Os cínicos, os velhacos estão em todos os lugares: no Congresso, nas Assembléias Legislativas, nas Câmaras Municipais, nas demais instituições, nas empresas, na vida enfim. Mas são facilmente reconhecíveis. Sobretudo quando ocupam a tribuna do Congresso. No Senado, mais precisamente. São arrogantes. São autoritários. Dissimulados. Continuam esgrimindo, como há muito o fazem em seus currais eleitorais, o puído chicote numa mão e a burra repleta de dinheiro e benesses na outra. Numa grotesca pantomima, invisível aos olhos dos que vêem nesses senhores apenas a suposta respeitabilidade e autoridade de senadores da República. Invisível aos olhares ingênuos dos que, por mais que observem, enxergarão ali apenas a pose, a prepotência intimidadora, o bem cortado terno e a retocada maquiagem que dissimula a máscara e a sua nova fantasia de ocasião, de paladinos da moral. Hoje, posam, de modo canhestro, de "oposição". Mas são, em verdade, eles mesmos, ou seja, a mais perfeita tradução e o mais fiel retrato da situação de ontem, de hoje e de sempre: a personificação dos desmandos, do nepotismo, da roubalheira, da desfaçatez, do velho coronelismo recauchutado/repaginado com um fosco e malcheiroso verniz de "modernidade". Posam de senhores da situação, de "donos do poder", mas são, de fato, apenas uma espécie de capatazes a serviço dos verdadeiros donos do Brasil. São corruptos. São amorais. Dividem, somam e subtraem o poder em fatias, refestelando-se com o maior naco e distribuindo pequenas fatias e farelos aos seus correligionários e àqueles que, subservientes, prestam-lhe serviços/favores. Mantém-se por décadas no poder. Via de regra, para eles, o poder, e as benesses que dele advém, é, mais ou menos, algo inato, algo que lhe é devido, pois de direito, inalienável. Como um bem herdado de geração a geração. Como uma herança de família. Dominam os órgãos de comunicação, pois eles (ou "os seus") são proprietários dos principais veículos de comunicação. Dominam o Ministério Público em seus estados e, além do Executivo, também dão as cartas no Judiciário e no Legislativo. Têm em suas mãos, pois, todas cartas e poderes da república. Posam de senhores respeitáveis, de representantes do povo e de seus estados, seja na Câmara ou no Senado. Nem parecem, vendo-os assim de longe, que são apenas os ordinários coronéis de sempre. São, na verdade, homens pequeninos, indignos do mandato que lhes foram outorgados. São cínicos, repito: velhacos. São deputados e senadores que, em sua maioria, desonram e amesquinham a representação parlamentar. São, apesar da pose, meros feitores e/ou meliantes, e executam com impressionante desenvoltura e um desdém absoluto pelo julgamento público, a pilhagem do Estado, por intermédio do aparelhamento da máquina pública, de gigantescos e incessantes desfalques no erário e da privatização de bens públicos - a chamada "privataria" da República. Desviam recursos da saúde (de remédios, de hospitais, de ambulâncias etc.), da educação, da merenda escolar, até da Previdência e da Assistência Social - por mais hediondo que isso possa parecer-nos. Desviam recursos até mesmo da chamada "indústria da seca". E, afinal, como todos sabemos, recursos esses que já são escassos na sua origem. Vendo-os, assim à distância, esgrimindo sua verve e cinismo na tribuna do Congresso, não se diria que um deles serviu, de modo diligente, à ditadura militar, perseguiu e até matou adversários políticos em seu estado, que grampeou a intimidade de uma sua amante, que violou o sigilo do painel do próprio Senado e, por isso, teve que renunciar ao mandato; não se diria que um outro foi dirigente de um dos organismos da repressão à época da ditadura; não se diria (quem poderia imaginar?) que um outro, o mais virulento deles, é líder da bancada de um partido que, nos oito anos em que esteve no poder, num passado mais que recente, fez inconfessáveis negociatas, destruiu a saúde, a educação, comprou consciências, privatizou quase todo patrimônio público nacional e quase levou o país à bancarrota. Vendo-os assim à distância, até parecem homens dignos, respeitáveis. Mas, olhando-os de perto, não passam de velhacos. Não passam de homens desprezíveis que já deveriam, há muito, ter deixado a vida pública. Para o bem da República. Para o bem da nação. Afinal, enquanto esses senhores exercem sua retórica cínica, eleitoreira, vazia, na tribuna do Congresso Nacional ou diante dos holofotes das câmeras de TV, o país prossegue refém do medo, da miséria, da violência e do crime (organizado ou não).
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