Abro o e-mail, e quase tenho um troço, como dizia a outra. Um internauta de seus trinta anos, que não conheço, tinha acabado de visitar o meu Galho de Arruda, e agora me consultava para saber se podia usar um dos meus poemas na dedicatória de um livro que pretendia dar à namorada. Que delícia! Sem cabotinismo, na hora isso me pareceu mais importante do que ter uma brochura de minha autoria comprada anonimamente numa loja qualquer. Um admirador dos meus versos apresentava-se francamente a mim, deixando até telefone, pedia um poema emprestado e o destinava a uma função tão lisonjeira. E prometendo citar autoria e sítio, coisa que ainda não pegou muito na internete. Para meu espanto, esclareceu que tinha a intenção de impressionar a garota com algo bem romântico, pois precisava urgentemente romper algumas de suas defesas e levá-la para a cama. Não, não me soou machista. Nem um pouco. Ao contrário, parecia haver muita candura na forma como me deu a notícia. Mas que poema abençoado era esse?, indaguei a mim mesmo, já interessado, pois se desse certo com ele... Lá estava: Ela sabe cuidar dos lençóis quando a noite cresce em promessas de alcova. Ele conhece os caminhos, e tudo é caminho em meu corpo. Tudo é paragem entre um porto e outro. Bem, sinto uma certa dificuldade em não concordar com o malandro. Nos meus dezessete de idade, tenho certeza de que teria respondido de outra forma, com aquela saudável presunção da primeira juventude: "Pode levar. Já comi muita gente com esses versos." Hoje, aos cinqüenta e oito, limitei-me a confessar minha gratidão, comovido, torcendo por ele. Vai fundo, meu caro!
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