O igualitarismo talvez seja a principal arma retórica da esquerda. De acordo com a máxima progressista, é preciso extirpar todas as desigualdades do mundo se quisermos alcançar o ideal platônico de "justiça social". Para os igualitários, as qualidades e características dos indivíduos seriam o resultado arbitrário e opressivo de alguma espécie de loteria biológica. Uma herança maldita da qual nenhum homem seria merecedor. Até mesmo o simples fato de alguém ser mais inteligente ou belo é um insulto ao próximo. Esta acepção de igualdade, nunca é demais destacar, não guarda qualquer semelhança ou vínculo, com o ideal de igualdade de todos perante a lei, defendido por liberais e democratas. O chamado igualitarismo pretende nivelar os atributos pessoais e as virtudes, independentemente das escolhas individuais, do caráter e do trabalho. Como qualquer ideologia utópica, ela não se impressiona com evidências científicas ou sociológicas. Fatos e realidade são desprezados de forma peremptória em prol da causa. Os igualitários não enxergam, ou fazem vista grossa, para verdades óbvias e insofismáveis, como a de que duas pessoas reagem de forma distinta diante das mesmas circunstâncias. Não admitem que cada ação, reação ou escolha humana está atrelada a uma vasta combinação de elementos determinantes como idade, educação, hormônios, aptidão intelectual, talentos, gostos, fisiologia, prioridades, ambições, além de uma infinidade de outros fatores, genéticos ou vinculados ao meio social. Por que o Ronaldinho Gaúcho é o craque que todos conhecemos? Simplesmente porque, dentro das quatro linhas, sujeito às mesmas regras que os demais jogadores, ele consegue achar soluções, antever jogadas, executar dribles, fugir da marcação etc., melhor do que todos os outros. Nele se concentra uma miríade de talentos que o transforma no atleta único e excepcional que é. Há alguma injustiça nisso? Deveríamos, por acaso, obrigá-lo a entrar em campo com uma das pernas engessada para que se igualasse aos infelizes pernas-de-pau? Ou será que deveríamos estabelecer que o seu salário fosse exatamente igual ao de todo mundo e não de acordo com a sua capacidade e produtividade? No futebol, assim como na vida, ninguém gosta de "juiz ladrão", certo? Errado. A turma do igualitarismo adora manipular os resultados, mexer nas regras do jogo. Eles sabem que não se pode esperar resultados equivalentes quando os indivíduos estão sujeitos às mesmas regras e normas de conduta e que, portanto, a única maneira de atingir o sonho socialista é por intermédio do tratamento desigual. Estão perfeitamente cientes de que quando prevalece a verdadeira justiça - igualdade de todos perante a lei -, não há espaço para se pensar em igualdade de resultados. Aniquilar as desigualdades é como matar a galinha dos ovos de ouro da raça humana. Vamos supor que, numa escola qualquer, em nome da igualdade e da justiça social, os professores decidissem que todos os alunos teriam as mesmas notas. Como não podiam simplesmente extinguir os exames periódicos, sob pena de causar o completo desinteresse dos estudantes, só havia dois caminhos possíveis: ou preparariam uma prova para cada aluno, dependendo do nível individual de inteligência, esforço, aptidão etc., ou teriam que tirar os pontos de uns para dar a outros, a fim de equalizar os resultados pela média. Não é difícil concluir que a repetição sistemática do tratamento desigual e injusto, qualquer que fosse a opção escolhida, acarretaria, progressiva e inevitavelmente, a preguiça, a apatia e o descaso dos mais talentosos e inteligentes, com a conseqüente queda de todas as notas. Tal qual no futebol ou no desempenho escolar, os resultados do trabalho individual, mantidas as mesmas regras para todos, serão sempre desiguais. Assim, para lograr a igualdade de renda e riquezas, é preciso tratar os indivíduos de forma desigual, tirando dos mais capazes, eficientes e laboriosos para distribuir entre os menos exitosos, menos profícuos ou mais preguiçosos. É evidente que, com o passar do tempo, os mais produtivos cairão no marasmo e o bolo a ser dividido será sempre menor, até que se chegue à perfeição cubana de penúria quase absoluta, porém igualitária. Estatísticas recentes têm demonstrado que até mesmo o incensado modelo de bem-estar social sueco, que mistura alguma liberdade econômica com impostos progressivos altíssimos e um sistema re-distributivo suave (não escancarado), a longo prazo não resistiu ao infalível encolhimento do bolo. Em 1960, por exemplo, a renda per capta na Suécia era 6% superior à canadense. Em 1995, ela já era 6% menor (*). É fato que a lógica não costuma acompanhar as teses socialistas. Quiçá num universo paralelo pudessem fazer algum sentido, mas neste em que vivemos não passam de sonhos infantis cujos efeitos, quando transportados para o mundo real, são totalmente ineficazes, além de perversos. É impossível não perceber que não se pode redistribuir beleza, músculos, inteligência, aptidão, talento, perseverança, simpatia pessoal ou quaisquer dos infindáveis atributos que transformam cada ser humano num espécime único. Daí se conclui que o pensamento igualitário carrega certo grau de demência que deveria ser tratada como doença psiquiátrica e não como assunto sério. Para aqueles que nunca leram, eu sugiro um magnífico trecho do romance Atlas Shrugged, em que Ayn Rand conta, com riqueza de detalhes, como uma fábrica extremamente produtiva é destruída pela implantação de um modelo de distribuição de rendas calcado no velho chavão marxista de "cada um, conforme sua capacidade, para cada um, conforme sua necessidade". O texto está disponível, em português, no site: www.aynrand.com.br. (*) Herbert G. Grubel, Economic Freedom & Human Welfare - Some empirical Fidings. Nota do Editor: João Luiz Mauad é empresário e formado em administração de empresas pela FGV/RJ.
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