Durante a campanha presidencial, ouviu-se muito por aí que o problema do Brasil está na educação. Ou na falta dela. Concordo em parte. Há pouca formação de capital humano no país, o que invariavelmente se reflete no desempenho econômico e social. De acordo com o IBGE, na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2004-2005, o grupo “sem instrução e menos de um ano de estudos” representava 11,3% da população analisada em 2004 e 10,8% em 2005. A taxa melhorou ligeiramente de um ano para o outro, mas não é isso o que importa. Uma taxa de analfabetismo de aproximadamente 11% significa uma proporção muito maior de analfabetismo funcional. Não basta saber ler (ser alfabetizado); é importante entender o que se está lendo. O analfabetismo funcional elevado significa baixa capacitação para o mercado de trabalho. Ouve-se muito também que “deveria haver mais investimentos em educação.” Será que deveria? Será que bastaria investir mais e pronto? Será que apenas o dinheiro conseguiria, magicamente, resolver o problema da educação no Brasil? É verdade que com poucos recursos (bibliotecas, salas de aula, professores, material didático etc.) não se consegue muita coisa. Porém, se os poucos recursos que já existem não são aproveitados, quem garante que, se esses recursos fossem multiplicados por 1000, eles seriam aproveitados? Falta dinheiro? Sim, podemos até dizer que falta. Podemos até dizer que poderia haver mais investimentos em educação, principalmente se a iniciativa privada não tivesse as mãos tão amarradas e pudesse ser mais expressiva no setor. Porém o que mais falta é vontade e isso não se compra com mais dinheiro. Não basta construir escolas se as pessoas não querem estudar; não basta construir bibliotecas se as pessoas não querem nem saber de ler. Poderíamos gastar rios e mais rios de dinheiro na “educação”, mas isso não mudaria o fato de que há pouco interesse de parte de boa parcela da população com relação à construção de uma formação educacional sólida e que promova não somente conteúdo técnico, mas também substância ética. Talvez principalmente substância ética. É incrível como muitas pessoas que estão cursando a universidade mostram pouco interesse em aprender. Têm muito interesse, isso sim, em passar nas matérias, mas não em aprender. É como se o conhecimento não fosse importante, pois o que interessa é apenas ser aprovado nas disciplinas. Parece que, quase em geral (há honrosas exceções!), o que interessa não é a qualidade da formação profissional, o que importa é apenas um retângulo de papel que “habilita” a pessoa a exercer uma profissão. Ora, essa mentalidade não duraria muito em um ambiente de verdadeira economia de livre mercado, já que o próprio mercado se encarregaria de fazer a seleção: quem não tivesse uma boa formação, independente da titulação, não seria capaz de encontrar um bom espaço no mercado de trabalho. Acontece que não vivemos em uma verdadeira economia de livre mercado, ainda estamos muito longe disso! Por que boa parte dos universitários não quer aprender, quer apenas um diploma? Pragmatismo? Essa é uma concepção bastante distorcida do que é ser pragmático. Acontece que o principal objetivo dessa boa parte dos universitários não é entrar de cabeça no mercado, não é empreender, não é criar novas atividades, não é contribuir com o esforço pessoal para dinamizar a economia, gerando assim benefícios para toda a sociedade. O principal objetivo é ter um diploma que permita prestar algum concurso público. Lamentável, mas compreensível; empreender, no Brasil, significa “altíssimo risco”. Ora, em toda atividade empreendedora há riscos. Toda escolha envolve riscos. Isso é bom. Isso é saudável. Acontece que, no ambiente brasileiro, há que lidar com outros elementos que acabam acentuando os riscos e tornando-os praticamente inaceitáveis. Por exemplo, temos a corrupção. Se o ambiente tolera a corrupção (os últimos resultados eleitorais são uma evidência disso), quem age de acordo com as regras do jogo está automaticamente em desvantagem competitiva com relação a quem passa a perna nos outros para alcançar seus propósitos. Outro elemento é a morosidade da Justiça. Quando se tem um negócio, a última coisa que se quer é ter de esperar anos a fio para que a Justiça dê uma solução a um conflito. Essa espera significa perda. Grande perda. Ainda outro fator é a falta de clareza com relação aos direitos de propriedade, já que o respeito à propriedade está na base da prosperidade de qualquer sociedade que se pretenda minimamente livre. Já que empreender, no Brasil, significa ter de lidar com essas e outras dificuldades, as pessoas acabam querendo empregos estáveis. Existe algo mais estável, no Brasil, do que o funcionalismo público? Ora, é natural que as pessoas tenham como objetivo os concursos públicos - porque o que querem é estabilidade. Poucos querem correr riscos e mesmo os que têm ímpetos empreendedores e inovadores devem estar cientes de que os nossos riscos são piores do que os riscos que há em muitos outros lugares. No Brasil, a propensão ao risco beira a estupidez. Pena, pois são os indivíduos propensos ao risco os que realmente fazem história. Formações universitárias, portanto, acabam sendo desprezadas em favor de diplomas universitários. Acaba sendo mais atrativo decorar (ou colar) para passar nas matérias, conseguir um título e logo seguir decorar (ou colar!) para passar em um concurso público. São poucos (e são heróis!) os que estão dispostos a queimar as pestanas estudando e virando noites para aprender de verdade, para desenvolver habilidades e para poder, um dia, competir com essas habilidades no mercado. A triste realidade é que as pessoas não querem aprender, o que querem é passar em concursos. Não querem ser agentes no mercado, não estão interessadas em dinamizar as atividades econômicas (a única maneira, por sinal, de gerar crescimento sustentável!). O que as pessoas querem é engrossar as fileiras do funcionalismo público. Com isso, o Estado incha cada vez mais e, quanto mais inchado fica, mais funcionários públicos requer, mais concursos públicos são abertos e o ciclo se repete, caracterizando a retroalimentação da burocracia e do paternalismo estatal. Sim, a educação é um dos maiores problemas no Brasil e é uma das principais causas do baixo crescimento do país em comparação com outras economias emergentes. Só que não adianta aumentar os investimentos em educação se o que falta, na realidade, é vontade de aprender. O que é necessário fazer é mudar a mentalidade que louva o parasitismo social patrocinado pelo Estado e criar as condições para que as atividades econômicas possam se desenvolver e gerar riqueza para toda a sociedade.
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