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Opinião
03/11/2006 - 15h11
As pessoas precisam parar de ter medo
Peter Hof - MSM
 

Três acontecimentos marcantes ocorreram no Rio de Janeiro nestes últimos 30 dias. O primeiro, que causou grande impacto e extensa cobertura na mídia, foi o da morte de cinco jovens, todos recém-saídos da adolescência, e que morreram em um brutal acidente de carro causado pela mais mortal das combinações: álcool e excesso de velocidade. Para os jornais e as autoridades foi um prato cheio, com direito a fotos em cores em meia página da capa dos jornais, declarações de autoridades, até um Ministro de Estado deu o testemunho de sua indignação contra um fato que em si já é rotineiro.

Segundo o jornal O Dia, de 10/9/2006, baseando-se em informações do CET-Rio, o número de acidentes de trânsito no Rio de Janeiro cresce 9% ao ano e 56% dos mortos têm menos de 29 anos. Ainda na mesma matéria somos informados que os Bombeiros detectam hálito de álcool em pelo menos 40% dos motoristas envolvidos em acidentes. Como sempre ocorre nesses momentos apareceu uma pletora de soluções, recomendações e planos de ação. E como é previsível com tudo o que ocorre neste país o assunto estará enterrado no esquecimento dentro em breve, só levantando-se de seu berço esplêndido quando ocorrer, o que é certo, outra tragédia de iguais proporções.

Falou-se de tudo menos do essencial, do que realmente ajudaria a diminuir drasticamente o problema, como tive oportunidade de constatar nos muitos anos em que morei nos Estados Unidos: uma polícia eficiente, dotada de amplos recursos e treinada para aplicar desde simples testes para avaliar o estado etílico do motorista até o uso de bafômetros. No Brasil, já de cara o uso do bafômetro encontra empecilho na própria lei, de vez que muitos juristas entendem que alguém pode se recusar a fazer o teste, pois ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo... No estado da Geórgia, onde morei, alguém que dá uma festa em casa e permite que um convidado alcoolizado saia de sua casa dirigindo será julgado como co-autor em caso de o convidado envolver-se num acidente. Além disso, todo motorista flagrado dirigindo com teor alcoólico acima do legal é obrigado a passar 24 horas na cadeia!

O número de mortos por ano em acidentes de trânsito é praticamente o mesmo no Brasil e nos Estados Unidos: em torno de 50 mil. Quer dizer então que não estamos tão mal assim? É exatamente o contrário. Vamos olhar um pouco adiante dos números absolutos e comparar acidentes de carros e número de veículos: os Estados Unidos têm 225 milhões de veículos, exatamente 10 vezes mais do que o Brasil. Analisados sob este aspecto e mantidas as proporções, ou no Brasil deveriam morrer 5 mil pessoas por ano em acidentes de trânsito ou 500 mil nos Estados Unidos. E não adianta pôr a culpa nas estradas que, apesar de péssimas, representam 3% das causas de acidentes fatais. A imensa maioria das mortes é resultado de excesso de álcool, imprudência e veículos em mau estado de conservação.

Outra medida que poderia minorar o problema seria a de aumentar a idade mínima para obtenção de carteira nacional de habilitação (ou “carta” como querem os paulistas) para 25 anos. Alguém aí está pensando que isto é inconstitucional ou que viola o direito dos cidadãos? Nem uma coisa nem outra; basta ler a Lei 10.826 de 22 de dezembro de 2003, o malfadado Estatuto do Desarmamento. Lá o leitor vai encontrar no Artigo 28 do Capítulo V (Disposições Gerais) o seguinte: É vedado ao menor de 25 anos adquirir arma de fogo, ressalvados os integrantes das entidades constantes dos incisos I, II e III do Artigo 6 desta Lei. E por que os movimentos “Viva Rio” e “Sou da Paz” não fazem uma campanha no sentido de agregar esse artigo no Código Nacional de Trânsito? A resposta é óbvia: nem eles nem as Organizações Globo, a grande patrocinadora da causa desarmamentista, vão querer abrir fogo contra seus grandes anunciantes: a indústria automobilística, os bancos e financeiras que têm lucros extraordinários com as altas taxas de juros para financiamento, com as seguradoras, com as empresas de tuning e acessórios, e o próprio governo que recebe em impostos 39,29% do valor de venda de um carro pequeno (nos grandes o percentual é bem maior) e 53,03% do preço da gasolina na bomba. No caso específico do “Viva Rio”, não seria prudente, para quem recebe polpudas subvenções da Fundação Ford, se engajar em campanhas que redundariam na redução da venda de veículos...

Enquanto perdurar o status quo vigente, não é preciso ser um sábio para saber que o trânsito continuará a ceifar impunemente vidas de cidadãos brasileiros, jovens em sua maioria.

O segundo evento foi publicado na página 23 do jornal O Globo de 3/10/2006. Embora com menor cobertura de imprensa, ele é o que melhor ilustra o estado de acovardamento e distanciamento das pessoas em relação aos problemas que os cercam, situação essa fruto de tudo que as “autoridades competentes” têm feito para reduzir cidadãos a ovelhas.

Mas vamos ao fato. Aproximadamente às 10 horas da noite de 2/10/2006 uma mulher aparentando 25 anos e, até agora, apenas identificada como Débora, foi encontrada por um guarda municipal, ferida e nua, no Parque do Flamengo na altura do Hotel Glória, no Rio de janeiro. A jovem se encontrava, até a semana passada, em estado grave na CTI do Hospital Souza Aguiar. De acordo com informação prestada pelos médicos ela recebeu dois golpes de faca no pescoço e havia sido estuprada. Embora por si um fato abominável, ele hoje é parte dos riscos a que estão submetidas mulheres que vivem em grandes cidades. A polícia encontrou uma testemunha, porteiro de um prédio das proximidades, que viu um homem armado com faca ameaçar uma jovem por volta das 22 horas. Segundo a notícia do jornal ELE NÃO CHAMOU A POLÍCIA QUANDO VIU A CENA!!!!!! A polícia procura também uma outra testemunha que teria visto Débora caminhando pela Rua do Russel em direção ao prédio da extinta TV Manchete. Ele teria percebido que a jovem, ameaçada por uma faca, mantinha relações sexuais com o assaltante, que em seguida esfaqueou-a. Duas pessoas viram uma mulher indefesa sendo ameaçada com uma faca por um marginal e nenhuma das duas fez NADA!

Vejam o estado de covardia e acomodação a que o povo está reduzido. A regra de conduta é: “se a vítima não é minha mulher, filha ou irmã que se dane, eu tenho mais é que cuidar da minha vida”, é o que pensa o indivíduo comum. Mas também o que esperar do cidadão? Que, se tiver um revolver, ele ameace o assaltante ou mesmo atire para cima? O pobre cidadão, que naturalmente não tem porte de arma, estaria sujeito a amargar de dois a quatro anos de cadeia, sendo inafiançável o “crime” que cometeu de defender a si ou alguém.

Pelo menos três leitores manifestaram sua indignação na seção de cartas do Globo de 9/10/2006. O problema é que precisamos adicionar ação a nossa indignação.

O terceiro caso é o mais emblemático dos três e demonstra à exaustão o que começamos a analisar no caso anterior. “IDOSA ATIRA EM LADRÃO PARA DEFENDER CACHORRO”, foi a manchete de matéria da página 36 do Globo de 8/10/06. Lendo-se a matéria por inteiro, o que primeiro se sente é o cheiro rançoso do preconceito do jornal da famiglia Marinho contra quem se disponha a defender-se ou aos seus com uma arma de fogo. Esta regra, claro, só vale para o cidadão comum, já que os Marinho e suas famílias só se deslocam em carros blindados e protegidos por uma legião de guarda-costas armados, capaz de dar inveja ao presidente Bush. Em suma, lendo-se a matéria fica-se sabendo que a senhora Maria Dora dos Santos Arbex, 67 anos, enfermeira aposentada, moradora do bairro do Flamengo (muito próximo de onde ocorreu o caso anterior), que já foi seqüestrada uma vez e que estava sendo ameaçada por bandidos que agem na área, armou-se de um revolver e quando um marginal que já a ameaçara antes repetiu o feito dona Maria Dora sacou de um revolver calibre .38 e acertou o vagabundo na mão. A lamentar, de todo episódio, apenas que a enfermeira aposentada, que tem curso de tiro, não tenha estourado a cabeça do marginal. Para o bem da sociedade e dela própria, pois como se sabe essa escumalha passa pouco tempo na cadeira e certamente vai voltar a ameaçá-la.

Aí armou-se o circo: a polícia, que segundo os moradores é freqüentemente chamada para retirar os marginais que infestam a área mas nunca aparece, dessa vez, para proteger “um pobre marginal” mandou OITO carros para prender D. Maria Dora. Como no anterior, também neste caso temos um retrato do que se tornou esse país: naquele, pessoas assistem impassíveis a um crime horrível, e neste uma senhora de quase 70 anos defende-se de um marginal que já tentara assaltá-la antes e para prendê-la é montado um esquema digno de prender o Marcola!

No dia 10/12/06 O Globo publicou uma reportagem de página inteira sobre o caso de dona Maria Dora, em que ela expressa toda sua indignação pelo que vem sofrendo nas mãos dos bandidos e da polícia. É claro que jornal dos Marinho não perdeu a oportunidade de consultar especialistas. Por “especialistas” entenda-se o pessoal do “Viva Rio”. Na minha opinião eles são especialistas sim, mas na defesa de marginais associados com o tráfico de drogas e o furto de armas em quartéis, como fez o melífluo senhor Rubem César Fernandes no nojento episódio do líder comunitário William de Oliveira. A matéria do Globo intitula-se “Especialistas acham que idosa deu um mau exemplo”. Em respeito aos leitores que porventura tenham estômago fraco, não vou aqui repetir todas as sandices pronunciadas pelos “especialistas” do “Viva Rio”, mas todos criticaram a atitude de dona Dora sendo que um deles criticou o fato dela ter sido solta: “A gente fica com pena, mas leis devem ser cumpridas”. Certamente na opinião desses energúmenos, “dentro da lei” estava a jovem Débora que foi estuprada e esfaqueada e se encontra até hoje entre a vida e a morte.

Ainda sobre os “especialistas” ouvidos pelo Globo, cabe uma pergunta: por que o jornal ouve sempre especialistas que apóiam o desarmamento dos cidadãos e nunca dá voz ao outro lado, ou seja, aqueles que defendem o direito de autodefesa? Por que não ouvir os especialistas do “Viva Brasil” e também o coronel (recentemente eleito deputado federal) Paes de Lira, um profundo conhecedor do assunto, hoje ouvido em fóruns da Europa e dos Estados Unidos? Por que um órgão de imprensa, que pretende ser tão imparcial nas eleições, não faz o mesmo em um assunto de tamanha relevância?

Como ainda existe gente nesse país que definitivamente não aceita a condição a que o Estado e ONGs como o “Viva Rio”, “Sou da Paz” et caterva tentam reduzi-los, houve uma chuva de protestos por parte de cidadãos insatisfeitos com a condição de ré que tentavam impor à pobre senhora. Em três dias a seção de cartas do Globo publicou a opinião de quatorze leitores e TODOS eles defenderam dona Maria Dora com veemência. Todos os leitores expressaram de forma categórica sua repulsa pela ação da polícia e das sandices ditas pela pessoal do Viva Rio. Um leitor, sr. Rodrigo Dardeau Vieira (O Globo, 12/10/06) fez uma proposta digna de nota: que o Viva Rio mude seu nome para Viva Bandido.

Em 9/10/2006 o Globo OnLine fez uma pesquisa entre visitadores do seu site para saber o que os leitores pensavam sobre a atitude de dona Maria Dora. 1.507 internautas responderam e 89% dos respondentes apoiaram a atitude da aposentada. Vou repetir: OITENTA E NOVE POR CENTO, ou seja, 1.341 respondentes manifestaram solidariedade por alguém que cansada da ousadia dos malfeitores e da inércia da polícia resolveu dar uma resposta memorável a um angustiante estado de coisas.

Hoje existe todo um movimento em favor de dona Maria Dora, que já ganhou o status de heroína: um abaixo assinado apoiando a aposentada está sendo levado a termo por vizinhos dela. Recomendo que todas as pessoas que acreditam no sagrado direito da autodefesa do cidadão assinem o manifesto. É preciso mostrar às autoridades e aos especialistas do “Viva Rio” que não somos ovelhas a caminho do matadouro e que temos espírito de solidariedade por aqueles que não se submetem aos devaneios de uma turba de tresloucados. O vereador Carlos Bolsonaro propôs que a Câmara Municipal outorgue a ela a Medalha de Mérito Pedro Ernesto. Nada mais justo.

O assunto ainda irá se desenrolar bastante. O advogado Michel Assef que defende dona Maria Dora declarou que o ladrão que a assaltou pode pegar uma pena menor do que a dela. Dá para entender? Kafka, se vivo fosse, teria um surto com o Brasil de nossos dias...

Para encerrar, o título desse artigo “AS PESSOAS PRECISAM PARAR DE TER MEDO”, foi retirado da entrevista de dona Maria Dora ao Globo de 10/10/2006. Usá-la como título deste artigo foi a forma simples, mas sincera, que encontrei para homenagear o destemor desta extraordinária mulher.


Nota do Editor: Peter Hof é administrador de empresas e escritor.

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