A coisa toda começou quando eles resolveram interromper os sinais dos celulares dentro dos presídios, por causa daqueles ataques todos em São Paulo. Para que a coisa desse certo, os bairros em volta dos presídios também acabaram ficando sem celular. Em alguns casos, até cidades inteiras. Uma decisão drástica dessas que, a princípio, parecia ser mais um problema que uma solução, com os meses mostrou-se inesperadamente muito boa para a convivência das pessoas. Já que não dava mais para conversar pelo celular, as pessoas passaram a conversar com os vizinhos mesmo, que estavam logo ali, à mão. Foi uma verdadeira revolução. Vizinhos que nunca tinham se falado passaram a se conhecer melhor, a trocar idéias e opiniões. Um vizinho que era professor de inglês começou a ajudar o filho do outro vizinho, que andava com problemas na escola. Não demorou para que, todas as noites, ele passasse a fazer um trabalho voluntário com a criançada do bairro, ensinando inglês numa sala de aula adaptada na garagem. E outros passaram a fazer a mesma coisa, cada um na sua especialidade. Literatura. Matemática. Filosofia. A experiência foi divulgada pela imprensa e, sem ninguém perceber exatamente quando, as vendas dos celulares começaram a despencar e ninguém mais tinha celular no país inteiro. Foi quando alguém pensou: se deu certo com o celular, porque não com o computador? A princípio, a título de experiência, desligou-se a internet somente em alguns bairros isolados dos grandes centros urbanos. E o que aconteceu foi que, de dia, as pessoas começaram a andar pelas ruas. Começaram a freqüentar os parques públicos e a perceber que eles andavam muito abandonados. Algumas mães tomaram a frente e passaram a cuidar dos jardins, plantando flores e hortas comunitárias, enquanto seus maridos passaram a reformar os brinquedos dos parquinhos. À noite, sem Orkut, sem Messenger, nem nada dessas coisas, os jovens também começaram a sair mais de casa. Mas, como não tinha muito o que fazer, passaram a se reunir e programar shows de bandas de amigos em apresentações gratuitas, festas, e teve até um pessoal que resolveu montar uma peça de teatro, o que fazia com que eles andassem sempre juntos, inibindo a ação dos poucos bandidinhos que ainda restavam por ali. É claro que a internet não acabou, as firmas e empresas continuaram usando os computadores e a internet para enviar seus dados e para facilitar seus cálculos estruturais, mas isso agora era coisa para se trabalhar, não para se divertir. Foi quando alguém pensou: e a TV, hem?
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