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Crônicas
03/12/2006 - 07h27
Terapias inusitadas
Moacyr Scliar - Agência Carta Maior
 

No último fim de semana, o psicólogo Edson Rodrigues foi preso em flagrante em Anápolis, Goiás, acusado de jogar gasolina e atear fogo na paciente Edimar Francisca de Oliveira, internada em clínica psiquiátrica. Rodrigues alegou que o "procedimento" era parte de uma "terapia de enfrentamento". Edimar, que fazia tratamento contra ansiedade e depressão, sofreu queimaduras de terceiro grau nas costas. Testemunhas disseram que não era a primeira vez que o psicólogo agia de forma pouco convencional: ele puxava os cabelos de pacientes, sacudia-as brutalmente, trancafiava-as, sempre com a idéia do "enfrentamento". Aliás, o conceito existe em psicoterapia. Mas é um enfrentamento simbólico. Não exige extintores de incêndio ou a presença do Corpo de Bombeiros. Aí já estamos entrando no terreno do terrorismo.

Em matéria de doença mental, durante muito tempo terapias estranhas foram a regra. E isto por duas razões. Em primeiro lugar, tratam-se de enfermidades cujas causas não são claras - permitem, pois, tentativas de tratamento que, em circunstâncias normais seriam, elas próprias, consideradas maluquice. Em segundo lugar, é uma situação em que, por definição, a pessoa está privada da racionalidade. É como aquela situação do Catch-22, que dá título ao satírico romance de Joseph Heller sobre a II Guerra. As missões aéreas eram então extremamente perigosas que só um louco as enfrentaria. O piloto que quisesse ser dispensado poderia procurar o psiquiatra e declarar-se maluco - mas, ao fazê-lo, tornava-se o candidato ideal para a missão. Não tinha como escapar, assim como os pacientes não tinham como fugir aos tratamentos, tão estranhos quanto eles. Na Idade Média, o doente era agarrado à força, e o médico fingia abrir-lhe o crânio com uma faca. A seguir, mostrava ao enfermo uma pedra, dizendo que ela havia sido extraída dos miolos e que era a causa da perturbação. A expressão "louco de pedra" vem daí.

Mas este procedimento ainda era relativamente benigno. Quando a doença mental era considerada resultado de possessão demoníaca, e freqüentemente o era, o doente podia ser espancado e torturado, numa tentativa para expulsar os maus espíritos. Ah, sim, e havia o hospício, um lugar sombrio onde as pessoas eram acorrentadas e maltratadas. O médico Philippe Pinel ficou famoso quando, durante a Revolução Francesa, libertou os loucos de suas algemas (mas o hospício continuou existindo).

Certas situações eram rotuladas como doença mental ou como geradoras de loucura: a masturbação, por exemplo. Muitos tratamentos foram criados para isso. Começavam pela dieta, que tinha de ser leve, conforme preconizavam o doutor John Harvey Kellogg (que inventou os sucrilhos Kellogg) e o reverendo Sylvester Graham (que lançou os Graham Crackers). Também se recorria à imobilização das crianças, a aparelhos que davam choques elétricos quando o pênis era manipulado e até a retirada dos genitais.

Felizmente, a ciência progride. Freud mostrou que muitas doenças mentais resultam de conflitos, passíveis de ser entendidos e elaborados. Em meados do século 20, ocorreu aquilo que depois viria a ser conhecido como a revolução psiquiátrica: novos medicamentos facilitaram o tratamento da doença mental, inclusive em ambulatório.

Mas as pessoas continuam precisando de ajuda. Para evitar situações incendiárias como aquela do noticiário, é bom procurar profissionais que tenham reputação conhecida, que estejam ligados a instituições sérias e que, sobretudo, não anunciem curas miraculosas ou exóticas. O sofrimento psicológico não dispensa o bom senso, ao contrário, exige-o. A alternativa pode ser fogo, e não apenas no sentido figurado.

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