A cada dia que passa torna-se mais evidente que a impunidade é a causa da escalada da criminalidade no Brasil. Não importa se nos gabinetes acarpetados de Brasília, ou nas vielas esburacadas das favelas cariocas. Tanto o político quanto o narcotraficante contam com a ineficiência do sistema policial e judiciário para sair ilesos de suas malfeitorias. O que aconteceu com Zélia Cardoso de Melo permite antecipar o destino dos 40 denunciados - a seguir denominados simplesmente "Turma do Ali-Babá" - pelo procurador-geral da República. Pois bem, a ex-ministra, czarina da economia brasileira no governo de Fernando Collor entre 1990-92, foi acusada de receber em suas contas bancárias e de assessores quantias de origem duvidosa (qualquer coincidência com os fatos atuais não é mera coincidência). Ela foi denunciada, começou a responder processo perante o Supremo Tribunal Federal e, após alguns anos, o caso foi enviado para a primeira instância. Ela terminou condenada, mas recorreu e atualmente o processo aguarda um novo julgamento. Num caso relativamente simples o Judiciário já leva quase 15 anos sem chegar a uma sentença definitiva. A Turma do Ali-Babá deve estar contando com o "efeito Zélia", ou seja, a prescrição. Considerando a complexidade deste novo caso, que lembra a TV Globo com os seus "núcleos", um político-partidário, outro publicitário e um último financeiro, não se deve esperar uma decisão final para antes de 2.020. Até lá o ex-ministro José Dirceu e boa parte dos demais co-réus estarão na faixa dos 80 anos. Com isso, serão ainda beneficiados pelo art. 115 do Código Penal: "são reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era na data da sentença maior de 70 (setenta) anos". Afora o inconveniente de ter que comparecer a audiências e ver os seus nomes esporadicamente na imprensa, a Turma do Ali-Babá não tem muito com o que se preocupar. O mesmo acontece com a maioria dos bandidos comuns que andam a solta pelo Brasil. Nos grandes centros urbanos brasileiros a maioria dos homicídios não tem os autores identificados. E os que chegam até a condenação ainda terminam fugindo. Contam-se aos milhares os mandados de prisão expedidos e não cumpridos. Isso para não falar na inimputabilidade dos menores de idade. Ou, então, do cumprimento "progressivo" das penas: basta passar 1/6 (um sexto) do tempo de condenação para que um estuprador, um latrocida, um traficante ou seqüestrador consiga a liberdade. Afora o impacto político de curto prazo, a denúncia oferecida à Justiça no último 11 de abril terá pouco alcance prático. Não foi por acaso que criminalistas como o atual Ministro da Justiça se debateram durante anos a favor do abrandamento das leis penais, atribuindo a supostas causas sociais a existência da criminalidade. Salvo engano, nenhum membro da Turma do Ali-Babá pode ser considerado um desvalido cujo infortúnio o levou ao banditismo. Na remota hipótese de não serem beneficiados pela prescrição, eles receberão penas leves, a serem rapidamente cumpridas, se não forem substituídas por duas ou três cestas básicas. Zélia, Dirceu & Cia. podem dormir em paz, como qualquer delinqüente brasileiro. Nota do Editor: Mário Ivan Araújo Bezerra é contribuinte do imposto de renda, bibliófilo, ensaísta, advogado no Rio Grande do Sul e em São Paulo, pertence ao Conselho Editorial da Revista "Banco de Idéias" e é membro da Sociedade Mont Pélerin.
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