Há duas linhas de críticas a Lula e ao PT. Uma, de corte liberal-conservador, a que endosso, é a linha de que estão levando o País ao desastre econômico e político, cujo desfecho será a implantação, pela via eleitoral ou não, de um regime totalitário socialista. Algo como houve na Alemanha dos anos trinta do século passado. Parece que estamos a repetir, passo a passo, a trilha do nacional-socialismo alemão, com a diferença de que o inimigo aqui não é uma raça definida, mas uma classe social, a burguesia. Os "ricos" na linguagem chula dos comunistas tupiniquins. A outra crítica é feita "por dentro", ou seja, feita por aqueles que comungam com os objetivos dos atuais donos do poder, mas discordam das suas táticas, dos métodos empregados e das concessões feitas aos inimigos "neoliberais". Por isso preciso dizer algumas palavras sobre a entrevista publicada na revista Veja que chegou às bancas, dada por Maria Sylvia de Carvalho Franco, "filósofa" da USP e da UNICAMP. É um exemplo de crítica "por dentro" às propostas políticas que se têm alternado no poder, o "mais esquerda" do PT versos o "menos esquerda" do PSDB. Eu quero aqui sublinhar a gritante imoralidade desses críticos puristas marxistas, pois o que eles almejam é a revolução socialista rápida e rasteira, nos termos da Revolução de Outubro, de preferência precedida de um golpe de Estado, para ficar mais romântico. É a insanidade elevada às últimas conseqüências. Drª Maria Sylvia, com sua fala mansa e seu jeito suave, não nos diz outra coisa. Revolução é a expressão da imoralidade política radical, da mentira mais deslavada, a negação do que é mais sagrado e mais natural à pessoa humana. É a forma de governo mais infernal que a humanidade já inventou para si, produzindo mortos aos milhões onde a empreitada foi levada a cabo. Vamos à entrevista. "Lula é um fenômeno que guarda peculiaridades. Sua característica mais evidente seria a esperteza. Ele tem um certo tipo de inteligência que pega o momento oportuno e segue nesse rumo. Hoje eu não tenho mais dúvida de que, mesmo no período em que era líder sindical, seu projeto era uma mudança de classe. A mudança dele - já que, pela natureza do capitalismo, é impossível a mudança estrutural de toda classe operária. Ocorre que, quando indivíduos isolados transpõem essa barreira, perdem a determinação da classe da qual saíram e assumem a determinação de outra classe". O conceito de classe social carece de substância, pois a realidade radical é o indivíduo, o vivente. Classe é uma abstração e como tal não pode ser sujeito de nada. Nesse contexto, a própria palavra "capitalismo" perde sentido, sendo usada como uma forma de depreciação da realidade dada. Se Lula quis crescer na vida, chegar "lá" para se enriquecer, para realizar sua personalidade, para ser sujeito de suas circunstância, ele o fez muito bem. Fez o que qualquer homem faria, na plenitude de sua liberdade e de suas forças. O problema é que a entrevistada vê nisso um mal. Supostamente ele deveria obedecer não aos seus interesses pessoais, mas aos de um coletivo, implícito aqui o partido. Quem acompanha os fatos sabe que Lula segue direitinho o que quer o partido e o Foro de São Paulo, mas Drª Maria Sylvia não relata esse fato, na verdade esconde-o, pois revelá-lo seria desmenti-la na lata. Lula vira, na sua descrição, um mero burguês recém migrado de classe, um traidor da classe operária, um alpinista social. Antes fosse, seria menos nocivo para os brasileiros. A "filósofa", por partir do conceito vazio de classe social e por ignorar os fatos políticos mais óbvios - que o PT, partido revolucionário, está no poder para fazer a revolução e que há um organismo maior, o Foro de São Paulo, coordenando as ações revolucionárias continentais - equivoca-se ao tentar analisar os fatos políticos mais comezinhos: "O problema está na forma como o poder republicano se institucionalizou no Brasil. A lógica da Presidência é imperial, de concentração de poderes. Mas há também os defensores dos interesses regionais, que têm sua sede no Parlamento. A função deles é garantir uma parte dos recursos que são sugados para os cofres do governo federal. Nessa queda-de-braço, o presidente da República dificilmente contará com um bloco muito fiel entre os deputados e senadores. Em decorrência disso, passa a exercer pressão sobre o Congresso de duas maneiras: fazendo a interlocução direta com as massas, e virando o pai dos pobres, ou desviando dinheiro público para encher os bolsos de parlamentares aliados e, assim, garantir apoio. É Bolsa Família e mensalão". Desde que foi fundada a República brasileira ninguém havia escutado falar em mensalão até Lula assumir o poder e o programa Bolsa Família é uma criação petista, inspirada em seus ideólogos (quem não se lembra de Betinho e suas campanhas contra a fome, um emblema do PT?) e transformada na grande força eleitoreira. Em resumo, os dois instrumentos são a expressão da falta de escrúpulos da esquerda, de sua má fé, de sua preparação para uma forma nefanda de democracia direta, no moldes do que Chávez faz na Venezuela. Já que os bolcheviques petistas não puderam acabar com o Parlamento, foram direto às compras de votos. Essa é uma realidade muito simples, uma superfície plana e clara e nada tem de burguês. É o esquerdismo aplicado pelo petismo, é o resumo de sua forma de governar. Nada tem a ver com a República, com as oligarquias, com erros na estruturação política. A falha é moral, é a má fé que sustenta os pagadores de mensalão, os mesmos que pagam os múltiplas bolsas e os múltiplos vales para o populacho. O vício de seu grupo político é, por mágica, transformado em vício de toda a classe política e da própria República, algo notavelmente falso. Sua conclusão não poderia ser mais cômica: "Essa reeleição de Lula é perigosa. Há um vazio político muito grande. Toda uma geração está deixando a vida política e não há uma nova para assumir esse posto. Entre os partidos só vejo o PV, do Fernando Gabeira, e o PSOL". Quem é Gabeira? Até outro dia um revolucionário profissional, que fez da liberação do uso das drogas e da depravação dos costumes sua plataforma eleitoral. E o que quer o PSOL? Esse quer a revolução já, a destruição rápida e rasteira do que resta de propriedade privada, a tomada do poder pela força. É a vanguarda do atraso. Veja, caro leitor, que a reeleição de Lula não é tida como perigosa por aquilo que de fato representa, a ameaça totalitária, mas porque a entrevistada pensa que Lula não é capaz de implantar o totalitarismo que almeja e nem mesmo estaria disposto a fazê-lo, visto ser um suposto traidor da classe operária. Uma mentira e um erro de avaliação somados. É tida por perigosa porque - Oh, Horror! - poderá trazer forças políticas de direita, inexistentes, ao poder. Toda a "filosofia" da USP e da UNICAMP está exposta em sua entrevista. É a vulgata marxista com todas as letras. Lixo ideológico, mentira sobre mentira, o oposto do filosofar. A "filósofa" não tem razão nem quando diz que uma geração está passando e outra não foi formada para pôr no lugar. Foi sim, minha senhora: são seus estudantes, os filhos da elite de outrora que hoje papagueiam o politicamente correto nos jornais, nas tvs, nos bancos, nos escritórios, nos partidos políticos, nos becos da esquina. Lavagem cerebral completa de toda a nova geração. De repente, aparecerá um novo Marighela, um novo Lamarca. E a novidade mesmo é que a razão não terá ninguém a defendê-la, entraremos no túnel escuro do totalitarismo sem qualquer esperança. Nota do Editor: José Nivaldo Cordeiro é executivo, nascido no Ceará. Reside atualmente em São Paulo. Declaradamente liberal, é um respeitado crítico das idéias coletivistas. É um dos mais relevantes articulistas nacionais do momento, escrevendo artigos diários para diversos jornais e sites nacionais. É Diretor da ANL - Associação Nacional de Livrarias.
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