Há amigos meus que amam de paixão os dias de eleição. Ficam simplesmente fascinados com a movimentação das pessoas, com os cabos eleitoreiros discretamente fazendo boca de urna, com os ficais muitas vezes com os nervos a flor da pele quase indo para as vias de fato devido a alguma suposta irregularidade em uma determinada urna (e como eles são criativos para imaginar irregularidades). Em fim, gosto é gosto, cada qual tem o seu já dizia um garotinho comendo tatu. Eu, de minha parte, prefiro ficar a contemplar os comentários pós-eleições. Como são curiosos os ditos que surgem após um pleito. Ver as expressões nos rostos das pessoas diante dos resultados, as análises das variáveis que levaram a fulano ter obtido determinada votação e beltrano outra. Neste momento temos uma imagem clara da sociedade fazendo justamente aquilo que não fez durante o período de campanha, que nada mais é que a análise fria do fenômeno político. Antes disso o que temos? Empolgação gratuita em torno de um determinado candidato apresentado por um "cacique" local como se este fosse um redentor da municipalidade ou como alguém com quem as pessoas deste local devessem render sentimentos de gratidão infusos devido a uma benesse que este tenha direcionado para a referida comunidade. Todavia, em momento algum se questiona, se investiga a vida política do sicofanta como também em nenhum momento o cidadão pára pra pensar quais motivações estão norteando a ação do "cacique" local. Aliás, sabe, mas não leva tal hipótese em consideração. Ou a leva, por estar pleiteando um futuro benefício com tal atitude. Bem, a hipótese em questão seria tão só a da realização de uma campanha para determinado candidato simplesmente para se obter o dito "mando político local". Pouco importa se ele tenha índole suspeita, que esteja sendo acusado de algum crime ou se ele realmente é uma pessoa digna de confiança. O que importa é que o indivíduo seja consagrado nas urnas e que o cidadão votante esteja do lado dos barnabés que obterão o dito manto político local. O fato de este vir a ser um bom ou mal legislador, nestes casos, pouco importa, visto que a preocupação era unicamente local sem ao menos levantar-se as possíveis repercussões Estaduais e Nacionais de sua leviana escolha. Além disso, o que é mais interessante ouvir dos comentários pós-eleições são as pessoas perguntarem umas para as outras: "e aí, você perdeu o seu voto?" Perder voto? Que diabo é isso meu Deus? O fato de elegermos um biltre significa que eu fui vitorioso? Vitorioso no que? A impressão que se tem é que o votar apresenta-se nestes casos como uma grande molecagem onde o que importa é basicamente chegar ao final é poder estar junto dos vitoriosos e gritar: "nois ganhemo"! Ora, ao nosso ver, se levarmos em conta a representatividade a partir das convicções políticas, voto não se perde de modo algum se o candidato não vir a se eleger, visto que você escolheu alguém que representa uma plataforma de idéias e não uma pessoa que favoreceu ou irá que lhe favorecer. Na verdade, são nestes casos em que o voto está perdido. Lembro-me com clareza que dois anos depois do penúltimo pleito uma colega de seara veio para mim mostrar uma lista, feita pelo sindicato, de Deputados Federais que se colocaram favoráveis a revisão da CLT de modo que lhe desagradava. Entre os deputados que estavam na lista estava o que ela havia votado e feito campanha porque este tinha beneficiado o seu município com algumas emendas (um microônibus e uma sala de múltiplo uso, no caso). Ela estava revoltada, cuspindo marimbondo. Bem, isso é que dá votar em legislador por "favor" ofertado e não por representar os seus anseios e convicções. Você, por um acaso, não votou assim, votou? Só pra variar...
Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
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