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Opinião
13/07/2006 - 09h10
Pela integridade e contra a corrupção
Ricardo Young - Pauta Social
 
Aposta na democracia

Enquanto os partidos políticos se engalfinham em intermináveis discussões sobre quem é ou foi mais corrupto durante a sua gestão, a questão principal subjacente a esta discussão não está sequer sendo arranhada: a democracia brasileira está em risco. Justamente àqueles que foram eleitos e nomeados para garantir a integridade das instituições dão uma demonstração cabal de que o que está verdadeiramente em jogo não é o efetivo combate à corrupção e suas causas. O que está em jogo é uma luta surda pelo poder onde o combate à corrupção funciona como jogo de cena e mote oportunista. O interesse comum, o combate efetivo à corrupção, o aprofundamento da discussão sobre suas causas, o engajamento pleno das instituições do Estado em processos preventivos e a criminalização radical passam a baila da discussão política.

Todos os partidos políticos em maior ou menor grau estão comprometidos com a atual deterioração das instituições públicas. Relatório recente da Controladoria Geral da União (CGU) revelou que em pelo menos 70% dos municípios brasileiros há casos comprovados de corrupção, improbidade administrativa ou má gestão dos recursos públicos. E, pior, na grande maioria dos casos identificados dão-se em torno de verbas sociais ou de infra-estrutura, áreas que são centrais para a melhoria da condição socioeconômica da população e da promoção de justiça social. Áreas, aliás, em que a população identifica ou reconhece a necessidade da gestão pública e da legitimidade do interesse comum. Portanto, ao fraudar verbas de educação e saúde, não só o governante lança a população no mais primário descrédito sobre a eficácia ou a razão mesma de ser da administração pública como deteriora de forma aviltante as condições de vida da maioria dos cidadãos.

O Estado brasileiro está sofrendo de uma baixa generalizada em seu sistema imunológico. Tal qual um organismo vivo, o sistema imunológico está disperso na circulação e é acionado sempre que algum agente externo ameaça a saúde do indivíduo. Dá-se a luta interna expressa pela crise da infecção e, gradativamente, o organismo externo é expelido ou destruído pelo sistema imunológico. Quando alguma célula do organismo deixa de exercer o seu papel, determinado pelo código genético, pela sua morfologia e funcionalidade intrínsecas, o organismo sofre por disfunção. Mas, quando esta célula, além de cessar a sua função principal, começa a ter ’agenda própria’, isto é, começa a multiplicar-se sem controle, não só os sistemas imunológicos têm mais dificuldade de identificá-las, como o tumor gerado por esta disfunção espalha células cancerosas em todas as direções e a metástase toma conta do organismo, matando-o ou exigindo tratamentos que o debilitam radicalmente.

O Estado Brasileiro dá mostras de que não só o seu sistema imunológico não mais consegue funcionar na detecção da doença da corrupção como parece estar em metástase onde as gangues (tumores) espalharam-se em órgãos vitais da República. Nas três esferas de poder, podemos ver demonstrações melancólicas da deterioração da saúde das instituições democráticas.

O pior da crise é que parece que o próprio organismo do Estado não consegue ensaiar reações eficazes no combate à doença. Ao contrário, seus agentes imunológicos parecem tomados por uma disfunção auto-imune onde devoram-se entre si em vez se unirem no combate a doença fatal.

Metáforas a parte, o fato é que se quisermos defender a democracia brasileira deste grave risco, temos que organizar outras forças presentes na sociedade para que não só se induza políticas públicas eficazes como se reforce a resistência da sociedade e se diminua a tolerância com agentes corruptos. A corrupção existe, ela tem causas claras, estas causas podem ser eliminadas e há um caminho para que isto ocorra.

Uma das causas mais evidentes da corrupção é a existência de forças corruptoras. Dentre elas, o setor empresarial é de longe o mais importante. Seja no financiamento de campanhas políticas, seja na fraude a licitações públicas, seja na sonegação, seja na aceitação da prática de propinas ou na corrupção de agentes públicos fiscalizadores, toda a corrupção empresarial tem em vista benefícios de curto prazo e a prática do acobertamento. No entanto, as práticas de corrupção, ao criarem aparentes vantagens de curto prazo, têm como conseqüência nefasta a distorção da livre concorrência, a sabotagem da competitividade e dos mecanismos de livre mercado, a deterioração da qualidade dos produtos e serviços, a diminuição da capacidade de investimentos, o encarecimento da captação de recursos, a destruição da ética nos negócios e a mitigação da confiança nos agentes econômicos, encarecendo os custos de transação. Como se não bastassem essas conseqüências, a corrupção deteriora o ambiente institucional a ponto de as empresas tornarem-se gradativamente reféns dos agentes públicos corruptos e perderem qualquer acesso a salvaguardas legais que poderiam protegê-las. Em outras palavras, o mote ’cada um por si e Deus por todos’ acaba sendo substituído pelo ’cada um por si e a tragédia para todos’. Ganhos de curto prazo arrasam a possibilidade de lucratividade consistente no longo.

Desde a década de 90, o movimento de responsabilidade social empresarial vem exercitando a visão sistêmica e complexa que permeia a atividade empresarial em seu plano global e vem produzindo evidências inequívocas de como a corrupção ao atentar contra o bem comum produz efeitos ainda mais severos sobre a atividade econômica em seu agregado. Iniciativas na direção da gestão ética e transparente vêm sendo tomadas em diversas instâncias para instrumentar as empresas não só em práticas de boa governança corporativa, mas também em mecanismos capazes de criar um ambiente consistente o suficiente para a geração de uma forte cultura de transparência e combate à corrupção. Em uma economia em que a empresa controla cada vez menos as diversas variáveis que atingem o seu negócio, uma cultura de gestão pela integridade e a capacitação de gestores em ferramentas eficazes para o combate à corrupção criam os anticorpos necessários e o ambiente preventivo para protegerem as empresas dos mais variados agentes de corrupção.

Este tem sido o espírito da maioria das iniciativas internacionais das quais podemos citar, entre outras, a ’Iniciativa pela Transparência das Indústrias Extrativas’, lançamento global do setor extrativo; os ’Princípios do Equador’ e ’The Wolfsberg Anti-Laundering Principles for Private Banking’, no setor financeiro; ’The International Council on Mining and Metals’, promoção internacional do setor de mineração e metalurgia; ’Convention on Combating Bribery of Foreign Public Officials in International Business Transactions’ e ’The ICC Rules of Conduct and the OECD Convention’, da Organização pela Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e da Câmera Internacional de Comércio, respectivamente; além das diretrizes da Transparência Internacional e do décimo princípio do Pacto Global das Nações Unidas. Todas estas iniciativas reconhecem em escala global a necessidade do engajamento profundo do setor privado no combate à corrupção. Portanto, há um verdadeiro movimento internacional comprometido com a erradicação de processos e relações que favorecem a falta de transparência e a corrupção.

O Instituto Ethos, a Patri, o PNUD, o UNDOC e o Pacto Global lançaram em 9 de dezembro de 2005 o texto do ’Pacto Empresarial pela Integridade e contra a Corrupção’ para audiência pública. Este movimento, iniciado no segundo semestre do ano passado, tem como objetivos: unir o empresariado em torno de uma agenda de combate à corrupção; instrumentar a gestão das empresas com o que há de mais avançado em gestão preventiva contra a corrupção; comprometer as empresas com o combate sistemático de práticas estimuladoras de corrupção na relação público/privado; disciplinar as empresas no financiamento de campanhas políticas; criar um fórum permanente para a discussão de práticas, metodologias e estratégias anti-corrupção; disseminar o combate à corrupção nas cadeias produtivas; implementar mecanismos para monitorar e avaliar os relacionamentos estabelecidos; aperfeiçoar o marco legal e ser um agente catalizador de outras forças da sociedade civil organizada para um combate incansável a todas as práticas de corrupção ou àquelas que a favorecem.

Após a audiência pública, foi criado um comitê de mobilização do qual fazem parte mais de 25 organizações empresariais que, juntas lançaram o Pacto para a adesão empresarial na Conferência Internacional Ethos 2006, no último dia 22 de junho. Mais de 200 empresas já assinaram o documento e uma grande campanha pública foi lançada com o apoio de importantes organizações de mídia.
O Pacto Empresarial pela Integridade e contra a Corrupção marca o engajamento definitivo da comunidade empresarial brasileira em um caminho sem retorno para a erradicação de um de nossos maiores males. É claro que o Pacto em si não é garantia de sucesso, mas inicia um processo. Um processo em que as empresas engajadas serão progressivamente agentes de mudança cultural, estimuladores de uma nova cidadania que não pactua e não transige com o crime e o banditismo.

Nas empresas trabalham pessoas, produzem-se bens e serviços que atendem consumidores, todos esses cidadãos. A gestão responsável e o consumo consciente de produtos e serviços de empresas signatárias do Pacto certamente ampliarão o impacto desta iniciativa. A imagem pública das empresas signatárias do Pacto produzirá empatia. O apoio de entidades da sociedade civil organizada, o crescimento de empresas signatárias, o suporte da mídia, a garantia de acesso à informação e a ação ampliada produzirão novos anticorpos na sociedade que poderão determinar uma outra qualidade na gestão do bem público e na qualidade de nossas instituições.

O combate à corrupção, portanto, é antes de mais nada uma ação em escala na defesa da democracia. Se o cidadão comum se sente impotente diante da devastadora disseminação desse mal, novos atores sociais representativos do interesse coletivo devem colocar-se em ferrenha luta contra esta doença desestabilizadora. As empresas socialmente responsáveis, a sociedade civil organizada, as centrais sindicais conseqüentes, a mídia responsável e as universidades são peças-chave na defesa da democracia, no monitoramento e na cobrança incansável de governos e instituições públicas, sua qualidade e seu comprometimento com o interesse comum acima de tudo.


Nota do Editor: Ricardo Young é presidente do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social.

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