Em torno de 7 milhões de famílias brasileiras não tem casa e mais de 10 milhões moram de forma precária, em áreas sem infra-estrutura urbana e saneamento ambiental, sendo que 83 milhões não são atendidos com pelo menos um dos serviços públicos (água, esgotamento sanitário, coleta de lixo e energia elétrica). A maior parte destes brasileiros vivem em áreas urbanas, que concentram hoje 81% da população (1). Este quadro de problemas urbanos caracterizam as cidades brasileiras ao mesmo tempo como espaços de reprodução de desigualdades, refletidos na evidente segregação sócio-espacial evidenciada na sua paisagem, bem como em espaços de concentração de riqueza. Esta contradição se apresenta da seguinte forma: as desigualdades e segregação sócio-espaciais reproduzidas diariamente atingem a maior parte da sua população, alijada do acesso à moradia, ao saneamento, ao transporte, ao emprego e aos serviços públicos. A concentração de riquezas e também o acesso às melhores habitações, oportunidades de emprego e serviços, dizem respeito apenas a menor parcela das cidades. Isto posto queremos qualificar ainda mais esta alarmante situação das cidades brasileiras, que é colocar a questão de como se insere a condição juvenil no espaço urbano, considerando o expressivo peso deste segmento. Para termos uma idéia, segundo pesquisa do Projeto Juventude (2) 20% da população brasileira é de jovens entre 15 e 24 anos, ou seja algo perto de 34 milhões de habitantes. Destes, a grande maioria (84%, ou 28,4 milhões) vive no meio urbano, sendo que 10,4 milhões (ou 31% do total), em regiões metropolitanas. Estes jovens somam 47% dos desempregados do país. Mais da metade deles (17 milhões) não estudavam em 2001 e somente 42% deles chegaram ao ensino médio. Outro indicador preocupante é o crescimento da violência nos grandes centros urbanos, que envolve os jovens de forma acentuada como vítimas ou agressores. A taxa de homicídios na população jovem foi de 54,5 para cada 100 mil, contra 21,7 para o restante da população. (dados e informações do Projeto Juventude). Os dados a respeito da renda mostram acentuada desigualdade e indicam a condição de pobreza em que vive a maioria dos jovens brasileiros. Apenas 41,3% dos jovens viviam em famílias com renda familiar per capita de mais de um salário mínimo, sendo que 12,2% (4,2 milhões) viviam em famílias com renda per capita de até 1/4 do salário mínimo. (idem). Na nossa opinião estes números sinalizam que o modelo de sociedade desigual que temos tem nos jovens as suas principais vítimas. E é no espaço urbano que esta opressão marca de forma contundente a condição juvenil. Longe de aceitar a lógica imposta por esta ordem social, este quadro de problemas nos desafia à construção de alternativas para a sua superação, neste sentido entendemos que a luta pela Reforma Urbana deve se somar ao potencial criativo e protagonista da juventude, tendo em vista que a cidade que queremos é também a cidade que reconheça e incorpore as Políticas Públicas de Juventude. A diversidade de segmentos e grupos sociais nas cidades exigem que a luta pela Reforma Urbana e o enfrentamento das questões urbanas reconheçam suas demandas e especificidades, incorporando de forma transversal a defesa de Políticas Públicas que qualifiquem o Direito à Cidade para além das questões estruturais de moradia, saneamento, transporte e planejamento. As Políticas Públicas de Juventude devem se somar à Plataforma de Reforma Urbana, no sentido de reconhecer que a condição juvenil dada faz com que a maior parte dos jovens, que são filhos e filhas de trabalhadores de baixa renda, sobretudo a juventude negra e as jovens mulheres, sejam as principais vítimas do processo de segregação que se opera nas cidades. Um exemplo emblemático da necessidade e da atualidade desta orientação foram as manifestações da Revolta do Buzú em 2003 onde milhares de jovens estudantes baianos protagonizaram uma ampla mobilização urbana nas ruas de Salvador, que contestava o aumento abusivo da tarifa de ônibus, o que garantiu na época a conquista de algumas reivindicações importantes como a meia-passagem estudantil todos os dias do ano. (1) IBGE. Censo Demográfico 2000. (2) Instituto Cidadania. Projeto Juventude - Documento de conclusão versão final. Junho de 2004. Nota do Editor: Glória Cecília Figueiredo é Assessora de Projetos da Associação dos Sem Teto de Dias D’ávila e Membro da Coordenação do Projeto de Popularização do Estatuto da Cidade da UNEB.
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