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Crônicas
21/02/2007 - 11h07
Um rei do carnaval
Adilson Luiz Gonçalves
 

O Carnaval sempre foi uma festa tipicamente de rua, eminentemente popular! As ruas de Nice, Veneza e Nova Orleans são testemunhas desse "reinado" que extingue, temporariamente, os protocolos sociais e, com isso, aproxima as pessoas. Foi no Brasil, no entanto, que Momo estabeleceu seu trono. Fosse em corsos, bandas, cordões ou qualquer outra manifestação, com ou sem máscaras, era nas ruas que ele encontrava sua maior expressão, em músicas e danças. Era comum ver janelas se abrirem, para saudar foliões; e não era raro vê-las, logo em seguida, serem fechadas, para que os moradores também se juntassem à brincadeira. As fantasias iam da perfeição, que fazia sonhar, ao grotesco, que fazia rir. A festa de Momo, apesar de sua origem profana, era cheia de inocência e congraçamento... Arte popular sem compromisso, maliciosa, às vezes, mas, sempre, contagiante.

O tempo se encarregou de desvirtuá-la, tirar-lhe a pureza nativa e brejeira... A violência urbana a tirou de muitas ruas. O turismo "para inglês ver" a confinou em sambódromos! Mesmo os bailes de salão deixaram de ser locais de encontro de famílias e flertes discretos e ingênuos, para se transformarem em palco de licenciosidade, sensualidade vulgar, enfim, num ringue de "vale-tudo". Para piorar, as fantasias que eram queimadas na Quarta-Feira de Cinzas, extrapolaram o reinado de Momo. Hoje, as "tribos" incorporaram suas fantasias grotescas ao cotidiano: trogloditas, andróginos, zumbis... O ridículo virou moda, tomou as ruas e se leva a sério... Por quê nosso Carnaval se perdeu?

Parece que só o Norte e o Nordeste mantiveram e, até, expandiram essa tradição de cantar e dançar nas ruas. As escolas de samba, não sei por quê, não fazem mais sambas memoráveis, só coisas híbridas, descartáveis ou recicláveis. A espontaneidade deu lugar à frieza da linha de montagem! A inspiração deu lugar ao "merchandising"... Mas mesmo nesse horizonte de desencanto ainda era possível encontrar uma pérola:

Eu não ia aos bailes de salão, pois a grana era curta; mas curtia ir aos bailes de rua, com o encargo adicional de tutelar minhas irmãs, então, adolescentes. Gostava, ali, de observar as pessoas: havia casais, grupos... Mas, também havia os solitários. Solitários, mas inexplicavelmente felizes! Um deles foi especialmente marcante. Desde a primeira vez que o vimos, ele chamou nossa atenção: usava todos os dias calça branca, mas alternava o colete e o chapéu "palheta", ora prateados, ora dourados. Mestiço, seu rosto era redondo, tinha bigode e cavanhaque finos, jeito nordestino... Ele não cantava, apenas acompanhava o ritmo das músicas: marchinhas, frevos e sambas-enredo; e o fazia andando, como se estivesse numa "marcha atlética" a pairar por aquele imenso "salão". Às vezes, surgia com uma latinha de cerveja; de tempos em tempos rodopiava qual um monge sufi. Não incomodava ninguém! Pelo contrário, sua expressão - olhos semi-cerrados e sorriso aberto - expressava a mais sincera nobreza, alegria e paz de espírito! Sua passagem contagiava as pessoas, que o saudavam e sorriam para ele. Ele era um legítimo "rei" do Carnaval! Um rei solitário... Um rei sem rainha (talvez ela estivesse longe, e ele fechasse os olhos para vê-la)... Um Pierrô sem Colombina, mas com a alma transbordante de confete e serpentina!

Ele ficou como um símbolo derradeiro de um Carnaval que se perdeu no tempo, de canções que não se canta mais, de tradições que mereciam serem mantidas, mas que o "mercado" descartou... Mas isso não é o fim, pois já na década de 1960, Vinícius e Carlinhos Lyra lamentavam: "Acabou nosso Carnaval! Ninguém houve cantar canções...", para, depois, exortarem: "E, no entanto, é preciso cantar! Mais que nunca é preciso cantar! É preciso cantar e alegrar a cidade!".

Cantemos e dancemos, pois! Quem sabe a alegria volte às ruas e delas nunca mais se ausente. Quem sabe o reinado do povo: a democracia; finalmente, se consume em todos os dias do ano!


Nota do Editor: Adilson Luiz Gonçalves é escritor, engenheiro e professor universitário (UniSantos e Unisanta) cursando Mestrado em Educação (UniSantos). Autor do livro: "Sobre Almas e Pilhas".

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