Linhas de montagem de equipamentos eletrônicos, copiadoras de livros, CDs e DVDs, confecções, fábricas de tênis e outros bens de consumo, sorrateiramente instaladas em diversos países, operam diariamente na faixa de marginalidade da economia mundial, roubando o lucro das empresas formais, o emprego dos trabalhadores honestos e os impostos com o qual os governos investem no atendimento às demandas da sociedade. O bizarro chão de fábrica é o ponto inicial desta nociva cadeia de suprimentos, cujos processos logístico, de distribuição e comercialização constituem um dos mais bem estruturados e ousados movimentos do crime organizado. Somente no Brasil, a pirataria foi responsável por perdas de R$ 30 bilhões em 2004. O Ministério da Justiça revela números assustadores. A indústria do tabaco teve prejuízo de US$ 1,2 bilhão. O setor de software enfrentou quebra de US$ 400 milhões. As gravadoras perderam US$ 300 milhões e assistem ao avanço crescente das cópias falsas, que já detêm 95% do mercado. A cadeia produtiva do cinema foi surrupiada em US$ 130 milhões. Essas são estatísticas sombrias de uma atividade tão criminosa quanto o tráfico de drogas, o contrabando e comércio clandestino de armas, o roubo de cargas, os assaltos a bancos e seqüestros. Trata-se de um problema efetivamente grave, que transcende as fronteiras da legalidade em todos os continentes. Assim, é fundamental que os governos das nações civilizadas, bem como seus povos e setores produtivos, unam esforços no combate à pirataria. Nesse sentido, é muito interessante artigo publicado na revista Consultor Jurídico, em outubro de 2004, assinado por Nehemias Gueiros, Jr, que observa: "O Departamento de Justiça dos Estados Unidos conduziu investigação sigilosa que produziu dados realmente alarmantes, traduzindo um verdadeiro assalto à propriedade intelectual em todos os níveis, desde operadores individuais amadorísticos até as grandes esferas do crime organizado, que vêm causando um prejuízo anual da ordem de US$ 250 bilhões aos negócios americanos". O texto informa, ainda, que o relatório da investigação recomendava medidas como a criação de unidades especiais do FBI em todo o país e aumento do número de promotores federais e agentes do órgão para atuar contra a pirataria e os crimes de propriedade intelectual. Fica muito clara a necessidade de ampla mobilização, nos mercados internos e no âmbito do intercâmbio internacional, na luta contra a falsificação de produtos e roubo de patentes, idéias e da criação artística e intelectual. Tal tarefa deve promover grande articulação dos governos e das sociedades. Passa pela infra-estrutura e inteligência policial, pela punição exemplar dos infratores, nos termos das leis, e, principalmente, pela educação, criando-se uma cultura de rejeição e ojeriza ao falsificado, ao contrabandeado, ao roubado dos criadores, artistas, músicos, designers e produtores de bens intelectuais. Nesse contexto, foi um efetivo avanço a recente criação do Conselho Nacional de Combate à Pirataria (CNCP), coordenado pelo Ministério da Justiça e do qual são signatários seis representantes dos setores privados afetados pelo problema, por meio do Fórum das Entidades. A Amcham (Câmara Americana de Comércio) também participa de todo esse movimento, promovendo a interação de seus associados com esses interlocutores do governo e setor privado. A entidade está analisando 99 ações elencadas pelo CNCP para identificar em quais pode contribuir para que o combate à pirataria progrida e não suscite medidas de retaliação pelos Estados Unidos, como a exclusão do Brasil do Sistema Geral de Preferências, decisão ainda suscetível a risco, adiada para 30 de setembro. É importante lembrar que a questão é pauta importante na agenda bilateral brasileiro-norte-americana. É gratificante perceber que o Brasil, incluindo o esforço dos setores produtivos e suas entidades de classe, está mais empenhado no combate à pirataria, alinhando-se às nações que se mobilizaram no enfrentamento do problema. Ao adotar postura mais franca e consistente nesse embate, o País avança em sua inserção positiva na economia global. O posicionamento claro, transparente e firme nesse campo é imprescindível, pois é muito sutil a fronteira entre as ações do crime organizado e a institucionalização dessa prática como diferencial competitivo de algumas economias, dentre as quais, felizmente, não se inclui a nacional. Nota do Editor: Helio Magalhães é presidente do Conselho da Amcham (Câmara Americana de Comércio).
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