Francisco Matarazzo Sobrinho, era sobrinho do Conde Matarazzo, imigrante italiano que começou a vida vendendo bananas em São Paulo e acabou como um dos maiores industriais, com uma rede de fábricas reunidas na capital. Ciccillo foi Prefeito de Ubatuba, de 1964 a 1969. Era conhecido como Ciccillo, apelido equivalente ao de Chiquinho, em português do Brasil. Ciccillo não era político. O único cargo político que exerceu foi o de Prefeito de Ubatuba. O grande Prefeito, honesto e competente, era empresário em São Paulo, dono e Presidente da Metalma, responsável pela produção, na época, de mais de 50% das latinhas de alumínio para refrigerantes e cervejas. Destacou-se, também, no mundo das artes, tendo criado a Bienal, que tem fama internacional O grande Assessor da Era Matarazzo na Prefeitura de Ubatuba, foi o Dr. Wladimir de Toledo Piza, que foi Deputado Estadual e Prefeito de São Paulo, então aposentado, que exerceu a função de Superintendente. Evidentemente que as idéias de Ciccillo, somadas às de grandes assessores técnicos, como Paschoal Famá, Ministro Cunha Lima, Cel. Carvalhaes, Engº Cusmanich, Roberto Carlos Norris Nielsen e outros, com experiência em Secretarias de Estado e Ministérios e na Prefeitura de São Paulo, em nada foram ofuscadas, tal o brilhantismo do grande empresário paulistano, estreante na política executiva em Ubatuba. Ciccillo era um homem honesto, inteligente e simples, apesar de muito rico. Quem teve a honra de conviver com ele, como este signatário, teve oportunidade de aprender lições de vida e participar de uma grande escola de administração pública e política municipal, escola organizada por sua brilhante equipe de assessoria. A Administração Ciccillo Matarazzo foi primada por métodos, planos e metas revolucionários para Ubatuba, não contando, infelizmente, com o apoio total da Câmara Municipal, eis que os edis, em sua maioria, achavam que ele não era bem intencionado ao deixar sua grande cidade para vir administrar uma pequena Prefeitura. Ledo engano, pois ele não deixou nenhuma pequena mancha na política local, tendo sido extremamente honesto, conceito que transmitiu a todos os servidores da Municipalidade. Ciccillo reestruturou os órgãos, cargos e funções da Prefeitura de Ubatuba, instituindo as leis básicas e o Cadastro Fiscal que ampliou desde o bairro da Maranduba até o de Itamambuca, antes centralizado na zona da sede do Município. Definiu as áreas urbanas, de expansão urbana e rurais. Antes de se candidatar, Ciccillo já contatou os três governadores da região sudeste do Brasil, para firmar compromisso político de realização da BR-101, no trecho Rio-Santos, da implantação da rede de energia elétrica (CESP), da rede de água, iniciada por uma empresa do ramo de Santos - SP, depois (SABESP), da pavimentação e reforma do aeroporto, e da rede de prédios escolares necessários ao desenvolvimento do ensino básico, realizada pelo antigo FECE (Fundo Estadual de Construções Escolares). A Administração Ciccillo Matarazzo foi primada por organização interna, métodos, planos e metas, sob o “slogan” “40 anos de progresso em 4 de administração”, estes quatro prorrogados por mais dois, tendo o mandato iniciado em 1964 e terminado em 1969. A Escola de Política e Administração do Prefeito Matarazzo foi uma escola de conhecimentos, aperfeiçoamentos e ética, o que está fora de moda na política moderna. Lembro que ao se despedir Ciccillo disse aos servidores que participaram de sua administração para organizar grupos políticos e sociais que pudessem dar continuidade a seu trabalho. Usou uma parábola simples: “A semente eu coloquei na terra, vocês devem cuidar da planta para poder colher os frutos, replantando-os, para seus filhos e netos”. Da turma que participou dessa administração, só Gio Batta Bravin e o Prof. Joaquim Luiz Barbosa candidataram-se ao cargo de Prefeito, aquele perdendo as eleições para o Dr. Alberto Santos e o último perdendo, por pouca diferença de votos, para Pedro Paulo Teixeira Pinto. Um movimento político surgiu depois da Administração Matarazzo com a denominação de USU – Unidos a Serviço de Ubatuba, elegendo seu primeiro Prefeito Celso Teixeira Leite, jornalista então recém-formado. O Celso alavancou a candidatura de José Nélio de Carvalho, com o Vice Benedito Rodrigues Pereira Filho, que também se empossou como Prefeito, por dois anos. Nélio foi Prefeito por dois mandatos. Depois José Nélio alavancou o Vereador Paulo Ramos de Oliveira, como vice de sua chapa, este Prefeito também por dois mandatos. Só que este esqueceu de manter a organização de sua base política, seguindo para outras correlações, deixando o campo político municipal livre para novos políticos, que fizeram propaganda sem raízes na base organizada pela USU, esta que também contou com o trabalho de Ernely Fragoso, Benedito Lourenço e outros, hoje já afastados da política. A USU, que se organizou apenas como sociedade de fato, não deu continuidade à promoção política, deixando o campo livre para outros políticos que viram aberta uma grande porta de entrada. Na década passada, já se via uma comunidade desintegrada, desinteressada por política municipal, decorrente, talvez, da migração operária e da miscigenação, com mudanças de costumes, donde está surgindo uma sociedade emergente. Li, recentemente, na revista eletrônica “O Guaruçá”, que a cidadania de Ubatuba já conta com muitos eleitores mineiros e nordestinos, se constituindo, no meu entender, de uma gangorra, com quase metade de eleitores de outras regiões, principalmente da cidade irmã de Ladainha, apenas outra metade de cidadãos da comunidade natural local. Em Ladainha, ao que se comenta, políticos de Ubatuba, católicos e não católicos, fazem marketing em festas de santos, visando futuros resultados eleitorais. Com o desleixo e desintegração da sociedade política e social da comunidade natural (de pessoas nascidas na cidade de familiares locais e de migrantes), não se cuidando da organização política municipal, deixaremos sempre uma grande porta aberta, tendo que viver em situação como a narrada na famosa lenda das formigas, que abandonaram seu rei, um antigo toco de madeira, e elegeram seu novo rei, um lindo passarinho, sem saber que essa ave era um papa-formigas. Gio Batta Bravin, imigrante italiano (dono de Hotel em Ubatuba), Joaquim Luiz Barbosa, procedente de Jacareí - SP (não eleitos como sucessores de Ciccillo) e José Nélio de Carvalho, procedente da cidade de Areias - SP (eleito por duas vezes), conheceram a Escola Política de Ciccillo Matarazzo, mas só o último sobrevive, embora tendo, ao que parece, encerrado sua carreira política em Ubatuba. A USU, por sua vez, se desfez, talvez pela idade de seus idealizadores, deixando, na história, sua trajetória, mas cruzando os braços no fim de suas louváveis gestões políticas. A herança política de Ciccillo Matarazzo, admirada por vários cidadãos paulistanos e ubatubanos, desapareceu, por falta de sucessor, como aconteceu com a história dos próprios Matarazzos, que tinha a maior indústria reunida de São Paulo, dirigida pelo “Conde” e não logrou sorte em ter na família um capitão de indústria para sucessão. Na família do “Conde” tinha até “play-boy”, mas capitão de indústria só nasceu o “Ciccillo” que era Matarazzo Sobrinho, mas que só quis dirigir sua própria indústria, apesar dos insistentes pedidos do tio, razão porque a rede industrial desapareceu. Rendo aqui minhas homenagens “im memoriam” ao saudoso “Ciccillo” por ter exercido apenas uma vez o cargo de Prefeito de Ubatuba, mas por ter deixado, em minha formação, os princípios de organização político-administrativa, de competência e principalmente de ética no cuidado das coisas públicas. Assim fica mais fácil de entender porque a Escola Política de Ciccillo Matarazzo, não tem mais herança palpável, a não ser nos organogramas municipais vigentes e na organização interna da Prefeitura que não mudou muito. As plantas gráficas do Plano Viário Municipal, o estudo da FAU-USP sobre o planejamento de galerias de esgotos pluviais, o Plano Diretor e outros planos de desenvolvimento, parece não constar mais das atuais políticas públicas do Município. Não bastam memoriais de simples exposições, é preciso destacar os bons políticos por suas obras, as leis que instituíram em benefício da comunidade e da sociedade, e saber dar continuidade aos planos bons que iniciaram, com reflexo no desenvolvimento econômico e social. Ciccillo denominou Ubatuba, por decreto, como a “Cidade da Primavera”, sugerindo que as casas tivessem em seus jardins essa flor, e nos muros, mosaicos das mesmas, fazendo do período sazonal, através de festas, culturais e gastronômicas, promoção e fomento do turismo local. Foi só uma idéia, sem continuidade. Hoje nem as festas tradicionais da cidade tem acontecido, folclóricas, religiosas, culturais e históricas, confundindo-se as tradições da cidade com outros ideais que não podem ser misturados com folclore e política, ficando o Município sem perfil arquitetônico, histórico, turístico e cultural. Uma cidade que poderia ter a cara da política e da marca de Ciccillo Matarazzo. É preciso resgatar a memória de Ubatuba, pesquisar sua história e sua cultura, descobrindo o “buraco negro” de seu universo histórico-cultural, desde o acidente pirotécnico que destruiu as obras literárias e livros históricos do “Atheneu Ubatubense”, sem medo de melindres, porque isso poderá ser a base e o início de um renascimento histórico. É trabalho para os nossos professores de História. É preciso discutir-se o desenvolvimento econômico de Ubatuba, sua sustentabilidade rural e urbana, a vista das aplicações da tecnologia e da ciência, não de políticas de simples propaganda e sem base jurídica, viabilizar-se políticas públicas de desenvolvimento cultural e sócio-econômico sustentável, com vistas ao fomento do turismo, a nossa indústria sem chaminés, criando-se, em primeiro lugar, um perfil urbano e turístico, com a devida infra-estrutura, em parcerias privadas e com os governos estadual e federal. Para obter-se crédito dessas parcerias é preciso criar-se a imagem política municipal de probidade e moralidade administrativa, como preceituado na Constituição Federal. É preciso criar-se órgãos comunitários de integração da sociedade urbana e rural, organizando-se a sociedade civil natural e emergente das migrações de mão-de-obra operária e qualificada, empregadas no comércio, na prestação de serviços e na construção civil. É preciso resgatar-se a indústria artesanal caiçara, desenvolvida na gestão Ciccillo Matarazzo, a pesca artesanal e a produção horti-granjeira, a par da indústria hoteleira, gastronômica, do turismo, inclusive ecológico. É preciso que se criem sociedades comunitárias para se discutir os problemas do Município e sociedades sócio-culturais para se discutir questões como a do ensino e educação, da saúde publica, do desenvolvimento econômico sustentável, não fictício, mas embasado em leis, e da integração da sociedade, como núcleo das gestões políticas institucionais. Sem isso, uma sociedade desinteressada, desorganizada, esfacelada pelo terrorismo político das retaliações e pela corrupção, não chegará ao pretendido resultado da probidade e moralidade da administração pública, instituídas na Constituição Federal, como princípio político. Nota do Editor: Claudionor Quirino dos Santos é bel. em Ciências Sociais e advogado.
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