O lançamento do filme baseado no romance de Dan Brown, (“O Código Da Vinci”), tem novamente estimulado os apetites por censura de uma parcela da militância religiosa, inclusive no Brasil. Da mesma forma que no episódio do corte do beijo entre duas personagens homossexuais na novela, parte-se de uma premissa no mínimo tola para justificar a proibição: como se a ocultação de uma realidade fizesse, por si só, desaparecer a realidade num passe de mágica. Assim como beijos entre pessoas do mesmo sexo, a polêmica em torno das invenções e eventuais mentiras criadas por Brown continuarão a ser um fato e um fenômeno de mídia, independente de o filme ter ou não permitida a sua exibição. E como se, numa democracia, tal violência à liberdade de expressão pudesse sequer ser cogitada. Por outro lado, é uma boa oportunidade para que liberais e conservadores moderados percebam em quais barcos furados costumam embarcar quando, ingenuamente, abraçam teses duvidosas de modo a contribuir para uma suposta “corrente de pensamento de direita”. Prova disso é o estudo elaborado por padres e assessores da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e divulgado no dia 12 de maio último. O texto, de nome “Análise de Conjuntura”, afirma, entre outras bobagens, que “a grande mídia está alinhada com os setores conservadores” e opõe, no panorama latino-americano, dois grupos ideologicamente distintos: um que defenderia “a auto-sustentabilidade econômica da América Latina” e outro que se alinharia “com países ricos do capitalismo, como os EUA”. Ou seja: o tal estudo patrocinado e redigido pela Igreja Católica brasileira é pura propaganda esquerdista, além de pecar (com o perdão do trocadilho) por completo irrealismo (que mídia conservadora é essa, que poupa um presidente eleito por um partido corrupto e salva seu mandato? Que auto-sustentabilidade é essa, que depende do gás da Bolívia?). O fato é que há muito a instituição católica deixou de ser porto seguro a abrigar conservadores, pelo menos em se tratando de Brasil. São as pastorais e conferências de interminável alcance, fontes de propagação do esquerdismo latino-americano e que tem, por conseqüência quase direta, a ascensão ao poder de líderes messiânicos como o próprio Evo Morales. O documento da CNBB só vem trazer à tona o óbvio. De toda forma, a negação da Igreja ao conservadorismo traz um alívio: como resultado dessa ruptura, muitos de nós (“a direita”) ficamos desobrigados a apoiar teses esdrúxulas, como a recomendação contrária ao uso de preservativos e o impedimento jurídico a que dois contribuintes adultos e do mesmo sexo pactuem uma união civil. Ao mesmo tempo, não precisamos mais fechar os olhos e fingir que toda acusação de pedofilia contra padres não passa de armação jornalística. Podemos, assim, nos ater ao que é essencial: a luta contra a ingerência crescente do Estado na vida dos cidadãos, os obstáculos impostos à livre iniciativa, a criminalidade e a obsessão tributária dos governantes. Independente das contradições ideológicas pelas quais passem as instituições, a crença cristã persiste inabalável como a mais bela fé já professada pelo homem. Contudo, também é legítimo que muitos católicos rejeitem essa representação de igreja, ideológica, partidária, tolerante apenas quando lhe convém, e que parece servir mais a Marx que a Jesus. Segundo a visão da CNBB, conservadores e igreja católica estão cada um por si. E, pelo jeito, é graças a Deus.
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