São Benedito era de uma família podre que viveu na Itália, neto de escravos que vieram da África. Morou com os pais até os dezoito anos quando virou frade franciscano e dedicou sua vida a Deus. Foi cozinheiro de um convento e levava comida para os pobres. Certa vez, quando levava comida escondido, foi surpreendido pelo supervisor do convento que perguntou o que estava levando em uma cesta, ele então respondeu: “São flores, meu senhor”. O homem, desconfiado, descobriu a cesta e por milagre haviam rosas vermelhas, cor-de-rosa e brancas. Ilhabela foi colonizado por índios, europeus e negros, em 1798 a população negra representava 60% dos habitantes, por causa do trabalho escravo nos engenhos, com isso não se sabe ao certo em que ano foi criada a primeira Congada, mas acredita-se que foi há quase 200 anos. Na terceira sexta-feira de maio a festa começa com o levantamento do mastro, o capitão do mastro entra na mata e escolhe uma árvore de tronco bem forte, que é enfeitado com flores representando o milagre de São Benedito. Em frente a Igreja de Nossa Senhora da Ajuda, na Vila, ao som do atabaque, da marimba e do sino é levantado o mastro com a bandeira de São Benedito. Depois das orações é servido um bolo que hoje em dia tem mais de quatro metros de comprimento, acompanhado de concertada. Durante a congada os Congos de Cima que são os fidalgos do Rei, representando os cristãos, que contam também com a Rainha, o Secretário e o Príncipe vestidos de azul, querem festejar São Benedito com danças. Os Mouros, que são os Congos de Baixo, vestidos de vermelho tem o Embaixador como seu representante e querem louvar São Benedito cantando, além de tomar o trono do Rei. A Congada é um teatro de rua, apresentado em três bailes, quando os dois grupos se enfrentam e representam a guerra, mas no final o Rei descobre que o Embaixador é seu filho e dançam juntos. No domingo é rezada a missa da Congada, onde todos vão vestidos com trajes africanos, até o Padre. Mas há muito tempo atrás a Igreja não reconhecia a Congada e eles eram proibidos de entrar com os trajes da festa. Nos três dias da festa é montada a Ucharia, a cozinha onde os voluntários, homens e mulheres, se reúnem para preparar a comida dos Congueiros: de manhã café reforçado e no almoço feijão, arroz, carne com batata picadinha, macarronada, farinha de mandioca e salada. Antigamente os devotos doavam porcos aves e até bois, mas hoje em dia os Congueiros passam listas, pedindo ajuda e ganham muita coisa para servir no dia da festa, que reúne mais de 100 pessoas. A Congada foi o tema do livro “A Congada de Ilhabela na festa de São Benedito” (1981) da pesquisadora, folclorista e escritora Iracema França Lopes Corrêa, e não tenho dúvidas que foi fonte de estudos para várias gerações de Congueiros, além de que ela pessoalmente se dedicou para que a Congada nunca acabasse. Conheço famílias como a da Rosângela e do Gilmar Pina, que tem várias gerações na Congada, e vejo também que o Professor Adalberto Lopes que veio de São Sebastião, tendo casado com a Mercedes Santos, de família de Congueiro, passou a participar e proteger essa apresentação folclórica e religiosa. Acredito que o respeito e o empenho dos moradores de Ilhabela tem sido muito importante para o fortalecimento da Congada. A partir do ano 2000, o Professor Adriano Leite, criou a Congada Mirim, que é um tipo de curso onde as crianças aprendem tudo sobre a Congada, essa idéia deu certo e os meninos de sete a quatorze anos estão sendo preparados para substituir os antigos Congueiros que por problemas de saúde não podem participar mais. Agora os professores Branco, Anderson e Flávio, nos meses de março, abril e maio, quando a Congada está chegando, levam os meninos para a rua, assim eles perdem o medo e vão treinando as falas e danças para no futuro se tornarem verdadeiros Congueiros. A Congada de Ilhabela, já foi fonte de inspiração para pesquisadores como a antropóloga Marcia Merlo (Memória de Ilhabela), para fotógrafos como a fotógrafa Maristela Colucci (Os meninos da Congada), e no último dia 14 a Prefeitura de Ilhabela apresentou o trabalho do Professor Adriano Leite, uma publicação com 60 páginas, onde ele resgata toda a história da Congada de Ilhabela. Cabe a nós, levarmos os nossos filhos e netos para conhecerem este espetáculo, que sem dúvida, é uma das mais belas manifestações folclóricas e religiosas do Litoral Norte.
Nota do Editor: Maria Angélica de Moura Miranda é jornalista, foi Diretora do Jornal "O CANAL" de 1986 à 1996, quando também fazia reportagens para jornais do Vale do Paraíba. Escritora e pesquisadora de literatura do Litoral Norte, realiza desde 1993 o "Encontro Regional de Autores".
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