Trimmm - Alô. - Alô. Quem está falando? - É o Tom. - Ô Tom, aqui é o Zé. Que voz é essa? - É uma gripe que me pegou... Tudo bem, Zé? - Mais ou menos. Fazer interurbano daqui é um horror... Tem que pedir pra telefonista e ela não me entende direito. Mas deixa pra lá. Escuta, eu disse que ia dar merda, não disse? - Como assim? - O lance dos caras querendo tomar nossas instalações e investimentos. A gente não pode confiar nessa gentinha que fala essa língua confusa, vive de forma confusa. Tudo aqui é improvisado, pô. - Mas ganhamos dinheiro, né? Como nunca! - Eu sei! Mas não gosto de fazer negócio com gente assim. Ô povinho. Eu sempre tive medo que eles metessem a mão nas nossas propriedades. E até o Chavez se meteu no negócio! - Latinos, meu caro, latinos e vizinhos... mas quando o presidente assumiu o poder nos braços do povo, fez um monte de promessas. Havia o risco de que ele as cumprisse. - É. Eu sei. Mas é que essa turma nunca é de cumprir as promessas... - Risco, meu amigo, risco. Os caras têm apelo popular. - Pode ser, mas se não fosse por nós, eles não teriam tecnologia nem recursos para explorar toda essa riqueza que eles têm no solo. - Também acho. Nossos técnicos é que ensinaram os deles. Mas isso, só, nunca deu segurança para ninguém. - E os contratos? Tem leis globais que todo mundo tem de respeitar. E eles não respeitam! Agora resolveram pegar tudo pra eles! E o monte de dinheiro que investimos lá? Vão nos ressarcir? - Ah, eu acho que não. - Mas tem contratos, pô! - É. Mas a questão lá não é relacionada a negócios. É ideológica. - Como assim? - Os caras vão quebrar os contratos por uma questão de ideologia e não de desrespeito às leis... Eles têm que dar uma satisfação para o povo. Vêm eleições aí. - É... O que esperar de um presidente que fica falando bobagens por onde passa? Por onde vai fica colocando aquelas roupas ridículas. Esta semana recebeu uns índios lá no gabinete. E se vestiu de índio! - Isso é típico, meu caro. E o povo adora. É um deles que está lá... - Pois eu acho que a gente devia era jogar duro. - Como assim? - Ah, usar nosso poder econômico e boicotar os caras. Garanto que eles vão ficar mansinhos, mansinhos. Ou então comprar todo mundo lá. Lembra daquele ministro que era "funcionário" nosso? - Lembro... Mas ainda acho que a maior parte da culpa é nossa. - Nossa? Mas como? - A gente não construiu uma rede de relacionamentos forte. Compramos. Só quisemos tirar lucro, lucro, lucro. Não devolvemos para a comunidade parte do que ganhamos com ela. Em volta das nossas instalações é um miserê só... Por isso nos odeiam. - Como assim, odeiam? Nós somos amados! Somos o grande irmão! Somos quem mais compra deles! Sem nós eles estão quebrados! - Não nego nossa importância econômica. Mas estamos longe de ser amados. Somos suportados. O tempo todo fomos exploradores e compramos o apoio dos políticos. Sabíamos do risco de quebrar a cara. Por isso fizemos questão de ganhar tanto! Nenhum acionista reclamou enquanto estivemos lá... Mas fique frio. Logo as eleições passam e voltamos a ficar de bem. - Você ta certo. Mas a gente tinha que tomar mais cuidado com essa gente. Eu por mim comprava logo a Bolívia inteira e mandava o Evo embora. - Bolívia?... Evo? - ... É... Bolívia... Evo Morales... O gás da Petrobras. - Bolívia? Petrobras? Mas eu to falando é do Brasil, do Lula e de nossas patentes de remédios feitos com plantas da Amazônia. - Brasil? Amazônia? Mas quem é que está falando? Não é o Tom Henrique do Ministério, em Brasília? - Não. Aqui é o Tom Smith, dos laboratórios Klint Health International em Miami. - Desculpa. Foi engano.. Click. Nota do Editor: Luciano Pires é jornalista, escritor, conferencista e cartunista.
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