perillo recebeu na Câmara dos Deputados novo número - PL-6582/2009. Existem mais de 15 projetos de lei na Câmara com o objetivo de disciplinar os mais variados aspectos dos concursos, incluindo itens como fim da limitação da idade mínima, a obrigatoriedade de divulgação dos editais e gabaritos em braile, normas relativas à exigência de língua estrangeira, entre outros temas. Na avaliação do advogado Marcio Pestana, professor de Direito Administrativo da Faculdade de Direito da FAAP, o projeto de lei já aprovado no Senado veio em boa hora. Desde a promulgação da Constituição, em 1988, que tornou mais clara a obrigatoriedade da realização de concurso público para o preenchimento de cargos na administração pública, o tema precisava de uma regulamentação. "A não nomeação ou contratação, após a realização dos concursos, não pode se transformar em regra, em prejuízo de milhões de candidatos que se dedicam anos ao estudo, investem tempo e dinheiro em cursos, para depois de aprovados serem descartados", esclarece Pestana. Embora esteja prevista na legislação, a não nomeação de candidatos aprovados não pode ser utilizada pelo administrador público com frequência, sob pena de revelar um completo descontrole e falta de planejamento. "Se determinado órgão público chega à conclusão de que precisa contratar 50 ou 100 funcionários, é no mínimo estranho que, depois de poucos meses, venha a público e informe que não possui recursos para pagar os salários ou que a necessidade de novos servidores desapareceu", pondera o advogado. O PL aprovado pelo Senado está em sintonia com o entendimento do Judiciário. Segundo o professor da FAAP, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que "o concurso que não tem todas as vagas preenchidas durante o prazo de validade, em razão da desistência de candidato inicialmente habilitado dentro no número de vagas previsto em edital, gera direito subjetivo à nomeação do classificado na posição imediatamente subseqüente". Com esse entendimento, no ano passado o STJ acolheu recurso de um candidato classificado em 49º lugar em concurso no Estado da Bahia, cujo edital previa 48 vagas. Ele passou a integrar o rol dos 48 classificados dentro do número de vagas previstas no edital, já que o aprovado na 32ª posição fora eliminado. O Tribunal assegurou a nomeação do candidato com o argumento de que a aprovação em concurso público, dentro do número de vagas previstas no edital, ocasiona direito subjetivo do candidato a ser nomeado para o cargo. Pestana lembra que existem diversos precedentes neste sentido citados pelo relator do caso, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, do STJ, que enfatizou o princípio da moralidade ao sustentar o direito à nomeação do candidato aprovado. Outro entendimento do Judiciário em favor dos concursados é a proibição de contratações temporárias em áreas onde foi feito concurso público recente para preenchimento de vagas, enquanto este ainda é válido. O STJ já decidiu que a contratação temporária ou precária ofende o direito dos aprovados. Abusos A organização de concursos públicos é fiscalizada, em geral, pelo Ministério Público. Segundo Pestana, os problemas dos concursos podem ser detectados já na fase de preparação do certame, quando há uma concorrência pública para escolher a empresa que aplicará as provas. Depois, por ocasião das provas, somente os problemas relacionados com a organização, como horário de início e término e fiscalização dos locais das provas, podem ser questionados judicialmente. "A indicação equivocada do local de realização das provas e falta de caderno de questões já foram motivos para a anulação recente de concursos", recorda Pestana. A presença de parentes de candidatos na organização do concurso também é motivo de anulação. "Um concurso público realizado para o cargo de cirurgião-dentista da Secretaria de Saúde do Distrito Federal acabou anulado porque o concorrente classificado em primeiro lugar era parente de um dos membros da banca examinadora", afirma Pestana. O conteúdo das provas, porém, não é passível de análise pelo Judiciário, explica o advogado. "Não compete ao Poder Judiciário apreciar os critérios utilizados pela administração na formulação, correção e atribuição de notas nas provas de concurso público, quando fixados de forma objetiva e imparcial". Mas se houver indícios de favorecimento ou fraude ostensivos, o concurso pode ser anulado. Pestana cita o caso de um concurso realizado em Pernambuco, que tinha todas as alternativas corretas na letra "A", que foi anulado pela Justiça Federal, atendendo a pedido do Ministério Público Federal "Se determinado candidato resolvesse "chutar" apenas em uma única alternativa, da primeira até a última a letra "A", ele seria aprovado". Indenização Na opinião de Pestana, que acaba de lançar a segunda edição de sua obra - Direito Administrativo Brasileiro (Editora Campus - Elsevier), embora tenha apenas dois artigos, o PL nº 122 sinaliza a preocupação do legislador em moralizar a atividade. "O importante é assegurar que não haja abuso do poder discricionário por parte de administradores, uma postura muitas vezes irresponsável e insensível aos esforços de milhões de candidatos". Apesar de a lei não prever nenhuma penalidade específica aos administradores públicos que vierem a cometer abusos, a Justiça tem aplicado os princípios gerais de direito para indenizar os candidatos lesados. O candidato que não assume a vaga por erro ou ato ilegal da administração pública tem o direito de ser empossado no cargo e ser indenizado pelas perdas que eventualmente tenha sofrido. Um grupo de funcionários aprovados em concurso público para os cargos de técnico judiciário e oficial de justiça avaliador do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região deverá receber da União indenização equivalente aos vencimentos e demais vantagens do cargo, correspondentes ao período em que ficaram impedidos de exercer as atividades para as quais foram aprovados. O tempo de serviço correspondente ao período em que não puderam exercer o cargo também deverá ser computado para fins de aposentadoria e de vantagens da carreira. Na Câmara dos Deputados, o projeto de Perilo foi apensado para tramitação conjunta ao PL-6778/2010, da deputada Angela Portela (PT-RR), que visa também assegurar, a candidatos aprovados em concursos públicos. Os dois projetos entraram, no dia 17 de março, em regime de prioridade para apreciação conjunta.
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