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Opinião
18/11/2006 - 18h54
Para que servem as datas
Luiz Weis - Observatório da Imprensa
 

Num dos seus mais amargos poemas, Fernando Pessoa diz a um imaginário suicida em potencial - ele próprio, decerto - que "serás lembrado aniversariamente / no dia em que nasceste / e no dia em que morreste".

Para isso também é que existem o que nos velhos tempos se chamava efemérides e hoje, simplesmente, datas - que podem, ou não, ser aniversários, e de qualquer forma acionam as engrenagens que põem a mídia em movimento e abrem espaço, embora muitas vezes fugaz, na cultura de massa. É pouco, mas melhor que nada. Será muito, se a ocasião não for desperdiçada.

Hoje, antevéspera do Dia da Consciência Negra, a imprensa traz um estudo desalentador do IBGE, do qual naturalmente teve conhecimento antecipado, com novas evidências sobre o mito da igualdade racial no Brasil.

Pesquisando o seu território por excelência, as seis maiores regiões metropolitanas do país, o instituto identificou o cúmulo da perversão: quanto mais estudam, mais pretos e pardos ficam longe dos brancos em matéria de remuneração.

Um branco praticamente analfabeto (com até 1 ano de escola) recebe aproximadamente R$ 60, em média, acima do que um preto na mesma situação. Quando os dois têm 11 anos ou mais de estudo, a diferença média é de quase R$ 830. Ou seja, cerca de 15% no primeiro caso e de 92% no segundo!

Estudar obviamente compensa - mais para uns do que para outros. A minoria de pretos e pardos no topo da pirâmide educacional ganha 120% além do que a maioria com pouco ou nenhum ensino. Enquanto isso, o ganho do branco "doutor" em relação ao branco semi-letrado é de 268%.

"Você começa a sentir o preconceito quando começa a ascender", resume na Folha um brasileiro que o jornal classifica de "caso raro" - o negro Edison Souza Dias, 57 anos, diretor de banco, "cargo a que chegou após fazer curso superior e entrar no setor como auxiliar de RH".

O Estado também tem o seu Souza, no caso Carlos Sousa, empresário bem sucedido de Salvador. (O da Folha trabalha no HSBC, em São Paulo.) "Tive a sorte", conta ele, "de ter como primeiro empregador um estrangeiro, para quem era mais importante a competência do que a cor da pele".

Fez bem o jornal em garimpar a sua exceção na Bahia, pois "apesar de ser formada predominantemente por negros (82,1%)", destaca a reportagem, "a população de Salvador e a região metropolitana apresentada um dos retratos mais acentuados da desigualdade racial no País. O rendimento mensal de um negro é de R$ 644,91, ante R$ 1.749 de um branco".

Mas Folha, de longe, foi que melhor soube aproveitar o tempo entre a obtenção dos dados do IBGE e a publicação. O assunto não só é a manchete de hoje do jornal (na primeira página, Estado e Globo se limitaram a pequenas chamadas), como se espalha por 4 páginas internas (contra duas do Globo e uma do Estado).

A Folha também informou melhor, em manchete interna, que "negros são metade dos desempregados".

Nesse departamento, porém, a nenhum jornal ocorreu ligar os pontos. Domingo passado, o Globo publicou com exclusividade uma pesquisa acachapante do economista Carlos Alberto Ramos, da Universidade de Brasília (UnB).

Trabalhando com outros dados do IBGE, ele verificou que entre os 10% mais pobres da população economicamente ativa, o desemprego é 17 vezes maior do que entre os 10% mais ricos com o mesmo grau de instrução.

Hoje, pelo menos o Globo poderia voltar a essa pesquisa. Pela razão elementar de que pretos e pardos são a maioria absoluta da parcela mais pobre da sociedade.

Faltou também trazer às páginas, contra o pano de fundo da numeralha levantada pelo IBGE, a polêmica questão do Estatuto da Igualdade Racial e da adoção de cotas nas universidades federais e no serviço público.

Como é que fica essa discussão se "Educação não garante emprego", como mancheteou o Globo do último domingo, a propósito da pesquisa do economista da UnB, e se "Educação não reduz desigualdade racial", como mancheteia hoje a Folha?

Os números dão argumentos para defensores e adversários do estatuto e das cotas.

A favor: mais um motivo para arrombar a partir de uma legislação ousada o que a ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro, denomina o "racismo sutil" do país.

Contra: não será "racializando" as relações entre os brasileiros, mas por uma evolução cultural estimulada por ações afirmativas e incentivos econômicos, que a educação passará a proporcionar as oportunidades que dela se esperam - também para pobres e pretos.

Se os dados que aparecem hoje na imprensa de nada servirem para irrigar esse debate, a data - jornalisticamente falando - será, aí sim, um desperdício.

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