Pesquisa inédita indica: impressão de livros deverá crescer somente 2% em 2005
Antes mesmo de seu lançamento oficial, previsto para 16 de julho, "Harry Potter e o Príncipe Mestiço", sexto livro da genial série escrita pela inglesa Joanne K. Rowling, já teve cerca de um milhão de exemplares comercializados apenas na livraria Barnes & Noble, nos Estados Unidos, que já vendera dez milhões de volumes das cinco aventuras anteriores. O livro estabelece um recorde: tem a maior primeira edição literária já registrada em todos os tempos, com 10,8 milhões de unidades impressas, conforme revela sua editora norte-americana, a Scholastic. Outra editora, a Raincoast, anunciou que a tiragem canadense será de 1,2 milhão. Na Austrália, as redes de livrarias e supermercados esperam vender 500 mil exemplares nas primeiras 24 horas pós-lançamento. É, o bruxo adolescente e bom caráter viaja pelo mundo. Seus livros são vendidos em praticamente todos os países e traduzidos para 60 idiomas, inclusive o árabe e o hindi, já tendo registrado vendas próximas de 300 milhões de exemplares. Tais volumes são impressionantes para um Brasil em que se registra média de compra inferior a um livro por habitante/ano, conforme se pode concluir em pesquisa do Ministério da Cultura, divulgada em março último, sobre as perspectivas do mercado editorial e livreiro em 2005. As editoras estimam a venda de 178 milhões de exemplares, cuja divisão pelos 180 milhões de habitantes registrados pelo IBGE resulta em assustador dado per capita: 0,98. Este índice nacional de leitura é inferior aos de países da própria América Latina e muito menor do que os verificados em nações como Estados Unidos, França e Alemanha, onde a relação é superior a sete por um. Nos números da pesquisa do MinC não se incluem os cerca de 100 milhões de exemplares adquiridos todos os anos pelo Governo Federal, no âmbito do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Considerando este volume, distribuído nas escolas públicas do Ensino Fundamental para alunos de baixa renda, o índice nacional de leitura seria de aproximadamente 1,5 livro por habitante ano, ainda muito aquém da necessidade inadiável de democratizar a leitura e abaixo das médias verificadas em nações concorrentes na economia global. No nicho de mercado relativo às compras espontâneas de livros, Harry Potter também exerce influência no mercado brasileiro, tanto dos originais em inglês, como de edições traduzidas. Os livreiros, embora não haja pesquisa específica sobre isto, reconhecem a importância do bruxinho, assim como do "Senhor dos Anéis", de J.R.R. Tolkien, que vendeu 100 milhões de exemplares em todo o mundo, para o estímulo à leitura no grupo de crianças e jovens. Para o Brasil, não importa se movida pelas mágicas penas de Rowling e Tolkien ou pelo PNLD, é fundamental a formação de novas e subseqüentes gerações de leitores. O apego ao conhecimento, à cultura e ao entretenimento literário, que, como comprovam Potter e o Senhor dos Anéis, ainda têm no livro a sua mais importante e insubstituível mídia, é a principal herança que pais, governo e sociedade podem deixar à infância e à adolescência desta Nação. Não há mais viabilidade de desenvolvimento sem acesso democrático à informação. Assim, é lamentável constatar que, devido à péssima distribuição de renda, ao desemprego elevado e à eterna incerteza quanto ao futuro próximo da economia, o livro seja um produto supérfluo para milhões de brasileiros. Estes habitantes poderiam desfrutar condições de vida muito melhores, vislumbrar possibilidades profissionais mais promissoras e exercitar mais plenamente as prerrogativas do civismo, se não tivessem de optar entre a compra de um quilo de alimentos e uma obra literária ou didática. Esta realidade está evidenciada em números de inédita pesquisa realizada pelo Iemi (Instituto de Estudos e Marketing Industrial), para a Abigraf (Associação Brasileira da Indústria Gráfica). O trabalho demonstra, dentre outros itens, que, nos últimos quatro anos, a receita da indústria gráfica referente à impressão de livros experimentou desempenho pouco satisfatório, mantendo-se praticamente inalterada. São impressos, em cerca de 178 gráficas comerciais que se dedicam a este mercado, 238 milhões de exemplares/ano. Para o futuro imediato, os empresários gráficos entrevistados mostram-se bastante cautelosos, prevendo crescimento da impressão, em 2005, de apenas 2%. Numa perspectiva de cinco anos, metade dos entrevistados espera que o mercado cresça à média anual de 6,2%. Os demais demonstram menos otimismo. A crença na possibilidade de aumento dos volumes de impressão, embora a pesquisa não deixe isto claro, está muito ligada às perspectivas de que o governo amplie o Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio. Isto, além de absolutamente necessário, complementa o programa, atendendo à nova geração de leitores criada por sua implementação anterior no Ensino Fundamental. As crianças crescem, avançam na escola, tornam-se adolescentes e não podem ser privadas da leitura, em especial quando já se acostumaram a esse saudável hábito. E quanto à parcela de pessimismo que afeta os empresários gráficos? Ora, não é necessária qualquer pesquisa para identificar as causas. São as mesmas de sempre, ou seja, as que permeiam o círculo vicioso dos juros altos, impostos escorchantes e ilimitados, dívida pública crescente, falta de crédito para investimentos, câmbio irreal e, o que é pior, a quebra de credibilidade do governo devido a denúncias de corrupção. Repete-se a história. A magia de Harry Potter ajudou bastante no estímulo à literatura infanto-juvenil e tem garantido a impressão de alguns milhares de livros a mais pelas gráficas brasileiras. No entanto, as empresas do segmento, como todos os setores produtivos do País, precisam de algo muito maior: exorcizar a mesmice, o pensar pequeno e as teses anacrônicas que emperram a economia nacional. Um desafio muito mais árduo e insólito do que a luta do simpático bruxinho inglês contra Valdemort, o lorde do mal. Alerta: qualquer semelhança com pessoas ou situações da vida real é mera coincidência... Nota do Editor: Mário César de Camargo, empresário gráfico, Líder Gráfico das Américas 2005, é administrador de empresas, bacharel em Direito e presidente da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf).
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