Sentença proferida em 30/03/2012, referente à Ação Civil Pública, processo nº 642.01.2012.000264-3, 2ª Vara Judicial, Ubatuba, SP (Extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo)
Texto integral da Sentença S E N T E N Ç A VISTOS E EXAMINADOS estes autos de Ação Civil Pública com pedido de liminar, processo nº15/12 proposta pelo Município da Estância Balneária de Ubatuba em face de Fábio dos Santos Cruz Diversões-ME. A PREFEITURA DO MUNICÍPIO DA ESTÂNCIA BALNEÁRIA DE UBATUBA ingressou com a presente demanda, pleiteando a procedência total da ação de modo a condenar a ré da seguinte maneira: 1 - obrigação de não fazer consistente na proibição de abrir seu estabelecimento comercial, sendo-lhe vedado o exercício de sua atividade naquele local sem o competente alvará de funcionamento, inclusive sanitário; 2 - obrigação de fazer, consistente em promover o isolamento acústico de suas instalações para evitar, coibir a emissão ou a propagação de sons ou ruídos em níveis superiores aos estabelecidos pela legislação de regência, no prazo de 90 dias e, ainda, 3 - obrigação de não fazer, consistente em cessar as atividades que importem em emissão ou propagação de sons ou ruídos em níveis superiores aos estabelecidos pelo CONAMA, sendo todas estas medidas sob pena de multa diária no importe de R$ 5.000,00, em caráter cumulativo enquanto perdurar a irregularidade ou descumprimento da ordem, revertendo-se tal valor à Fundação da Criança e do Adolescente de Ubatuba - FUNDAC. Narra, em síntese, ter a empresa ré como ramo de atividade “discotecas, danceterias, salões de dança e similares, bem como bares especializados em venda de bebida alcoólica”, razão pela qual requereu ao Poder Público Municipal a concessão da inscrição municipal para fins de obtenção da licença de funcionamento de uma danceteria denominada “Tangará Lounge e Club”. No entanto, relata o autor que a ré teve seu pedido de expedição do alvará de funcionamento indeferido, eis que não cumpriu com as disposições legais para tanto. A decisão foi fundamentada com base na ausência de “habite-se” do imóvel, ausência de auto de vistoria do corpo de bombeiros, assim como pela ausência de projeto acústico e laudo de isolamento acústico. Assevera ainda, que o órgão fiscalizador no dia 06 de janeiro de 2012, às 21 horas e 30 minutos interditou a danceteria, tendo a ré, contudo, rompido o lacre de interdição e inaugurou a danceteria em questão. Juntou os documentos de fls. 18/159. A interdição foi decretada as fls. 164,v. A empresa ré FABIO DOS SANTOS CRUZ DIVERSÕES - ME, ofereceu contestação tempestiva (fls. 234/252), aduzindo, preliminarmente, a nulidade absoluta quanto à representação processual da autora, bem como a ocorrência de coisa julgada, pois já houve julgamento com o trânsito em julgado contra a danceteria “Sprint Bar” que funcionava anteriormente no mesmo local. No tocante ao mérito, alega possuir todos os documentos exigidos pela municipalidade para a concessão do pretendido alvará, e que referido pleito já foi protocolado junto ao processo administrativo. Por fim, requereu a improcedência total da ação. Réplica 270/274. A liminar foi revogada às fls. 289/290. É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO e DECIDO. O julgamento antecipado da lide se impõe, nos precisos termos do art. 330, II, do Código de Processo Civil. A preliminar argüida na contestação de fls. 235/252 quanto à nulidade absoluta desta ação será acolhida, senão vejamos: A Prefeitura Municipal desta Comarca ajuizou ação civil publica em face do réu, pelos motivos declinados na inicial, sendo certo que referida petição foi subscrita pela Dra. Vânia Castro dos Santos e pelo Dr. Marcelo Santos Mourão. Pois bem. Preconiza o artigo 12, inciso II do Código de Processo Civil que o Município será representado em Juízo, ativa e passivamente por seu Prefeito ou procurador. Já a Lei orgânica do Município, em seu artigo 57, quando trata das atribuições do Prefeito, determina que compete a este a representação do Município, em Juízo ou fora dele, vejamos: SEÇÃO II - DAS ATRIBUIÇÕES DO PREFEITO Artigo 57 - Ao Prefeito compete privativamente: I - nomear e exonerar os Secretários Municipais; II - exercer, com o auxílio dos Secretários Municipais, a direção superior da Administração Municipal; III - iniciar o processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Lei Orgânica; IV - representar o Município, em Juízo e fora dele; V - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis aprovadas pela Câmara e expedir regulamentos para sua fiel execução; VI - vetar, no todo ou em parte, projetos de lei, na forma prevista nesta Lei Orgânica; VII - decretar desapropriações e instituir servidões administrativas; VIII - expedir decretos, portarias e outros atos administrativos; IX - permitir e autorizar o uso de bens municipais por terceiros; X - permitir e autorizar a execução de serviços públicos por terceiros; XI - dispor sobre a organização e funcionamento da Administração Municipal, na forma da lei; XII - prover e extinguir cargos públicos municipais, na forma da lei, e expedir atos de nomeação e exoneração e demais atos referentes à situação funcional dos servidores municipais; XIII - remeter à Câmara mensagens e o Plano de Governo por ocasião de abertura da sessão legislativa, expondo a situação do Município e solicitando as providências que julgar necessárias; XIII/A32 - comparecer perante a Câmara na primeira sessão ordinária do ano e na subseqüente ao recesso de julho, e sempre que o solicitar, ou quando for regularmente convocado pela Câmara, dentro de 15 (quinze) dias da convocação, utilizando a Tribuna para expor sobre a situação do Município e prestar os esclarecimentos de sua alçada.(ADIN 105.284.0/0-00 - excluído - Em. LOM 31/03) XIV - enviar à Câmara os projetos de lei do orçamento anual, das diretrizes orçamentárias e do plano plurianual de investimentos, conforme disciplinado nesta Lei Orgânica; XV - encaminhar ao Tribunal de Contas do Estado, até o dia 31 de março de cada ano, a prestação de contas da Prefeitura e a da Mesa da Câmara, e os balanços de exercício findo; XVI - encaminhar aos órgãos competentes os planos de aplicação e prestações de contas exigidos em lei; 29 - O artigo 53 foi alterado pelo artigo 8 da Emenda à LOM n. 16 de 21/12/1998. Também, através do artigo 8 da Emenda à LOM n. 16 foram revogados os §§ do artigo 53 e acrescido o seu parágrafo único. 30 Revogado pelo art. 9º da Emenda à LOM nº 16. 31 - Revogado, conforme nota de n. 27, supra. 32 - Acrescido pela Emenda à LOM nº. 31 de 23/06/03 e posteriormente excluído pela ADIN 105.284.0/0. 13 .XVII - fazer publicar os atos oficiais; XVIII - prestar a Câmara, dentro de quinze dias, as informações solicitadas na forma regimental; XIX - superintender a arrecadação dos tributos e preços públicos, e a guarda e aplicação da receita, autorizando as despesas e pagamentos dentro das disponibilidades orçamentárias e dos créditos votados pela Câmara; XX33 - colocar a disposição da Câmara, dentro de quinze dias de sua requisição, as quantias que devam ser despendidas de uma só vez, e até o dia 20 de cada mês, a parcela correspondente ao duodécimo de sua dotação orçamentária; XXI - aplicar multas previstas em lei e contrato, e relevá-las quando impostas irregularmente; XXII - resolver sobre requerimentos, reclamações e representações que lhes forem dirigidos diretamente ou em grau de recurso; XXIII - aprovar projetos e planos de parcelamento do solo e zoneamento urbano, ou para outros fins urbanos; XXIV - solicitar o auxílio da Polícia do Estado para garantia do cumprimento dos seus atos, e fazer uso da Guarda Municipal, no que couber; XXV - decretar o estado de emergência ou de calamidade, quando for o caso e necessário para preservar ou prontamente restabelecer, em locais determinados e restritos do Município, a ordem pública e a paz social; XXVI - indicar diretores de sociedades de economia mista, de empresas e fundações públicas municipais; XXVII - dar denominação a logradouros públicos, por decreto, nos casos de aprovação de projetos de loteamento; XXVIII34 - subscrever ou adquirir ações, realizar ou aumentar capital, desde que haja recursos hábeis, de sociedade de economia mista ou de empresa pública, bem como dispor, a qualquer título, no todo ou em parte, de ações ou capital que tenha subscrito, adquirido, realizado ou aumentado, mediante autorização da Câmara Municipal; XXIX - exercer outras atribuições previstas nesta Lei Orgânica. Parágrafo único - O Prefeito poderá delegar por decreto, aos Secretários Municipais, funções administrativas que não sejam de sua competência exclusiva. Verifica-se, portanto, de forma indubitável, que tanto o Código de Processo Civil, quanto a própria lei orgânica deste Município não autorizam Assessora Jurídica Legislativa de Gabinete, bem como o Secretário Jurídico do Município a representarem o Município, em Juízo ou fora dele. Insta salientar que a ressalva prevista no parágrafo único do artigo em voga não se aplica à representação do Município, por se tratar de matéria de ordem pública referente à competência exclusiva do Prefeito Municipal. Note-se, também, que o próprio documento colacionado a estes autos pela Municipalidade às fls. 298, ao definir a competência do Secretário Municipal de Assuntos Jurídicos, não atribui a este a competência de “representar o Município em Juízo ou fora dele”. Necessário se faz distinguir as duas situações, qual seja, em que pese o Secretário Municipal de Assuntos jurídicos ser Bacharel em Direito e também estar inscrito na OAB não implica em ser o Procurador do Município, eis que são cargos totalmente distintos, com nomeações e atribuições diversas. Neste diapasão, é nítida a ausência de pressuposto processual de existência do autor, diante a falta de capacidade postulatória para tal mister. Frise-se que a capacidade, como pressuposto processual, não se confunde com a legitimidade ”ad causam”, que é uma das condições da ação, pois esta é requisito para que o autor tenha direito de ação, o que não é cerne da questão em si. Assim, nada obstaria que a Prefeitura Municipal desta urbe ajuizasse esta ação (ou continue ajuizando outras ações), desde que referido direito seja exercido por quem tenha “capacidade” processual para representar o Município, ou seja, o Prefeito ou o seu Procurador, e não através de “Procuradores Piratas”. Outrossim, em que pese o Procurador Municipal efetivo (“não pirata”) ter peticionado nos autos para o fim de regularizar referida representação, tal pleito não será deferido, pois uma vez que a petição inicial é nula de pleno direito, e seus efeitos não são suscetíveis de confirmação, nem convalescem pelo decorrer da instrução processual. Desta forma, considerando a patente má-fé do Município desta Comarca que, infelizmente chegou ao ponto abusivo de utilizar o Poder Judiciário como instrumento para atingir seus escusos interesses políticos, servindo-se, saliente-se, de representantes “piratas”, ofendendo os princípios basilares que sustentam o regime jurídico-administrativo de nosso ordenamento jurídico, o acolhimento da preliminar argüida na contestação é medida que se impõe. Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE a ação, e conseqüentemente JULGO EXTINTO O PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO, nos termos no artigo 267, inciso IV, do Código de Processo Civil. Outrossim, considerando a patente má-fé da Prefeitura desta urbe, condeno-a à pena de litigância de má-fé, consubstanciada no pagamento de multa no importe de 1% do valor da causa, bem como a indenizar o réu nos prejuízos que este sofreu por ter se privado de auferir lucro no período de temporada, que, como é cediço em nossa Comarca, é o único período do ano em que o número de visitantes aumenta consideravelmente, razão pela qual arbitro referida indenização em 20% do valor da causa, nos termos do artigo 18 do Código de Processo Civil. Condeno ainda a Prefeitura ao pagamento dos honorários advocatícios que fixo por equidade em R$ 1.000,00. Sem prejuízo, determino a extração de cópia destes autos, com a conseqüente remessa para o Ministério Público desta urbe, para que apure a ocorrência de eventual ato de improbidade administrativa nos termos da Lei 8.429/92. P.R.I.C. Ubatuba, 30 de março de 2012. Nelson Ricardo Casalleiro Juiz de Direito
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