O fulano nunca teve nada. Aí, um dia, junta uma graninha e abre um barzinho. E está indo tudo muito bem, ele passa as manhãs fazendo as palavras cruzadas do jornal atrás do balcão, coisa que ele gosta de fazer desde pequeno, uma vez ou outra se levanta pra servir uma pinga ou uma coca-cola. Dá até tempo de brincar um pouco com o filho, que a mãe trás todo dia junto com o almoço e um beijo. À tarde, o movimento aumenta um pouco, vem sempre um pessoal tomar uma cerveja, mas nada que atrapalhe muito sua vida, ele fica ali, assistindo à televisão, quando o pessoal quer alguma coisa, chama e ele vai lá e serve. Uma vida muito boa, por que não? Aí, um dia, ele resolve que está na hora de crescer. E começa a servir churrasquinho para o pessoal da cerveja. Só que, para ele ter o churrasquinho pronto à tarde, ele tem que levantar de manhãzinha e ir ao supermercado comprar a carne. Depois, tem que temperar, espetar nos pauzinhos. Quando a carne está pronta, já é bom começar a pensar em acender o carvão, fazer a farofa. A mulher precisa começar a ajudar, ela faz uma mandioquinha, o churrasquinho começa a fazer sucesso e eles até compram um carro novo. Aí, um dia, ele chega para a mulher e fala assim, como quem não quer nada: - E se a gente começasse a servir almoço? O barzinho vira um restaurante, ele empresta uma grana no banco, faz reformas na casa, compra umas mesas, contrata uns funcionários, o dinheiro começa a entrar e a sair, eles trocam de carro, um funcionário entra na justiça e ele tem que pagar uma grana preta, a mulher dele vive sorrindo para aquele pessoal da cerveja que continua freqüentando e elogiando a sua comida, e a garçonete que eles contrataram outro dia desses ele precisou dar carona pra casa dela e demorou um pouco mais e um dia a mulher pergunta se não está na hora deles alugarem um prédio maior e eles alugam e começam a servir pizzas e almoço e janta e as dívidas começam a vencer e eles pagam e o filho cresceu e está se formando e nem deu tempo de ir na formatura porque “alguém tinha que ficar no restaurante, oras” e agora a mulher tem um carro e ele tem outro e a casa é grande e ele chega em casa todo dia e vai lá pro fundo, ao lado da piscina, e ele se senta na cadeira e, na única hora do dia que tem livre, fica fazendo as palavras cruzadas do jornal que é coisa que ele gosta de fazer desde pequeno.
|