Há muitos anos, assisti a um filme cuja trama se desenrolava numa ilha deserta do Pacífico. Ali, isolados de tudo e de todos, dois soldados - um japonês e um norte-americano - mantiveram uma batalha particular que se prolongou muito além do fim do conflito. A guerra havia terminado, mas eles não ficaram sabendo e continuaram lutando. Creio que tal situação, pelo inverso, se aplica inteiramente à realidade nacional. Eu, você, nós que temos acesso às informações (TV, rádio, jornais, revistas etc.) não percebemos o quanto somos destituídos de importância. Em nossa indignação, assemelhamo-nos ao soldado entrincheirado sob coqueiros numa ilha desabitada. Nós, que sabemos das coisas, que analisamos notícias, que avaliamos fatos à luz de nossa consciência moral, é que estamos por fora. Conhecemos a história, mas não a influenciamos. As decisões são tomadas e a vida é conduzida exatamente por aqueles que consideramos alienados. Na república dos desinformados, o governo é exercido por um presidente autista que não sabe, jamais soube e nunca saberá coisa alguma do que se passa a um metro de distância de seus olhos e ouvidos. Se o presidente é assim, abençoado pelo santo sacramento da ignorância, como imaginar que a maior parte da sociedade possa saber, avaliar, condenar ou reprovar o que acontece atrás das cortinas e sob os mais espessos tapetes da pátria? Somos os ridículos combatentes na ilhota da informação. Os valores que defendemos, as condutas que reprovamos, a ninguém interessam! Além mar, a vida é outra e prossegue num ritmo totalmente alheio às nossas preocupações. Nossa luta sequer existiu. O plenário da Câmara dos Deputados vem absolvendo, um após outro, os recebedores do mensalão? Como pode alguém ser condenado por algo não houve e que, se houve, forneceu recursos para a nobilíssima e democrática tarefa de vencer campanhas eleitorais? Parecia-nos justa a punição ao deputado João Paulo Cunha? A peça acusatória estava muito bem documentada? Ele recebeu, mesmo, 50 mil reais do valerioduto e, sobre isso, mentiu reiteradamente aos seus pares? O relator, deputado Cezar Schirmer, fez um bom trabalho? Ora, por favor! Aqui no Rio Grande do Sul, dois dirigentes partidários receberam, do mesmo esquema, quantia 20 vezes maior, que viajou oculta em malas para Porto Alegre. Também eles mentiram sobre o fato. O montante, pelo vulto, afetou o próprio resultado eleitoral. E foram agraciados, não por seus pares e amigos, mas pela justiça, com o encerramento do processo mediante doação de algumas miseráveis cestas básicas. E nós aqui, nesta ilha da informação, querendo punição para deputados corruptos? Nota do Editor: Percival Puggina é arquiteto e da Presidente Fundação Tarso Dutra de Estudos Políticos e Administração Pública. Conferencista muito solicitado, profere dezenas de palestras por ano em todo o país sobre temas sociais, políticos e religiosos. Escreve semanalmente artigos de opinião para mais de uma centena de jornais do Rio Grande do Sul.
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