Sou caiçara de São Sebastião, Litoral Norte de São Paulo, herdeira de terras que foram dos meus avós paternos, descendentes dos fundadores deste Município. Essas terras, da praia até as vertentes, foram motivo de orgulho e depois de algum tempo passaram a ser motivo de preocupação: como lançar impostos, manter ou desmembrar tudo isso? Diante das dificuldades muitos foram desistindo, mas eu resisto: vendi uma parte, construí a estrada de acesso, levei água da cachoeira, luz e telefone. Já existe nesse lugar uma edícula aprovada em nome do meu filho. Há alguns anos uma família tentou invadir o local, fui lá de ônibus, para avisar que a terra tinha dono. Em 2004, uma pessoa que comprou a parte de um dos herdeiros, passou o imposto da minha parte para o nome dele na Prefeitura. Precisei recorrer para "lembrar" ao pessoal do Cadastro que a minha parte não está à venda há mais de 200 anos. Quero deixar esta história registrada, por que acho importante que outras pessoas conheçam este caso, que não é original, é somente mais uma das histórias de luta por um patrimônio invisível. Minha terra não é só um terreno, é parte da história da minha família e dos meus descendentes. Há um registro em minha memória daquela paisagem exuberante que me renova, me fortalece, e se Deus quiser, vai me acompanhar enquanto eu viver, não sou dona daquela terra, ela que é minha dona.
Nota do Editor: Maria Angélica de Moura Miranda é jornalista, foi Diretora do Jornal "O CANAL" de 1986 à 1996, quando também fazia reportagens para jornais do Vale do Paraíba. Escritora e pesquisadora de literatura do Litoral Norte, realiza desde 1993 o "Encontro Regional de Autores".
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