É bastante comum encontrarmos técnicos de suporte desenvolvendo amizades com seus usuários e clientes. Os contatos entre ambos podem ocorrer de maneira diária. O relacionamento se estreita. As preferências pessoais de cada um acabam sendo expostas. A intimidade também. Preferências futebolísticas, hobbies, melhor barzinho, melhor forma de assar uma costela, o pior chopp é ipsilon etc. Sem contar a chance de, se forem de sexos distintos, outros interesses serem despertados. Naturalmente todo técnico deseja auxiliar seu usuário (pelo menos, os bem intencionados). E para evitar uma postura pé-atrás, seus gestos de cordialidade acabam sendo confundidos como brechas para crescimento da afeição. Também, consciente ou não, o usuário passa a usufruir dessa familiaridade para obter vantagens. Mudanças de prioridade, execução de tarefas fora do catálogo de serviços (quando este existe), jeitinhos, preferência de atenção entre usuários e um sem-fim de “barbadinhas”. Não pense nisso como uma malandragem. Mas amigos são pra isso, right? Ajudar os amigos. The problem Não é raro também quando as situações críticas acontecem, o tomador de suporte corre a livrar seu lombo das chibatadas. E quem fica exposto é o técnico. Nessas horas o arrependimento virá à tona, por ter comentado problemas internos do departamento, ou situações que outros usuários enfrentam etc. As frustrações explodirão. Esbravejará pela injustiça que o usuário cometeu, baixando a cabeça, cobrindo a face com as mãos enquanto ergue as sobrancelhas e exclama: “- Como ele foi me dedurar dessa maneira? Justo eu que mudei a prioridade dele para ser atendido antes e ele vai e comenta isso no refeitório?” Corrigindo comportamentos... É difícil remover esse modelo mental da cabeça do técnico. Se ele chegou ao suporte, é por que gosta de ajudar as pessoas. Na família, é o cara dos computadores. Quem sabe até no prédio. No clube. E querido por todos (de maneira interesseira ou não). Fato é que, desenvolvendo sua personalidade com o passar do tempo, admitir que precisa lidar com os usuários com determinado distanciamento é algo desanimador. Mostras de rebeldia são comuns. Declarações respiradas nos corredores como “- Pô, esse supervisor não sabe nada!”. Quem sabe o técnico até concorde racionalmente com as explicações. Mas o cotidiano o trai. E ele repete os erros de considerar o usuário/cliente como amigo. Como sair dessa... It’s not easy. Crescer (profissionalmente) exige mudanças. Sacrifícios. Novas posturas. Errar, acertar, errar novamente. Talvez até mesmo o gerente não se dê conta que “usuário não é amigo“. Talvez ele desenvolva relações para obter vantagens com os departamentos ou até benefícios na pesquisa de satisfação ou algo parecido. Nesses casos, ninguém apontará essas situações e conflitos que aparecem serão considerados como “cólicas normais da profissão“. Bom, antes de qualquer coisa, o grupo deve debater. Conscientizar-se da situação. É claro, não estamos falando de grandes centrais de atendimento 24 horas, com rotatividade de dezenas de funcionários nas células de atendimento. Nestas, com o DAC (Distribuidor Automático de Chamados) da central telefônica sorteando os atendentes, muito dificilmente ocorrerá a circunstância que descrevo. Mas falo (ou escrevo?) dos ambientes de suporte técnico, Help Desk e Service Desk compostos por times de 4, 8, 16, 25 (salto numérico estratégico) ou 30 pessoas. Uma boa forma é expor as adversidades passadas. As crises que aconteceram com a equipe, as confusões geradas. Quem sabe algum participante possa trazer um depoimento carregado de emoção (raiva é boa nessa hora) e indignação. Outra maneira adicional é disciplina. Regularem-se uns aos outros para não cair em tentação. Yeah, uma versão Big Brother pra turma. “- Que horror, Cohen!” você pode estar pensando. Mas se o grupo consolidar a conclusão de que isso é para melhoria comportamental, por que não?! Como diria Robespierre, “- Não se faz omelete sem quebrar os ovos.” Nota do Editor: Roberto Cohen é autor do livro “Implantação de Help Desk e Service Desk”.
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