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SEÇÃO
Crônicas
14/12/2006 - 16h07
Sem classe
Chico Guil - Agência Carta Maior
 

"Nasci assim, sem classe,
sem tique, sem passe,
para o seu etiquetado coração.
"

Dias atrás fui cobrar uma conta do Euclides, meu antigo professor de matemática. Há meses ele vem me enrolando. Agora se saiu com esta:

- Você sabe, Chico, a minha família, como a tua, você sabe, somos da classe média baixa e...

Passou então a uma lengalenga sobre cheques voltando, salário em atraso, a saúde da sogra, o batizado da neta. Escutei uns trechos recortados, enquanto repicava nas bordas ovais do meu crânio... classe média, classe média baixa! Será que o Euclides realmente acredita nisso, ele, um sujeito tão inteligente!?

Talvez eu pareça arrogante, mas não me venha com essa de classe, Euclides. Se quiserem, botem o meu número na lista, minha fotografia na lápide, enterrem meu corpo na vala comum, façam o que quiserem lá entre vocês com meus despojos. Mas não me venham dizer que sou da classe... que história é essa de classe?

Classe é uma coisa criminosa de se falar e ainda mais acreditar nela. Tem os podres de ricos, os meio ricos, os pobres e os miseráveis. Mas como entrou na cabeça dessas pessoas uma tal fé em classes? Classes não se comunicam, são estanques, limitadas por cifras, ou pela falta delas. Classes não caminham, apenas se dispersam. Não somam, apenas amontoam. Não dividem, apenas estilhaçam.

Vejo olhos de antigos correligionários me espiando nas esquinas, enquanto converso sem culpas com o dono do carro chique conversível sobre a última conquista do vôlei brasileiro. Olhos ainda mais aflitos estão os da dona do cartório quando me flagra sentado ali na frente da banca de sorvete tomando cerveja com carregadores braçais. Talvez acredita que eu deveria ser um sujeito requintado, já que sou das letras e amigo da família. Mas estou de chinelas e camisa amassada, preocupado menos com a elegância das lhamas que trançam pernas pela avenida feito Giseles Bünchens, mais extasiado com a elegante retirada do sol entre galhos de canafístula da praça.

Classe é para os nobres, que precisam de corpos caídos para sustentá-los na montanha. Classe é dos que se entregaram ao vício do lamento, dos que se renderam ao instituto do homem burocrático, dos que aceitaram a humanidade como segmento isolado de um todo dinâmico que se remonta a cada década.

Abaixe a cabeça para a passagem da nobreza. Morra todos os dias no vazio do seu saldo bancário. Acredite na mesquinhez dos papéis que te põem definido, pronto e isolado feito um boneco de vitrine. Acredite no jogo e no veredicto que te faz medíocre e derrotado pelas regras sagradas de homens infalíveis. Amontoe-se na classe dos mortos enquanto a caravana passa, abaixe a cabeça e ela estará para sempre decepada.

Não, Euclides, não sou da classe, nem alfa, nem beta, nem gama. Sou completamente sem classe, e se vier um janota de nariz empinado para o meu lado, leva uma bicuda.

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