A Feira do Livro de Porto Alegre está aí e é tempo de a gente se reencontrar, na praça, com o livro. Um objeto maravilhoso, que passou o teste do tempo (afinal, foi inventado há mais de 500 anos) porque é fácil de manejar e é prático: dá para ler até no banheiro. Mais do que isto, o livro sempre foi considerado um símbolo, a porta de entrada para o conhecimento, para a sabedoria. E por isso era, e é, muito valorizado. Os imigrantes alemães que vinham para o RS, pessoas pobres, traziam muito pouca coisa. Mas livros (a Bíblia, ao menos) nunca faltavam na modesta bagagem deles. Houve época em que livro era um bem precioso, um acervo que deveria ser cuidadosamente preservado. Mas a indústria gráfica desenvolveu-se e o mercado livreiro cresceu. Nos Estados Unidos aparecem mais de 100 mil títulos novos ao ano. A oferta é, portanto, muito grande. O que é ótimo. Acontece, porém, que apesar de todas suas qualidades o livro tem um defeito: ocupa espaço. Não é um grande espaço, mas considerando o reduzido tamanho dos apartamentos modernos, cria-se um problema: o que fazer com os livros que a gente já leu, e que há muito tempo não consulta? Os bibliófilos não hesitarão em responder: pode-se sacrificar qualquer coisa, menos os livros. José Mindlin, que é o maior bibliófilo do Brasil, e que recentemente foi eleito para a ABL, tem uma casa para si próprio e outra, muito maior, para os livros, que incluem inúmeras preciosidades. Mas nem todos são bibliófilos, e alguns precisam, mesmo a contragosto, desfazer-se de seus livros. E aí entra em cena a livraria de livros usados, o sebo. A origem desta denominação é discutida. Segundo uma teoria, ela viria do tempo em que se lia à luz de vela, cujo sebo acabava pingando nos livros. Não sei se é assim, porque as apostilas colegiais eram conhecidas como sebentas, mesmo lidas (quando eram lidas) à luz das lâmpadas. De qualquer jeito, os sebos são muito antigos: surgiram na Europa já em meados do século 16. No começo não vendiam livros, e sim pergaminhos e documentos - os alfarrábios. Hoje há sebos famosos. A Strand, em Nova York, funciona há 80 anos, tem 200 empregados e anuncia em sua propaganda que suas prateleiras, juntas, oferecem 18 milhas de livros: mesmo caminhando em passo acelerado, seriam necessários alguns dias só para olhar os livros. Para os leitores contumazes, os sebos podem reservar gratas surpresas: uma raridade, uma edição refinada. Momentos de emoção: num blog da Internet um leitor conta que 20 anos depois de ter vendido um livro encontrou-o num sebo. Banhado em lágrimas, comprou-o na hora. E há muitas outras histórias parecidas: o Guilherme, da Mosaico, conta várias. Para escritores, as surpresas podem não ser tão agradáveis. É um choque para o autor encontrar seu livro num sebo. Pior foi o que aconteceu com o escritor pernambucano Raimundo Carrero. Ele deu para um amigo um exemplar de uma obra sua, autografada. No dia seguinte foi a um sebo e lá estava o livro. De imediato telefonou ao ingrato presenteado, perguntando o que estava achando da obra. "Maravilhosa", foi a resposta. Então vou lhe dar um conselho, disse Carrero: - Da próxima vez que você vender um livro que ganhou de presente, tire pelo menos a página com a dedicatória. Não há dúvida: a gente aprende muita coisa nos sebos. E não é apenas aquilo que os livros têm para nos contar.
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