O ensino e a aprendizagem de jornalismo levam-nos a refletir até que ponto a escola prepara para a vida e trabalho. Entre as disciplinas do curso de jornalismo constam as que são de cultura geral, como sociologia, antropologia, ética, língua portuguesa, teorias da comunicação, economia, entre outras, e as que são, na opinião da maioria dos alunos as "mais importantes", as matérias técnicas: radiojornalismo, telejornalismo, edição, assessoria de imprensa, gêneros jornalísticos (ou jornalismo impresso), projeto gráfico, jornalismo on-line, projetos experimentais, entre outras. Intriga-me o fato de muitos estudantes priorizarem as últimas em detrimento das primeiras e, mais ainda, pensarem que apenas jornalistas podem lecionar matérias em que o uso das ditas "novas tecnologias" são requeridas. Confundem desse modo técnica com tecnologia. Em virtude da obrigatoriedade do diploma de jornalista para trabalhar como tal, muitos alunos podem estar esquecendo que uma instituição de ensino não visa apenas preparar para o mercado. Mas, sobretudo, para a vida. Entre as atividades jornalísticas também consta "o ensino das técnicas". Creio que essas não se limitam às "disciplinas técnicas" e isso deveria ficar bem claro. Há técnicas e/ou procedimentos metodológicos para o ensino e aprendizagem de quaisquer matérias, sejam essas partes da formação cultural geral do estudante ou as conhecidas como de domínio específico. Eis o maior equívoco que constato entre o que é proposto como atividade técnico-jornalística e o que faz parte do caráter pedagógico de um curso. As coisas se invertem, não raro, num curso de jornalismo. Discriminação sem sentido entre professores jornalistas e não-jornalistas. Discriminação, que não sei se imposta pela nova obrigatoriedade do diploma para exercer a profissão, poderia estar levando os futuros profissionais a ver o mercado como disjunto da escola. Diz John Dewey, famoso educador americano: "escola é vida". Será? A vida não separa profissionais técnicos e não-técnicos. Nem separa mãos e mentes. Há espaço para o diálogo entre os especialistas. E isso é muito bom. Mesmo porque todos os profissionais precisam dos conhecimentos científicos que geram as técnicas. E não o contrário. Numa coisa há consenso entre os especialistas: não existe ensino sem aprendizagem e esta depende, num curso de jornalismo, de profissionais que não façam das técnicas um fim, porque são meios. Meros meios. Torna-se necessário reavaliar até que ponto uma educação voltada aos interesses pautados unicamente pelo mercado pode corresponder ao que esperamos de um jornalista: formação técnica aliada a uma ampla formação cultural rigorosa. Moral da história: a onça não bebe água atualmente a menos que se entenda a importância da interdisciplinaridade e da multirreferencialidade que qualquer curso deve exigir. É. Estamos longe desse ideal. A onça está sedenta. Nota do Editor: Iracema Torquato é professora e coordenadora do curso de jornalismo do Centro Universitário Toledo. Mestre em Comunicação e Doutora em Educação: Políticas Públicas e Administração da Educação Brasileira pela Unesp.
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