Entrei na padaria e pedi um café com leite. Então um senhor do meu lado direito bateu com a mão no balcão e gritou: - O Dida vale por três goleiros! Enquanto eu olhava meio assustado para aquele senhor baixinho, calvo e barrigudo, mas de uma voz potente, meu café com leite foi servido no balcão. - E o Cafú vale por 5 laterais! E o Lúcio vale por 4 zagueiros! Resolvi pedir um pão de queijo e, apesar de ser péssimo em fazer contas, achei que com 12 jogadores a seleção não poderia entrar em campo. Foi aí que o baixinho desembestou. - O Roque Júnior vale por 2 zagueiros! O Emerson por 5 volantes, assim como o número da camisa diz. O Roberto Carlos vale por 7 laterais! O Kaká por 7 armadores! O Zé Roberto por 4 volantes! A vida é engraçada. Se observada de um balcão de padaria, mais ainda. Não há lugar melhor para se jogar conversa fora. Tomando um gostoso café com leite e comendo um pãozinho de queijo, bem crocante, melhor ainda. Mas a seleção do baixinho de voz de narrador de futebol tinha jogadores para encher o campo do estádio do Maracanã. Exagero a parte, era no mínimo uma seleção estranha - bastante numerosa. - O Ronaldo vale por 10 centroavantes! O Robinho vale por 10 atacantes! Então ele silenciou um pouco. O português da padaria gritou que o velho era louco. Todo mundo ia dar risada, quando o carequinha bateu no balcão de novo e disse o último nome. Deduzi que faltasse o Ronaldinho Gaúcho, porque esse é o queridinho do Brasil - no momento. Pensei rápido que ele diria que o Ronaldinho valeria um time inteiro, mas aí o cara exagerou. - O Ronaldinho vale por 37 armadores! Quase engasguei com o pão de queijo. Então o português gritou pela padaria que a seleção do Zé Boca Mole tinha exatamente 94 jogadores. Todo mundo na padaria deu risada, incluindo eu. Todo mundo não, o Zé ficou sério - impassível diante da chacota. Assim, dei meu último gole no café. Limpei a boca da farinha do pão de queijo. Levantei e fui pagar a conta. Mas para minha surpresa o Zé se atravessou na minha frente e com o dedo em riste - apontado pra mim - falou: - E você quer saber? Confesso que fiquei assustado. - Você é a cara do Kaká! Aí o velho endoidou de vez!!! Eu não pareço com o Kaká nem na cor dos olhos. Fiquei pasmo. O cara não era só louco - era também exótico. Eu estava de boca aberta olhando para o Boca Mole. Então falei para o cara: - Você está brincando? E o Zé Boca Mole gritou: - Claro que estou! Você é feio pra caramba! Todo mundo deu risada - incluindo eu. Paguei a conta e saindo da padaria escutei um tapa no balcão e um grito: - O Brasil vai ser campeão do mundo! Nenhum outro comentário. Agora todo mundo concordara com o Boca Mole. Nota do Editor: Fábio de Lima é jornalista e escritor ou "contador de histórias", como prefere ser chamado. Atua como repórter freelancer para o jornal Diário do Comércio (SP) e é diretor de programação da Cinetvnet (TV pela WEB). Está escrevendo seu primeiro romance, DOCE DESESPERO.
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