A patifaria petista é um assunto tão monótono quanto a defesa do liberalismo econômico: as coisas, quando óbvias demais, tendem a ficar meio chatas. Não é preciso mais dizer que o PT é um partido corrupto e imoral, da mesma forma que não é necessário que se escrevam mais artigos sobre as vantagens do Estado mínimo. Mas, pelo imenso valor simbólico do caso do sr. Francenildo, vale a pena dar uma última cuspida na bandeira hipócrita do petismo. O sr. Francenildo é um pé-rapado. De origem humilde, sem acesso à educação privada e coisas do tipo, ele pode seguramente representar um arquétipo do brasileiro de classe baixa: pobre, inculto, condenado para sempre ao ostracismo econômico e à mendicância obrigatória das esmolas estatais. O sr. Francenildo é, portanto, a princesa na torre dos cavaleiros esquerdistas. É missão histórica e absoluta dessas nobres almas resgatar a qualquer custo o sr. Francenildo de sua condição de prisioneiro da maldade do mundo, da opressão dos poderosos, da imoralidade capitalista. Mas, esperem. O sr. Francenildo não é somente um pé-rapado. Ao dar testemunho das relações de um Ministro de Estado com uns bandidos vulgares de Ribeirão Preto - aqueles que celebram com prostitutas o bem-sucedido roubo de dinheiro público -, o sr. Francenildo mostrou ao país que foi uma criança muitíssimo bem educada no senso do dever para com a verdade, na dose suficiente de vergonha na cara para não aceitar ser chamado de mentiroso mesmo que por gente poderosa. E ao afirmar não ser ninguém perto do Ministro Palocci, o sr. Francenildo o faz com benevolência; no fundo, lá no fundo, ele sabe ser infinitamente melhor que o ministro. Nada nem ninguém pode apagar da sua memória o que só ele viu; para o homem decente, nem todo o dinheiro do mundo vale uma degradação tão baixa. Com um currículo desses, quem em sã consciência condenaria o sr. Francenildo? Se a elite brasileira ainda não tivesse perdido a decência, o sr. Francenildo seria celebrado como herói nacional; ele daria entrevistas, seu nome seria mencionado nas escolas, receberia condecorações oficiais e seria saudado por todas as pessoas de bem. Mas, no reinado da moralidade petista, o que o sr. Francenildo recebe em troca de sua coragem? O Supremo Tribunal Federal proíbe o seu testemunho, seu sigilo bancário é ilegal e brutalmente quebrado, a Polícia Federal devassa sua intimidade, provas contra a sua idoneidade são grosseiramente forjadas, calúnias são levadas a público por uma revista de circulação nacional, ao mesmo tempo em que o denunciado, sem ao menos dar-se ao trabalho de uma satisfação à sociedade que o sustenta, deixa o Ministério da Fazenda sob aplausos de analistas como tendo feito um excelente trabalho. Para a esmagadora maioria dos formadores de opinião brasileiros, seguir a cartilha do neoliberalismo globalista é tarefa que requer talento, muita coragem e quem sabe até mesmo uns toques de genialidade, ao passo que utilizar o poder do Estado para esmagar o sr. Francenildo como um rato, bem, isso não é motivo para exigir que Antonio Palloci seja preso, julgado e condenado. Para esses mongolóides, Palocci é o melhor aluno da classe, o menino sempre comportado que, por mera traquinagem, pôs uma tachinha para o Francenildo sentar. Para casos assim, basta colocar o menino levado para pensar no cantinho. Nesse enredo fantástico, onde estão os defensores dos oprimidos, os cavaleiros da justiça e da bondade? Ao que parece, eles estão ocupados demais tentando destruir a vida do sr. Francenildo e a mãe deste último, com instinto maternal infalível, implora ao presidente Lula que não machuquem seu filho, coisa que, convenhamos, não é de todo despropositada. Naquele breve depoimento, na frente de deputados e senadores, aquele pobre diabo deu ao país uma lição de coragem que não deveria jamais ser esquecida. Mas o Brasil parece prestar atenção sempre mais nos bandidos: os nossos heróis, quando aparecem, são rapidamente esquecidos. Afinal, vai que a moda pega. Nota do Editor: Eduardo Martins Ribeiro é advogado.
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