Primeira usina de enriquecimento de urânio fica pronta no Rio de Janeiro
A primeira fábrica de enriquecimento de urânio do Brasil está pronta para ser inaugurada. A fita vermelha deve ser cortada antes mesmo do carnaval, dependendo apenas de acertos formais. Localizada em Resende (RJ), a instalação está sob a responsabilidade da Indústrias Nucleares do Brasil (INB), empresa que responde pelo abastecimento de combustível nuclear para as usinas de Angra I e II. Formada por quatro módulos, a fábrica teve um custo total de R$ 400 milhões. Com ela, o país assume a autonomia na produção de combustível nuclear. O diretor da área de Enriquecimento da INB, Carlos Freire Moreira, conta que, com a unidade em funcionamento, o Brasil passará a ser o nono país a deter a capacidade de enriquecer urânio em escala industrial. Moreira explica que o projeto está dividido em duas etapas. A primeira, em andamento a partir da inauguração, tentará suprir 60% das necessidades de urânio enriquecido para Angra I e II. O urânio é encontrado na natureza misturado a um composto 235/238 na proporção de 0,7% (urânio 235) e 99,3% (urânio 238). "O enriquecimento nada mais é do que, utilizando essas máquinas e esse composto na forma de gás, se aumentar esse percentual de urânio 235 de 0,7% para 4%, que é o urânio enriquecido nessa taxa, usado nas usinas da INB", esclareceu o diretor da área de Enriquecimento da INB. A tecnologia para retrabalhar o urânio foi desenvolvida pela Marinha do Brasil, com apoio do Instituto Nacional de Pesquisas Nucleares (IPEN), e agora está sendo implantada na INB em escala industrial, para produção de energia. Até pouco tempo, a INB importava urânio enriquecido. Com a nova fábrica, a empresa detém, agora, o domínio do ciclo de combustível nuclear. Esse ciclo começa pela mineração, quando se obtém o concentrado de urânio (yellowcake). A fase seguinte envolve a transformação desse urânio em hexafluoreto, ou gás, e seu enriquecimento, o que vinha sendo efetuado no exterior. As fases posteriores, que são a transformação do urânio já enriquecido em pó, a fabricação da pastilha e o elemento combustível, são feitas pela INB. O atendimento a 60% das necessidades das usinas nucleares brasileiras está previsto por volta de 2012. A etapa seguinte consiste em atingir 100% das necessidades das usinas de Angra I e II. "Finda a primeira etapa, a nossa estimativa é que, em três anos a gente consiga completar a segunda fase porque, na realidade, o grande salto já foi dado aqui", revela Carlos Moreira Freire. De acordo com ele, o abastecimento de 100% das necessidades de combustível nuclear deverá ser atingido em torno de 2015. O diretor lembrou, porém, que "tudo depende, realmente, do fluxo de recursos". A conclusão do processo de implantação representará uma economia anual de US$ 16 milhões para o Brasil." As reservas de urânio e os estudos nucleares no Brasil Com a criação da primeira usina de enriquecimento de urânio, o Brasil poderá aproveitar melhor uma das suas maiores riquezas. As reservas brasileiras de urânio são estimadas hoje em 309 mil toneladas, ao custo de U$ 30,00 por tonelada. Os cálculos são do diretor da área de Enriquecimento da INB, Carlos Freire Moreira. A empresa, vinculada à Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e subordinada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, utiliza o urânio da mina de Caitité (BA) para o desenvolvimento de projetos tecnológicos voltados à geração de energia nucleoelétrica. O primeiro complexo mínero-industrial da INB era a mina de Poços de Caldas(MG). A INB conta também com as minas de Santa Quitéria (CE) e Rio Cristalino (AM). O Brasil é a sexta potência mundial em termos de reservas de urânio, com apenas 1/3 do território prospectado. "Como esse Brasil é imenso, existem possibilidades fortes de se descobrir mais urânio", revela o diretor da empresa. Criada em 1988, a INB substituiu a antiga Empresas Nucleares Brasileiras S/A (Nuclebrás), vindo a incorporar, em 1994, suas controladas NUCLEBRÁS Enriquecimento Isotópico S.A. (NUCLEI); Urânio do Brasil S.A. e NUCLEMON Mínero-Química Ltda. Nessa época, a empresa passou a explorar e desenvolver os processos industriais do ciclo do combustível nuclear. A INB atua na exploração do urânio, desde a mineração e o beneficiamento primário, até a produção e montagem dos elementos combustíveis que acionam os reatores de usinas nucleares. O conjunto destas atividades constitui o chamado "ciclo do combustível nuclear". A companhia atua, também, na área de tratamento físico dos minerais pesados com a prospecção e pesquisa, lavra, industrialização e comercialização das areias monazíticas e obtenção de terras-raras. De acordo com dados da INB, a história da energia nuclear no Brasil foi iniciada na década de 40. Em 1947, o físico brasileiro César Lattes, em trabalho realizado nos Estados Unidos junto com os também físicos Cecil Powell e Giuseppe Ochialini, identificou e isolou o méson-pi (também chamado de píon, é uma partícula subatômica cuja existência havia sido prevista pelo físico japonês Hideki Yukawa em 1935), contribuindo para a criação do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), em 1949. Em setembro de 1957, o presidente da República, Juscelino Kubistchek de Oliveira, inaugurava o funcionamento do reator nuclear de pesquisa IEA-R1, adquirido pela Comissão de Energia Atômica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), dois anos antes. Em 1962, foi implantado o Centro de Energia Nuclear para a Agricultura de Piracicaba. Já em 1967, a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) dava início aos estudos para a criação da primeira usina nuclelétrica brasileira, encarregando Furnas Centrais Elétricas, principal concessionária na construção de usinas hidrelétricas, de sua execução. Oito anos depois, em 1975, foi assinado o Acordo Brasil-Alemanha, que previa a construção de oito usinas nucleares no Brasil, para entrada em operação em 1990. Isso não ocorreu, em razão de forte reação externa, principalmente dos Estados Unidos e da União Soviética, relata a INB. Essa ressalva na questão do enriquecimento do urânio levou o Brasil a criar um Programa Nuclear Autônomo, a partir de 1979, onde se desenvolveram tecnologias do ciclo do combustível nuclear para uso como fonte propulsora para submarinos da marinha. A Fábrica de Elementos Combustíveis foi inaugurada em 1982 pelo presidente da Nuclebrás, Paulo Nogueira Batista, durante a gestão do presidente João Baptista Figueiredo. A unidade foi considerada "um novo marco na industrialização do país". A crise econômica iniciada no país na década de 80 e que se prolongou até os anos 90 contribuiu para atrasar o cronograma do programa nuclear brasileiro e, por isso, a Usina de Angra I, cuja construção fora iniciada ainda na década de 70, só entrou em operação comercial em 1985. A Constituição de 1988 deu novo fôlego ao setor nuclear, cuja reestruturação objetivou aproximar as atividades dos dois programas existentes no Brasil (o desenvolvido no âmbito do Acordo Brasil-Alemanha e o implementado pelo Programa Autônomo), quando começa a história da INB.
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