Aos quatorze anos, eu estava com os hormônios explodindo e começando a achar que meninas talvez fossem... legais. Uma vizinha começou a me despertar umas sensações estranhas. De repente, começou a ficar bom estar perto dela... E eu, moleque de tudo, não tinha a menor idéia do que fazer. Pô, estávamos em Bauru, interior de São Paulo, em 1970. Não tinha esse esquema de "ficar", de beijar dez por noite... Todo mundo era recatado. Abordar uma menina, só pra namorar. E era uma aventura para um garoto tímido de quatorze anos. Dava um frio terrível na barriga. Um dia chegou a Bauru um daqueles parques de diversões que ainda circulam por cidades do interior. Naquela época, era um acontecimento! Para a garotada que não tinha os videogames, os DVDs e as baladas, o parque era o grande barato! Uma festa de cores e sons. Jogo de argola, algodão doce, chapéu mexicano, roda gigante, trem fantasma... até chegar na atração máxima: Monga a Mulher Gorila. Visto de fora, dava medo... A atração prometia uma mulher que se transformava em gorila diante de nossos olhos! Fui ao parque com um tio e, apavorado, vi a Monga. A mulher se transformava, ficava nervosa e ameaçava saltar sobre o povo que estava espremido num cubículo, era um horror! Quase morri de susto. E então tive a idéia... Convidei a vizinha para ir ao parque e ela aceitou toda contente. Fizemos aquele passeio tradicional de pré-namorico, até maçã do amor eu comprei pra ela. E aos poucos fomos chegando a meu objetivo: a Monga. Paramos diante da atração apreciando as pinturas da fachada colorida. De um lado a mulher bonita, de outro o monstro peludo. E então botei em prática o meu plano, convencendo a menina a entrar para ver a fantástica transformação. Ela estava apavorada mas eu a tranqüilizei com uma frase do Dr. Smith, de Perdidos no Espaço: - Nada tema, com o Lu não há problema. Entramos... Aquele ambiente de terror, luz baixa, todo mundo apertado em frente a uma espécie de palco-jaula, minúsculo... Música ruim e a voz do apresentador criando um clima. Meu plano era perfeito. Coloquei a menina na minha frente, de cara pro palco. - Fica aqui. Fica aqui. E me coloquei, estrategicamente, atrás dela. Esperando... Então entra a mulher, que ainda não era a Monga. Vestida com aquela roupa de circo, pernas de fora e cara de medo. O povo meio nervoso fazendo comentários. Baixa a luz. Sobe a música. E começa o ritual, com a música em crescendo e a mulher se contorcendo... Por meio de um engenhoso jogo de iluminação e espelhos, dá-se a transformação. Pêlos, traços animalescos... O narrador, com a voz empostada, vai dramaticamente chamando a atenção de todos: - Vejam! Agora surgem pêlos no braço. Olhem como o rosto começa a transformar-se... É a fera! A fera! E logo, onde havia a mulher delicada agora estava a Monga. Uma espécie de gorila, que vai ficando nervosa enquanto a música aumenta. Começa a pular e a gritar, cada vez mais agitada. O barulho é ensurdecedor. As pessoas gritam, apavoradas. Pra piorar, uns caras dão tapas nas laterais de lata do cenário: Tum! Tum! Tum! O apresentador fica desesperado: - Calma! Calma! Calma! E então, num gesto brusco, a Monga abre a jaula e meio que salta sobre a platéia, bem em cima da menina que estava na minha frente. Berros de pavor! A garota toma um susto tremendo e vira-se pra correr desesperada, apenas para me encontrar de braços abertos, com um leve sorriso de olhos fechados, esperando para o abraço delicioso... Que baita plano, sô! Tomei uma puta joelhada no saco. Aquele que seria meu primeiro amor acabou quando a Monga pulou. Não ganhei a menina, mas aprendi que mulher, seja normal ou monga, dá um trabalho... Nota do Editor: Luciano Pires é jornalista, escritor, conferencista e cartunista. Faça parte do Movimento pela Despocotização do Brasil, acesse www.lucianopires.com.br.
|