Já é senso comum que resultados positivos e inovadores são obtidos quando se trabalha com uma equipe heterogênea em termos de formação acadêmica, sexo ou habilidades. No entanto, o tabu ainda permanece em relação à admissão de pessoas com deficiência no ambiente empresarial. Afinal, poucas empresas investem na diversidade visando o sucesso do seu negócio. É verdade que não é nada fácil encontrar deficientes visuais, auditivos ou físicos preparados para concorrerem em absoluto pé de igualdade com demais candidatos do mercado, mas o esforço nessa busca vale à pena.

As experiências pessoais desses indivíduos podem ser enriquecedoras para muitos negócios. A sensibilidade dos cegos com o tato e do surdo com a visão, por exemplo, podem ser diferenciais competitivos em algumas funções. Um caso interessante aconteceu com uma montadora de automóveis de luxo, que detectou que muitos carros saíam de fábrica com pequenas falhas na pintura. Os exigentes clientes da marca começaram a reclamar desses defeitos, mas nenhuma máquina conseguia solucionar o problema.

A solução encontrada pela empresa foi contratar cegos para tatearem os carros na fase final da pintura e assim perceberem se estava uniforme. Somente pessoas com o sentido do tato aguçado poderiam ter essa sensibilidade. Não basta a Lei de Cotas obrigar as empresas a contratarem um percentual de portadores de necessidades especiais com base no número de funcionários. Mais importante do que a regulamentação é o reconhecimento por parte da comunidade empresarial de que é necessário dar oportunidades de capacitação profissional a esse grupo. Também não se pode desprezar o fato de que é preciso adaptar a infra-estrutura das empresas para receber pessoas com deficiência em suas dependências.

Em alguns casos, são necessárias reformas nas instalações, elevadores e áreas de acesso. Sem mencionar adaptação do transporte público ou treinamento dos colegas para recepcioná-los, treiná-los e adaptá-los ao ambiente empresarial. No entanto, os efeitos colaterais provenientes dessas contratações mostram que vale a pena o investimento. Os funcionários de uma área na qual foi inserido um cego, por exemplo, tendem a encarar os desafios empresariais de forma mais natural e positiva. A convivência com o colega, que muitas vezes vive sozinho e usa transporte coletivo, faz com que os limites dos companheiros de trabalho fiquem, no mínimo, mais elásticos.

O moral do time como um todo tende a melhorar e com tendência sempre em alta. Os cegos aprendem desde cedo que cada metro percorrido nas desastrosas calçadas de nossa cidade equivale a uma importante conquista, que os impulsionará sempre para frente e em direção ao destino final. Proporcionar o compartilhamento dessa sabedoria dentro do ambiente de trabalho pode trazer mais benefícios do que alguns eficientes treinamentos convencionais, com os gurus da moda.

Não há como conviver com um cego sem rever valores ou conceitos como desafio, limite, objetivo, obstáculo, vontade ou paciência. E o melhor é que tudo isto ocorre de uma forma mais do que natural e o aprendizado se dá de maneira lúdica, quase que inconsciente. Na integração das pessoas com deficiência à sociedade, é impossível segmentar os mestres dos discípulos. Experimente, não há contra-indicações.

Nota do Editor: Sirlene Toledo é Executiva de Relações Comunitárias da IBM Brasil.