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Crônicas
27/08/2006 - 18h18
24 de agosto de 1954...
Eduardo Oliveira Freire
 

Clemilda limpava a cozinha quando ouviu a notícia da morte de Getúlio Vargas. Começou a chorar. Ela adorava escutar o discurso do presidente na rádio; ficava admirada, quando ele proclamava "Trabalhadores do Brasil". Nervosa foi ao seu quarto, pegou a bolsa, e tirou um recorte de jornal, foto de jornal, onde se vê Getúlio Vargas. Olhou, abalada, aquele pedaço de papel, sem acreditar no que acontecia. Aos prantos, manchou a foto. Nesse momento chegou Armandinho, o filho da patroa, que cursava a faculdade de Direito. Ele sempre ficava cercando a Clemilda. Receosa, nunca levou a sério tais cantadas, apesar de se sentir, atraída por ele. Ao escutar soluços no quarto de empregada o rapaz foi ver o que estava acontecendo e perguntou à moça o por quê da tristeza. Ela lhe contou que Getúlio se suicidara.

Armandinho tentou confortar a moça e ao ver a foto manchada em suas mãos, lembrou-se de que seus pais tinham várias fotografias de Getúlio. Disse a ela que descansasse um pouco e que logo voltaria. O rapaz entregou as fotos a Clemilda. Tinha uma queda por empregadas domésticas, como a maioria dos rapazes da época. A empregada, triste e fragilizada, deixou-se envolver na lábia do rapaz. Tudo terminado, ela saiu do quarto e arrumou suas trouxas. Tinha que arranjar outro emprego.

Passaram-se dois meses e Clemilda descobriu que estava grávida. Resolveu abortar. Uma amiga a levou a uma clínica clandestina; teve medo de morrer. De repente, pegou na bolsa foto de jornal do Getúlio Vargas e com fervor pediu ao "pai dos pobres", que a salvasse daquela situação.

Voltou para casa e contou tudo a seus pais, com a certeza de que o pai iria espancá-la e a mãe ficaria decepcionada com ela. Mas, por milagre, não aconteceu nada disso. Os pais ficaram bravos, porém não houve espancamento e nem foi expulsa de casa.

O pai resolveu que Clemilda passaria uns tempos para casa da irmã dele. Não tinham condições de ficar com a criança e tampouco queria que as fofoqueiras de plantão (dessas que põem cadeiras na rua e futricando a vida alheia) comentassem sobre a moral da filha.

Três anos depois, Clemilda casou com José, um serralheiro. Teve dois filhos que a amavam. Era consideradas uma boa dona de casa, esposa dedicada, mãe paciente e avó carinhosa.

Ela guardou a foto de jornal do Getúlio, até os últimos dias de vida. Pensava que ele era um santo homem. A sua neta, que era uma professora de história, nunca entendeu essa exagerada admiração. Considerava Getúlio um ditador:

- Ele matou e violou os direitos de muitas pessoas. Fez coisas boas sim,
mas, não era santo. Não acredito em ditador bonzinho. Quem acredita, é porque crê em Papai Noel.

Quando morreu sua avó, lembrou-se dos constantes debates, que tinha com ela, sobre a polêmica figura de Getúlio Vargas. Nunca ninguém soube o segredo de Clemilda.

*

Getúlio, o filho que ela abandonou, passou toda a infância no orfanato. Quando cresceu, arranjou um emprego público e constitui a sua própria família. Ele jamais se interessou por política.


Nota do Editor: Eduardo Oliveira Freire é formado em Ciências Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Está cursando Pós-Graduação em Jornalismo Cultural na Estácio de Sá e está aspirante a escritor.

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