O crime no Rio de Janeiro atingiu as raias do intolerável, o que nos remete a uma oportuna declaração do Primeiro-Ministro britânico Tony Blair, a de que “uma sociedade decente não se baseia em direitos, mas em deveres”. Precisamos entender de uma vez que o legal nem sempre é justo e que não há justificativa moral para proteger com tarjas bandidos covardes, apenas porque ainda não completaram 18 anos. E respeitar a máxima irretorquível de que, se a lei é para ser cumprida, não podemos esquecer que, para tal, precisa ser justa. Afinal, são as regras de conduta que existem para os homens corretos ou são estes que existem para elas? A foto sem tarja do menor que assassinou, covarde e friamente, uma empresária no Leblon - que o JB, corajosamente, estampou na primeira página da edição do dia 26 passado, um domingo -, fez chover na redação muitas cartas de leitores, a maioria apoiando a atitude. Mas sempre há os que, embora aparentemente bem intencionados – um atributo necessário, mas não suficiente para livrá-los um dia do inferno – teimam em defender “di menores” useiros e vezeiros em furtar, roubar, assaltar e assassinar cidadãos de bem. Têm obviamente razão quando alegam que nosso sistema prisional, em particular no que diz respeito à recuperação de infratores contumazes, é uma vergonha e uma indecência. A solução do atual descalabro em termos de criminalidade, certamente, passa por pesados investimentos nesse sistema, que deseduca, abrutalha e exacerba vícios, ao invés de educar, recuperar e ensinar virtudes. Mas transita também – e negar isto é demagogia ou pura ignorância – pela reforma do atual Estatuto do Menor, um instrumento, como tantos outros, bem intencionado, mas que só tem contribuído para elevar ao estado de calamidade pública a incidência do crime, já que o torna compensável, em nossa cidade tão querida e tão maltratada. Quantas pessoas de bem – ricas ou pobres - ainda precisarão ser roubadas, assaltadas, estupradas, seqüestradas e assassinadas para que o calamitoso quadro presente comece a ser revertido? Quando os políticos entenderão que é necessário investir na ampliação e modernização do sistema prisional? Quando os defensores de pretensos direitos humanos (de criminosos) – de resto, um pleonasmo e artimanha politicamente correta – compreenderão que os humanos direitos estão cada vez mais se engaiolando em suas próprias casas, evitando sair delas, gastando com medicamentos, psicólogos e psiquiatras por conta do estado de estresse permanente em que vivem e com seu “direito de ir e vir” conspurcado? Quando a União, o governo estadual e o município deixarão de desperdiçar a receita dos tributos que exaurem o contribuinte carioca com dispêndios supérfluos ou, no mínimo, questionáveis e passarão a gastar em presídios e na efetiva recuperação de delinqüentes? Quando empresas públicas, como a endeusada Petrobras - em demonstração de autêntica responsabilidade social –, redirecionarão os vultosos recursos que atualmente despendem com ONGs ligadas a interesses políticos para a recuperação do sistema prisional? E, enfim, quando a lei vai ser mudada, deixando de proteger marginais e passando a resguardar os direitos de quem estuda, trabalha e respeita o próximo, seja pobre, rico, negro ou branco? O economista português José Manuel Moreira, professor da Universidade de Aveiro, em conferência proferida há poucos dias no Rio, abordando o importante e pouco compreendido tema da responsabilidade social, pronunciou uma frase lapidar, que devemos sempre ter em mente: “Uma sociedade de ovelhas costuma dar lugar a um Estado de lobos”. Corroboro o meu colega, aduzindo que, enquanto cruzarmos os nossos braços, em se tratando de nossa práxis política, só aparecerão os lobos maus... A reação terá que brotar de baixo para cima, dos cidadãos e dos agentes intermediários entre indivíduos e Estado, para forçar as soluções inadiáveis. Precisamos deixar de nos comportar como ovelhas, para que possamos voltar a viver com tranqüilidade! Nota do Editor: Ubiratan Iorio é Doutor em Economia pela EPGE/FGV. É Diretor da Faculdade de Ciências Econômicas da UERJ e Vice-Presidente do Centro Interdisciplinar de Ética e Economia Personalista (CIEEP), Professor Adjunto do Departamento de Análise Econômica da FCE/UERJ, do Mestrado do IBMEC, Fundação Getulio Vargas e da PUC/RJ. É escritor com dezenas de artigos publicados em jornais e revistas.
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