O Ministério da Saúde, ao divulgar a intenção de criar normas que selecionem o tipo de paciente que terá direito a um leito de UTI (Unidade de Terapia Intensiva), onde o paciente em estado grave recebe os cuidados de médicos intensivistas e é cercado por equipamentos capazes de manter suas funções vitais até que possa se recuperar, atirou não só contra todos os brasileiros, como contra os hospitais privados também. A proposta do Governo, além de chocar a classe médica, soa como profundo desrespeito à cultura e à inteligência da população. Como pode, um Governo, chamar a si o poder de decidir quem tem chances de recuperação e quem não tem? Projetos como esse, que desmerece e atropela inclusive a própria constituição brasileira, que prevê na íntegra que a saúde é um direito de todos e o dever do Estado, são uma discrepância. Fazer uso do marketing internacional, quando o mundo inteiro acompanhou a briga na justiça dos pais da americana Terry Schiavo, tentando impedir que se cumprisse o pedido feito e aceito pela suprema corte naquele país, por parte de seu marido, de suspender a alimentação da paciente e descontinuar um estado de coma que durou quinze anos, não nos parece a postura mais adequada. Apropriar-se desses casos que tiveram grande apelo de mídia para tentar solucionar a falta de leitos de UTI em hospitais públicos e de médicos intensivistas é grande erro administrativo, para não dizer estratégico. Afinal, só a partir de projetos bem elaborados é que poderemos resolver a médio e longo prazos os tantos problemas de saúde no Brasil. Não através de soluções que resvalam na injustiça. O Governo, contudo, sugere um projeto que "impõe a eutanásia" como solução para a distanásia, que significa a manutenção de um quadro clínico sem chances de recuperação. Ou seja, nossos dirigentes, incapazes de oferecer eficientes serviços de saúde, ainda julgam dispor de infra-estrutura para selecionar os casos que devam ou não ser alocados em leitos de UTI. Inclusive, sinalizam o uso equivocado desse conceito para gerir a ocupação das internações, quando deveriam preocupar-se com a otimização de sua gestão e com a criação de novos leitos. Caos ainda pior deverá se instalar quando a iniciativa privada (sistema de saúde complementar ou planos de saúde) começar a fazer uso dessa ferramenta governamental para selecionar os "casos que têm ou não" direito à internação em UTI. Como será a reação dos segurados - que ainda não se restabeleceram dos excessivos aumentos praticados pelos planos de saúde -, quando, de uma hora para outra, se sentirem desamparados ao passar por momentos difíceis de estar com uma doença com baixa perspectiva de sobrevivência? Deverão agir como elefantes, que se retiram, ainda com vida, para o local onde esperarão a morte chegar? Não é um retrocesso? As medidas políticas deste Governo estão trilhando uma estrada que, em breve, conduzirá todo o sistema da saúde, tanto pública quanto privada, para uma crise insolúvel, como a da previdência, que já tem até data marcada para desabar. Urge investir em tecnologia para que o sistema da saúde seja consolidado aos moldes do nosso sistema financeiro, que conseguiu eliminar suas perdas sem sacrificar ainda mais a vida do brasileiro. Nota do Editor: Roberto Schahin é formado em Administração pela Stamford Hill (Londres) e é assistente comercial do Hospital Santa Paula.
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