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Opinião
31/10/2006 - 11h19
Macunaíma vai às urnas
Rodrigo Rocha - MSM
 

Macunaíma é o anti-herói tupiniquim clássico: indolente, fraco de espírito, moralmente flexível e dono de um caráter duvidoso. O personagem foi criado pelo genial Mário de Andrade para representar uma parcela dos defeitos mais visíveis dentre aqueles já definitivamente arraigados no modus vivendi do brasileiro mediano. Macunaíma é, portanto, um épico de crítica, uma ilustração inglória da cultura de malandragens, de “jeitinhos” e, muitas vezes, de patifaria pura e simples. O mito de Macunaíma em nenhum momento deixou de povoar o inconsciente coletivo nacional, e os fatos com que acabamos de nos confrontar na vida política do país servem para evidenciar o quanto ainda estamos distantes de nos desvencilhar de vez desta transgressão cultural tão vexatória.

O triunfo da desonestidade, da impunidade, da criminalidade e da pilantragem está exposto em letras garrafais nas manchetes de todos os jornais de hoje, para desespero e vergonha dos brasileiros honestos e conscientes. Não, não estou dizendo que todos os eleitores que depositaram seus votos em Lula sejam, necessariamente, como ele. Mas é impossível não assinalar a constatação bizarríssima de que o espírito de Macunaíma está longe de abandonar as opiniões, palavras e gestos do povo brasileiro; um povo que deu, mais uma vez, provas de que ética e caráter são conceitos infinitamente relativos para seus delicados intelectos. Não deixa de ser estarrecedor, ainda, a forma como as coisas se deram: nunca antes o leviatã macunaímico brasileiro havia se manifestado com tamanha intensidade e virulência. Talvez seja um caso único na história da humanidade que um grupo de pessoas comprovadamente envolvidas com crimes como fraude (caso dossiêgate), corrupção ativa e passiva (mensalão, valerioduto, caixa 2, sanguessugas), tráfico de drogas (a campanha de Lula em 2002 recebeu cerca de 5 milhões de dólares da narcoguerrilha colombiana), enriquecimento ilícito (vide Lulinha e Lurian, filhos de Lula), assassinato (caso Celso Daniel), dentre outros crimes execráveis, ainda assim tenha conseguido angariar votos suficientes para legitimar e perpetuar seus crimes por mais 4 anos. A capacidade brasileira de abstrair a ética e relevar o inaceitável nunca foi tão bem evidenciada.

É fato que uma eventual vitória de Geraldo Alckmin neste pleito também não significaria, sob nenhuma hipótese, a instauração repentina de um governo 100% ético, sério e comprometido fielmente com a agenda do verdadeiro crescimento - agenda esta que é composta invariavelmente por medidas hoje tidas como “impopulares”, como uma reforma radical do sistema previdenciário, a retomada dos processos de privatização de estatais mastodônticas e a adoção de uma política externa que retirasse o Brasil da rota furiosa do socialismo de Chávez, Castro e Morales. As posições de Alckmin a respeito destas questões algumas vezes são um tanto quanto nebulosas e até contraditórias. Contudo, também é preciso reconhecer que o aspecto ético, por si só, já deveria ser mais do que suficiente para que o candidato tucano tivesse vencido essas eleições de forma acachapante. Só seria diferente mesmo numa nação de Macunaímas.

O Macunaíma, todavia, não é só um camarada moralmente flexível; também é indolente, voluntarioso, tem preguiça de pensar e se acostuma facilmente com conceitos bestiais como "ele rouba, mas faz". Tem um profundo medo de mudanças - inclusive de mudanças para melhor - e muito facilmente se deixa seduzir pela oferta torpe de pequenas ou grandes vantagens pessoais. E alguém tem dúvidas de que esse perfil se enquadra com perfeição cartesiana ao modelo geral da esmagadora maioria dos brasileiros que reelegeram o Macunaíma-mór? Pior: para disfarçar a própria macunaimicidade ainda apelam para discursos sociais evasivos, cheios de demagogia e desconversa, talvez num desejo macunaímico de fechar os olhos para a verdade e tentar vender uma fantasia diabólica que nem eles mesmos conseguem mais acreditar.

Não é possível afirmar que seremos obrigados a padecer mais 4 anos de pilantragem e roubalheira, pois o instituto do impeachment existe e já chegou a ser utilizado contra um presidente que não tinha nem um quinto da quantidade de escândalos que sabemos que o atual presidente e seus amigos estão envolvidos. Mas é possível afirmar que o mito deletério do anti-herói maldito é a mais perfeita descrição já feita sobre o modo geral de pensar e agir de toda uma Nação - e quanto a este mito, sim, estamos condenados a conviver com ele por muito tempo.

Desesperador é pensar no tamanho do prejuízo que os não-Macunaímas ainda terão, até que os Macunaímas deste Brasil resolvam se envergonhar da própria condição e voltem a conter o costume macunaímico de coadunar com o que não presta. Um costume desprezível que desde a época do “Fora Collor” parecia ter desaparecido de vez. Infelizmente não.


Nota do Editor: Rodrigo Rocha é poeta, escritor e comentarista político.

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