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SEÇÃO
Crônicas
10/05/2006 - 15h42
A quem serve a justiça?
Lula Miranda - Agência Carta Maior
 

O recente episódio da "condenação" do ex-todo poderoso diretor de redação do jornal "O Estado de São Paulo", Antônio Marcos Pimenta Neves, pelo assassinato (torpe, cruel, covarde...) de sua ex-namorada à época, Sandra Gomide, e sua posterior libertação para responder em liberdade pelo crime confessado (sim, ele é réu confesso), até que o processo transite em julgado na última instância, reforça, sem dúvida, a nossa crença naquela máxima de que todo o nosso arcabouço jurídico (portanto, a nossa Justiça) é um mero instrumento criado pelas elites (portanto, pelos ricos) para penalizar os pobres, como uma forma de mantê-los subjugados em seu devido lugar. A dura pena da lei atinge somente aos pobres. Aos ricos, tudo é permitido: roubar, prevaricar, traficar, corromper, drogar-se etc. Matar, inclusive. Matar para defender a propriedade. Matar por um amor não correspondido, negado. Matar por mero impulso. Matar por matar.

Ao tato dos ricos, a chamada "pena da lei" é leve, delicada, suave, macia até. Para os pobres pesa tal qual chumbo. Os ricos, claro, podem pagar os melhores advogados, verdadeiros "expertizes" (para usar uma palavra da moda) do Direito. E um bom advogado, valendo-se das brechas no Código de Processo Penal e dos mais diversos artifícios e interpretações da lei, pode facilmente fazer um processo arrastar-se por anos, décadas até a prescrição do crime, ou até que ele saia do foco da mídia, ou até que o réu chegue aos 70 anos, e assim tenha direito aos benefícios previstos na lei ou até mesmo morra. Afinal, a morte redime - pelo menos nesse caso.

O caso do assassino confesso Pimenta Neves é emblemático. Mas também poderia citar aqui os casos recentes de outros criminosos ilustres: o caso do juiz "Lalau", de Paulo Maluf, do ex-senador Luiz Estevão, daquele promotor que matou a esposa (grávida) numa estrada vicinal de uma pequena cidade da Grande São Paulo, simulando um assalto, e de tantos outros criminosos de elite, filhos das nossas classes privilegiadas. E que, por isso, por serem das castas mais privilegiadas, têm, por definição e berço, o privilégio de não serem atingidos pela "dura pena da lei".

A dura pena da lei atinge somente aos pobres. Quem não se lembra do caso da "Cidinha do Shampoo"? Essa era a alcunha daquela pobre coitada que ficou um longo período presa por ter roubado um singelo shampoo num supermercado, tendo sofrido todo tipo de violência na cadeia, o que a fez perder a visão em um olho. Quem não se lembra do caso daquela idosa, com mais de 70 anos, que foi presa por acusação de tráfico de drogas e, extremamente doente e debilitada, em fase terminal de um câncer, só foi solta depois de muita pressão da mídia e da sociedade organizada? Como se vê, os mesmos argumentos atenuantes que serviram para o Dr. Maluf, a idade avançada e a saúde precária, não serviram para a desafortunada anciã. E o caso do sertanejo que ficou anos a fio preso por matar passarinhos!? E o caso recente do pernambucano que ficou 19 anos preso por um crime que não cometeu, tendo ficado cego devido a ferimento adquirido na cadeia? Quem não se lembra do caso do... São tantos os casos, prezado leitor, que não convém cansar-lhe enumerando-os aqui.

O cinismo dos chamados "operadores do direito" prossegue dando respaldo a esse estado de coisas, quando dizem, no caso do assassino confesso Pimenta, que a lei (citam, além dos Códigos, inclusive, a Constituição) prevê que o réu só deve ser preso após esgotado todo o seu direito de defesa, após ter sido condenado em todas as instâncias. Será de fato assim?

Cinismo por cinismo, seria o caso de se solicitar então que esse mesmo benefício previsto na lei fosse estendido aos pobres. Quem sabe assim deixaríamos de ter cadeias e presídios tão desumanamente superlotados? - superlotados de pobres, claro. Quem sabe assim não deixaríamos de ter as Febem superlotas pelos filhos dos pobres? Quem sabe? Quem sabe todos não deveriam responder pelos seus crimes em liberdade? Assim, quem sabe, sob essa condição de se estender a todos esse benefício, essa interpretação capciosa da lei passe a ser vista como o que é de fato: uma excrescência jurídica.

Essa "justiça", que só serve aos ricos e penaliza apenas os pobres inevitavelmente termina por disseminar na sociedade uma temível e deletéria sensação de impunidade e, mais que isso, estimula as pessoas em geral, ou, principalmente amigos e familiares das vítimas, a buscarem uma outra "justiça" prescrita no código da Lei de talião: "Olho por olho, dente por dente". O que nos deixaria ainda um pouco mais próximos da barbárie.

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