11/09/2025  22h01
· Guia 2025     · O Guaruçá     · Cartões-postais     · Webmail     · Ubatuba            · · ·
O Guaruçá - Informação e Cultura
O GUARUÇÁ Índice d'O Guaruçá Colunistas SEÇÕES SERVIÇOS Biorritmo Busca n'O Guaruçá Expediente Home d'O Guaruçá
Acesso ao Sistema
Login
Senha

« Cadastro Gratuito »
SEÇÃO
Opinião
21/02/2007 - 19h00
Assim falou Zaratustra
Rodrigo Constantino - Parlata
 

Considero que minha "cruzada" contra o fanatismo religioso foi útil, pois despertou intensos debates sobre o tema, o que sempre leva a uma saudável reflexão. Não dos fanáticos em si, claro, mas o alvo não era este, já que, como disse Thomas Paine, "argumentar com uma pessoa que tenha renunciado ao uso da razão é como dar remédio para os mortos". Espero que tenha ficado claro que luto contra o fanatismo, não contra qualquer pessoa religiosa em si. E pela reação de muitos, notei como ainda existem fanáticos, pessoas que realmente acreditam que antes da Bíblia nada de bom existia ou que são incapazes de questionar seus dogmas e criticar sua religião. A ciência parte de axiomas, que são verdades evidentes por si próprias, como a existência, por exemplo. Enquanto isso, as religiões partem de dogmas, que são "verdades" impostas que devem ser aceitas indiscutivelmente. Como considero as discussões calcadas nos argumentos fundamentais para a evolução humana, fica claro qual postura acho mais adequada.

Este artigo, com o qual pretendo finalizar esta luta inglória contra o fanatismo, será baseado num filósofo ainda mais virulento que Voltaire nas críticas religiosas. Não necessariamente endosso todas elas, mas as considero úteis para estimular uma reflexão. Antes disso, porém, cabe desfazer um mal entendido que possa ter ficado sobre o artigo que deu origem a esta empreitada, justamente sobre o livro de Voltaire. Alguns interpretaram a seguinte passagem como anti-semitismo do autor e, por conseguinte, meu: "Como eles [judeus] mesmos reconhecem, são um povo de ladrões que carregam para um deserto tudo o que roubaram dos egípcios". Esta frase foi tirada de um contexto o qual Voltaire está claramente condenando as fábulas judaicas, alegando que quem nelas acredita literalmente, e aplaude, está enaltecendo um povo ladrão. Tanto que logo em seguida ele compara isso com as fábulas dos gregos, considerando-as mais suaves. Quem me conhece sabe que eu jamais seria um anti-semita. Em primeiro lugar, tratar todos os judeus como um grupo monolítico é típico de coletivistas, e sou um individualista. Em segundo lugar, tenho inúmeros artigos defendendo a posição de Israel na questão da Palestina, ou expondo o critério injusto de julgamento contra os judeus, especialmente na mídia. O rótulo de anti-semita simplesmente não cola em mim. Mas vamos a Zaratustra de Nietzsche!

Os ataques de Nietzsche às religiões em geral e ao Cristianismo em particular são bastante ácidos. Nietzsche começa afirmando que todos os deuses não passam de criações humanas: "Ah, meus irmãos, esse Deus, que eu criava, era obra humana e humana loucura, como todos os deuses!". Entre os motivos para tal criação, ele diz: "Enfermos e moribundos, eram os que desprezaram o corpo e a terra e inventaram o céu e as gotas de sangue redentoras". Para o filósofo, o desejo de morrer é que faz voltarem as costas à vida, e desprezarem o próprio corpo. "Há uma inconsciente inveja no vesgo olhar do vosso desprezo", afirma Zaratustra. Para esses pregadores da morte, o recado não poderia ser mais duro: "Tratai, portanto, de que cesse essa vida que é somente sofrimento!".

Sobre o conceito do bem e do mal, Nietzsche diz: "Em verdade, foram os homens a dar a si mesmos o seu bem e o seu mal. Em verdade, não o tomaram, não o acharam, não lhes caiu do céu em forma de voz. Valores às coisas conferiu o homem, primeiro, para conservar-se". E em relação ao amor ao próximo: "O vosso amor ao próximo é o vosso mau amor por vós mesmos. Fugis para junto do próximo a fim de fugir de vós mesmos e desejaríeis fazer disto uma virtude; mas eu vejo claro em vosso ’altruísmo’. Não vos suportais a vós mesmos e não vos amais bastante: então, quereis induzir o próximo a amar-vos, para vos dourardes com seu erro. O vosso mau amor por vós mesmos transforma, para vós, a solidão em cárcere".

Mais à frente, Nietzsche questiona: "Podeis pensar em Deus? Mas é isto que significa o vosso desejo de verdade: que tudo se transforme no que pode ser humanamente pensado, humanamente visto, humanamente sentido! Deveis pensar, até o fim, os vossos próprios sentidos! Deus é um pensamento que torna torto tudo que é reto e faz girar tudo que está parado".

Sobre o pecado original, Zaratustra diz: "Desde que os homens existem, sempre o homem se alegrou pouco demais; é somente este, meus irmãos, o nosso pecado original! E, se aprendermos a alegrar-nos melhor, será este o melhor modo de desaprendermos a fazer sofrer os outros e a inventar novos sofrimentos".

Nietzsche não poupa os templos religiosos: "Oh, olhai essas choupanas que esses sacerdotes construíram para si! Igrejas, chamam eles a tais antros de cheiro adocicado. Oh, nessa falsa luz, esse ar abafado! Aqui, onde a alma, para elevar-se à sua eminência, não tem o direito de voar! Senão que, ao contrário, assim manda a sua fé: Subi a escada de joelhos, pecadores! E não souberam amar o seu Deus de outro modo, senão crucificando o homem!".

Do conceito de virtude: "Quanto mais se afundam, tanto mais ardentes lhes brilham os olhos e o anseio pelo seu Deus. Também, o grito desses, ai de nós, já abriu caminho até vossos ouvidos, ó virtuosos: ’O que eu não sou, isso, isso é, para mim, Deus e virtude!’ Com sua virtude, querem arrancar os olhos dos inimigos; e se elevam somente para abaixar outrem. Cansados de dizer: ’O que faz uma ação ser boa é ser desinteressada.’ Ah, meus amigos! Que o vosso ser próprio esteja na ação, tal como a mãe está no filho: seja esta a vossa palavra a respeito da virtude!".

Sobre as rezas: "Rezar é uma vergonha. Não para todos, mas para mim e para ti e para quem tenha a consciência também na cabeça. Para ti, rezar é uma vergonha! E bem o sabes. É o teu demônio covarde dentro de ti que gostaria de ficar de mãos cruzadas sobre o ventre e levar vida mais cômoda. É esse covarde demônio que te inculca: ’Existe um Deus!’ Com isto, porém, pertences à espécie de homens que temem a luz e que a luz nunca deixa tranqüilos; todos os dias, agora, deverás meter a cabeça mais fundamente na noite e na névoa!".

Não concordo com todos os pensamentos de Nietzsche, mas reconheço muitas verdades duras em seu discurso. Sei que muitos irão automaticamente acusá-lo de ter ficado louco, ignorando sua doença física. Sei também que alguns vão tentar desqualificá-lo por uma injusta associação ao nazismo, mais por culpa de sua irmã que por suas próprias idéias, já que seria estranho associar ao nazismo quem afirmou que "chama-se Estado o mais frio de todos os monstros frios". Mas nada disso importa. Um bom argumento independe de quem o fornece. É mais importante as pessoas focarem em o que é dito do que em quem disse. E o fato é que as palavras de Nietzsche não deixam de suscitar uma boa reflexão sobre os deuses que os homens parecem ter criado para suportar suas próprias fraquezas. Ou então sobre um foco mais egoísta na própria felicidade, em vez de viver enaltecendo o sofrimento próprio em prol de terceiros ou de outra vida qualquer. Afinal, "é a minha felicidade que deveria justificar a existência". Assim falou Zaratustra.


Nota do Editor: Rodrigo Constantino é economista formado pela PUC-RJ, com MBA de Finanças no IBMEC, trabalha no mercado financeiro desde 1997, como analista de empresas e depois administrador de portfólio. Autor de dois livros: Prisioneiros da Liberdade, e Estrela Cadente: As Contradições e Trapalhadas do PT, pela editora Soler. Está lançando o terceiro livro sobre as idéias de Ayn Rand, pela Documenta Histórica Editora. Membro fundador do Instituto Millenium. Articulista nos sites Diego Casagrande e Ratio pro Libertas, assim como para os Institutos Millenium e Liberal. Escreve para a Revista Voto-RS também. Possui um blog para a divulgação de seus artigos.

PUBLICIDADE
ÚLTIMAS PUBLICAÇÕES SOBRE "OPINIÃO"Índice das publicações sobre "OPINIÃO"
31/12/2022 - 07h25 Pacificação nacional, o objetivo maior
30/12/2022 - 05h39 A destruição das nações
29/12/2022 - 06h35 A salvação pela mão grande do Estado?
28/12/2022 - 06h41 A guinada na privatização do Porto de Santos
27/12/2022 - 07h38 Tecnologia e o sequestro do livre arbítrio humano
26/12/2022 - 07h46 Tudo passa, mas a Nação continua, sempre...
· FALE CONOSCO · ANUNCIE AQUI · TERMOS DE USO ·
Copyright © 1998-2025, UbaWeb. Direitos Reservados.