Não há mal que sempre dure e nem bem que nunca acabe. A notícia da grave doença de Fidel Castro só é comparável, em termos simbólicos, a dois outros momentos de passamento envolvendo líderes comunistas: o de Lênin e o de Stalin. Propriamente se aproxima mais do segundo, vez que o reinado de terror de Lênin foi curto, poupando a humanidade de seus maus instintos. Stalin foi tão longevo quanto Fidel e sua morte marcou o fim de um ciclo que veio a se concretizar com a queda do Muro de Berlim. Nesses momentos é que se vê com plenitude o primitivismo da forma de governo comunista: só um governa, feito monarca absoluto, e seu desaparecimento pode significar uma espécie de final dos tempos. Algo como ocorria no Antigo Egito. Tudo agora pode acontecer em Cuba, menos ficar tudo como está. Qual Stalin, Fidel criou em torno de si um poder autocrático que não tem substituto. A figura apagada do irmão não tem como substituir o carisma do doente. Na verdade a possível morte de Fidel significará o começo do fim do poder dos homens de sua geração na Ilha, nem que seja por razões biológicas. O novo sempre vem e muda aquilo que está em desacordo com a verdade da alma. Mas Fidel é muito mais do que um ditador. Virou, em Cuba e sobretudo fora dela, uma espécie de ídolo de todos os esquerdistas. Basta ver como as lideranças do PT e de outros partidos nacionais se portaram ao longo do tempo na presença dele: com reverência, com respeito, quase com temor. Uma relíquia bárbara ambulante virou Fidel nas últimas décadas, um faraó mumificado, o senhor da Casa Grande. O Gengis Khan do Caribe, a quem a comunalha rendia todas as homenagens. Sua "carta-testamento", delegando poderes, é um documento digno de piada circense se não retratasse uma realidade hedionda. Ele mostra como um homem pode enfeixar nas próprias mãos tamanhos poderes que só pela morte ou por um documento de delegação na iminência da morte é que esses poderes podem passar a outras pessoas. Um exemplo assim só teríamos na Antiguidade, quando o mundo estava mais próximo do neolítico do que da civilização. Fidel conduziu Cuba à barbárie. Diz lá no documento: "Por causa do enorme esforço realizado para visitar a cidade argentina de Córdoba, participar da reunião do Mercosul, do encerramento da cúpula dos povos na histórica universidade de Córdoba e visitar Altagracia, a cidade onde viveu o Che em sua infância, e além disso assistir logo em seguida à comemoração do 53º aniversário do assalto aos quartéis de Moncada e Carlos Manuel de Céspedes, no dia 26 de Julho de 1953, nas províncias de Granma e Holguín, dias e noites de trabalho contínuo, sem dormir, fizeram a minha saúde, que tem resistido a todos os testes, se submeter a um estresse extremo, e se quebrar". Ridículo. Ele não adoeceu porque está velho e decrépito, porque seu tempo findou, porque a vida, mesmo aquela dedicada integralmente à maldade, tem que ter uma conclusão. Não. Adoeceu porque estava vagabundeando pela Argentina, como se esses convescotes inúteis pudessem maltratar alguém. O rega-bofe é sempre dos melhores e não terá sido o ótimo vinho portenho o responsável pelo seu sangramento intestinal. Invocar momentos de rompantes revolucionários não devolve a virilidade perdida. Mas comunista é assim mesmo: mente até na hora da morte, para confirmar a adesão à sua crença nefanda. Em Cuba não tem Congresso, nem Poder Judiciário, nada. É tudo a sua pessoa: "Delego em caráter provisório as funções tais e tais". Provisório? Quem conhece a história dos partidos comunistas sabe que um documento dessa envergadura jamais viria a público se o retiro pudesse ser temporário. Quer me parecer que seu patrão, Satã em pessoa, está se preparando para recebê-lo. Já vai tarde. Fidel tem morrido a prestação. Aquela queda histórica que comemorei poderia ter liquidado com a múmia, de pescoço quebrado. Mas não foi. Seu semblante nos últimos anos pareceu-me sempre sinistro, como sempre, mas cada vez mais doentio, com um ar mumificado, sem brilho, com cara de bode velho. Mas resistiu o quanto pôde. Um final infeliz para o simpático povo cubano, que não merecia tal longevidade. Antes tarde do que nunca, todavia. Fosse eu George W. Bush aproveitaria o momento para fazer a coisa mais inteligente possível para a duas nações: liberar geral o comércio e o intercâmbio com a Ilha. Desbloquear tudo. Aquele regime despótico não sobreviveria um ano a um regime de livre comércio unilateral dos EUA. Enriqueceria rapidamente os empreendedores latentes em Cuba e forçaria a transformação mais rápida do regime, aposentando a gerontocracia governante. Brindarei quando comunicarem o seu falecimento. Nota do Editor: José Nivaldo Cordeiro pe executivo, nascido no Ceará. Reside atualmente em São Paulo. Declaradamente liberal, é um respeitado crítico das idéias coletivistas. É um dos mais relevantes articulistas nacionais do momento, escrevendo artigos diários para diversos jornais e sites nacionais. É Diretor da ANL - Associação Nacional de Livrarias.
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