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Educação
21/05/2005 - 13h52
Escolas para um mundo de inclusão
Andrea Ramal - Pauta Social
 
 
Divulgação 
  Andrea Ramal.

Em 1987, Adriana e Fábio começaram a peregrinação em busca de uma escola para um de seus filhos. Eles são pais de três jovens: Patrícia e João, que estudam numa conceituada universidade carioca, e Lúcia, de 28 anos, que tem Síndrome de Down e está na 4ª série. Naquela época, ainda não existia nenhuma regulamentação que determinasse que as escolas deveriam ser inclusivas, ou seja, tornar-se aptas para receber todas as crianças, mesmo aquelas com necessidades especiais de aprendizagem.

No entanto, Adriana e Fábio acreditavam que a convivência entre crianças ditas "normais" e outras com necessidades especiais era algo que devia ser estimulado e que enriquecia a ambas partes. Essa não era uma idéia infundada. Inúmeros psicólogos e pedagogos confirmam hoje a teoria. Por causa dos significativos ganhos pedagógicos e do aumento da qualidade do processo educacional que essa convivência provoca, em muitos países - entre eles, o Brasil - a legislação garante aos pais de crianças com necessidades especiais a possibilidade de matricular seus filhos em qualquer escola.

Ainda assim, nem naquela época, nem mesmo hoje em dia, a matrícula de Lúcia nas escolas "normais" tem sido algo fácil, ao contrário do que a lei lhes garante por direito. A resposta que seus pais vêm ouvindo ao longo desses anos é sempre a mesma, como num discurso ensaiado: "Não temos estrutura para receber essas crianças". Ou: "Ela não será devidamente atendida nesta escola". Em muitos casos, são os pais das crianças "normais" que pressionam as instituições para que não aceitem estes alunos. Se os filhos apresentam algum problema de aprendizagem, estes chegam a atribuir o fato à presença de alunos especiais na classe (sic!).

Quando conseguiu matricular sua filha (por pouco tempo) numa escola comum, Adriana tinha que ser a última a buscá-la, para evitar o confronto com as outras mães, que exigiam que retirasse Lúcia da escola. Muitos pais ameaçaram a direção de procurar outro estabelecimento escolar se Lúcia continuasse lá. A situação revela uma perversa lógica de exclusão, escondida sob um discurso politicamente correto. Ora, uma criança com necessidades especiais precisa de um atendimento especial e personalizado. Se a escola não pode oferecê-lo, parece até honesto confessar-se despreparada e, generosamente, orientar os pais a matricularem o filho em outro lugar. Não fosse assim, o risco seria grande. Afinal, não é a primeira vez que leis de inclusão acabam funcionando de modo inverso.

Algo semelhante ocorre nas universidades com os alunos provenientes de pré-vestibulares para estudantes sem recursos financeiros, ou com os negros que entram no ensino superior graças ao sistema de quotas. Tendo ingressado num mundo que lhes é estranho e cujas regras e cultura não conhecem bem, acabam tendo poucas possibilidades de êxito. É uma espécie de "inclusão excludente", pois a entrada no sistema escolar não significa uma verdadeira inclusão, mas sim uma forma de retardar o fracasso, ou de torná-lo ainda mais doloroso, traumático e definitivo. Cumprir a lei, preparar a escola para acolher crianças e jovens com necessidades especiais, é mais do que adaptar a estrutura física: é cuidar do ambiente, da cultura da comunidade, prepará-la para aceitar e respeitar a diversidade, realizando a verdadeira socialização.

A sala de aula que incorpora a diversidade é muito mais eficaz pedagogicamente. Turmas compostas por pessoas iguais, como modeladas por uma forma, são maçantes e impedem o crescimento. Vivemos num mundo em que a incapacidade de tolerância, diálogo e convivência pacífica entre o diferente gerou guerras, mortes e destruição. A grande riqueza da humanidade é a diversidade. Esses valores devem ser aprendidos, mas só as escolas que sabem incorporá-los na prática são capazes de ensiná-los. A escola é um laboratório do mundo. Nela, a criança pode aprender a reproduzir a sociedade ou a transformá-la; a manter as injustiças ou a indignar-se com elas e a lutar por um mundo justo e fraterno.

A escola que exclui o diferente porque "não está devidamente preparada para acolhê-lo", como também os pais que exigem a exclusão dos "especiais", estão ensinando às crianças que o mundo será um lugar que não integrará os excluídos e os mais fracos. Ensinam a lição da reprodução das estruturas injustas; não percebem que ajudam a formar mentalidades opressoras, insensíveis e egoístas, incapazes de ver o outro.

É certo lembrar que nem toda escola tem recursos para se adaptar e se equipar de acordo com as exigências da lei. Mas para isso podem-se estabelecer prioridades ou buscar parcerias eficazes, com inteligência e criatividade, como ocorre em muitos países do mundo - inclusive com apoio do governo. Enquanto não se cumpre a lei, prevalece a hipocrisia das instituições que, a despeito de suas belas filosofias educacionais que pregam a formação para a cidadania e o respeito à dignidade humana, continuando ajudando a modelar um mundo injusto. Enquanto não se cumpre a lei, Lúcia continua estudando numa escola especial. Com a perseverança de seus pais e seus educadores, aprendeu a ler e escrever, canta, dança e é uma menina verdadeiramente linda, com a qual todos teríamos muito que aprender.


Nota do Editor: Andrea Ramal é doutora em Educação, diretora da ID-Projetos Educacionais.

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