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Crônicas
07/04/2006 - 11h24
Prestação de contas
Helena Sut - Agência Carta Maior
 

Mas não me agrada esse ambiente, sinto-me queimar aqui, como um condenado à danação eterna, vivendo no paraíso. Foi então que descobri que estou no inferno.” (August Strindberg)

Prestar contas é chato, mas nada supera assistir a uma prestação de contas. Ainda mais num período em que elas se acumulam e são assembléias de condomínio, sindicato, clube, associação...

O cenário está armado. A mesa, formada por representantes do conselho fiscal e da direção, centraliza as atenções dos presentes passivos aos discursos de orçados e realizados. O parecer do conselho aprovando as contas é apresentado após longa explanação dos relatórios, definição dos planos de contas e dos princípios contábeis. O que parecia ser o fim é o começo de um longo debate sobre itens que supostamente já estariam vencidos. As depreciações e amortizações ganham destaque no frio balanço patrimonial.

Trava-se uma longa batalha política, já não são as contas, são as palavras... Existe uma ressalva a ser consignada... Mas o que significa ressalva? Não seria uma recomendação? Alguns ânimos se exaltam e se inscrevem para expor suas impressões. Parece não ter fim, as contas saltam do papel e ganham novas dimensões nos discursos inflamados. O falatório cresce e, quase como uma conseqüência, o execrável “a nível de” ganha destaque. A expressão parece um forte vírus que contagia todas as contas, relatórios e apartes, nem o pensamento do mais sonolento fica imune ao quadro infeccioso que mutila os ouvidos dos mais sensíveis.

Três horas... Surgem quesitos a serem votados e encaminhamentos. A platéia divide-se entre ativos e passivos. Descubro o significado de “chover no molhado”, mas não consigo externar minha posição ante a ênfase que os dois pólos dão aos seus questionamentos: ainda discutem se é uma ressalva ou recomendação e se deve constar no corpo do parecer ou num relatório em anexo.

O inferno! Outra palavra desvendada em seu significado. Lembro do livro “Inferno” de Strindberg que trago na bolsa. Estava no penúltimo capítulo quando lembrei da assembléia, guardei-o com a esperança de que o encontro fosse breve e que logo retomasse a leitura que me consumiu o dia. As palavras de Strindberg passeiam no meu pensamento disperso: “Experimento querer bem às pessoas em geral: finjo não perceber seus erros e com uma complacência sem limites, deixo passar as infâmias, as calúnias, até que um belo dia vejo que me tornei cúmplice”.

Penso em abrir o livro entre as folhas de balanços e demonstrativos e continuar a leitura alheia ao debate, mas estou cercada por todos os lados e não conseguiria dissimular a minha atenção no Inferno literário.

Strindberg nunca deve ter assistido a uma assembléia de prestação de contas, se tivesse tal experiência, certamente, sua narrativa seria muito mais dolorosa, realçada as conspirações, os delírios e os surtos.

Mais uma hora... Depois de muita discussão sobre a construção dos quesitos e a votação, somos liberados com a aprovação, por unanimidade, das contas e do parecer nos termos em que foram apresentados no início do encontro.

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