Uma doença grave que pode ser controlada
A hepatite B é uma doença que, se não diagnosticada e tratada precocemente, pode ter uma evolução grave, levando à cirrose e alteração da função do fígado, ou à ocorrência de câncer hepático. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, mais de 300 milhões de pessoas no mundo estão infectadas cronicamente pelo vírus da hepatite B. No Brasil, estima-se que este número seja de 2 milhões de pessoas. Estes números são muito maiores se comparados aos do HIV. O vírus da hepatite B pode ser transmitido de três formas: Pelo sangue - atualmente, com o controle mais rigoroso das transfusões sanguíneas, a maioria dos casos ocorre entre usuários de drogas injetáveis ou no compartilhamento de materiais contaminados com sangue, como lâminas de barbear, agulhas para tatuagem ou piercing e escovas de dente. Por via sexual - a via sexual é, atualmente, a forma mais comum de transmissão. O risco de contágio é muito maior do que o do HIV. A hepatite B deve, portanto, ser considerada uma DST (Doença Sexualmente Transmissível) e todos os indivíduos com vida sexual ativa devem ter acesso a esta informação, para que adotem medidas que evitem seu contágio. Vertical - de mãe para filho, principalmente no momento do parto. Idealmente, as mulheres devem buscar o diagnóstico antes de engravidar para receber orientação adequada e, então, evitar a transmissão para o filho. Quanto à apresentação clínica, a hepatite B é, na maioria das vezes, silenciosa. Na fase inicial, entre dois e seis meses após o contato com o vírus, que denominamos de fase aguda, apenas cerca de 30% das pessoas apresentam sintomas. Estes sintomas são gerais, como fraqueza e náuseas, acompanhados de icterícia (amarelamento de pele e mucosas), escurecimento da urina e clareamento das fezes. Esta é a forma clássica de hepatite aguda, que a maioria das pessoas reconhece. Nesta fase necessita-se de acompanhamento médico freqüente, pois há alguns casos que podem desenvolver perda irreversível da função do fígado. Após a fase aguda, aproximadamente 95% dos adultos se recupera da infecção, contendo espontaneamente o vírus e desenvolvendo imunidade, ficando protegido contra nova infecção no futuro. Os demais indivíduos, no entanto, não criam essa defesa, e são denominados portadores crônicos do vírus. Estes portadores crônicos podem passar décadas sem apresentar qualquer sintoma clínico. A hepatite crônica é praticamente sempre assintomática, podendo ser descoberta apenas 20 a 30 anos mais tarde, quando já pode ter se instalado um quadro de cirrose ou de câncer no fígado. O diagnóstico laboratorial precoce da infecção é importante para que complicações futuras possam ser evitadas. O primeiro passo para o diagnóstico é a realização de um exame de sangue denominado sorologia. A partir deste exame, é possível ao médico diferenciar os casos de imunidade daqueles com infecção crônica. Para estes últimos, exames adicionais serão necessários para definir se há inflamação ou alteração na função do fígado. O exame inicial deve ser feito por todas as pessoas que tenham alguma preocupação com DST ou história de compartilhamento de materiais potencialmente contaminados com sangue. Nos portadores crônicos, quando o vírus apresenta atividade importante ou quando há inflamação do fígado, o tratamento está indicado. Este tratamento tem o objetivo clínico de evitar a evolução para cirrose e diminuir o risco de câncer no fígado. Para o tratamento, existem atualmente diversas drogas, divididas em dois grandes grupos: imunomoduladores (interferon convencional e interferon peguilado) e antivirais (lamivudina, adefovir e entecavir). Há, ainda, a possibilidade de associação de drogas. Uma avaliação médica criteriosa é necessária para definir o melhor esquema de tratamento para cada paciente. Existe, atualmente, vacina altamente segura e eficaz contra o vírus da hepatite B. No Brasil, esta vacina faz parte do esquema básico de vacinação e a primeira dose é administrada logo no primeiro dia de vida. É também oferecida gratuitamente a todos os jovens com até 19 anos e a pessoas consideradas sob alto risco, como profissionais de saúde. Existe também a possibilidade de uso em sistemas privados. Além da vacina, alguns aspectos importantes na prevenção são as precauções com sangue e nas relações sexuais. Não compartilhar materiais com potencial contaminação com sangue, como lâminas de barbear, escovas de dente e aparelhos de manicure. Praticar sexo seguro, o que inclui o uso de preservativos. Lembrar sempre que a possibilidade de transmissão do vírus é muito maior do que a do HIV, justificando a adoção destas medidas. A hepatite B é uma doença com potencial gravidade. Apesar da disponibilidade atual de vacina, a prevalência ainda é alta. Em função de sua evolução clínica habitualmente silenciosa, o diagnóstico laboratorial precoce exerce um importante papel, pois pode permitir a adoção de medidas terapêuticas, diminuindo os riscos de desenvolvimento de câncer e de evolução para cirrose e para necessidade de um transplante de fígado. Nota do Editor: Edson Abdala é Médico Infectologista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina USP - Transplante de Fígado. Possui Mestrado e Doutorado em Doenças Infecciosas e Parasitárias pela USP.
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