Destino: Petrolina, Pernambuco. Quarteirões e quarteirões ocupados por feiras-livres que comercializam de verduras a animais vivos são uma tradição nordestina. Em Petrolina, uma das maiores cidades de Pernambuco e espécie de oásis na caatinga - onde o solo irrigado pelo grande rio São Francisco garante a agricultura - as feiras são coloridas por frutas de nomes e sabores exóticos e pessoas vendendo de tudo. Entre as frutas, nessa época do ano, há umbus e sirigüelas vendidos por litro, medido em latas de óleo vazias. Entre as pessoas e suas invencionices, o cearense Pedro Ceará chama a atenção com a sua garrafada. Uma beberagem, comum em muitos lugares do Nordeste. Trata-se da mistura de mais de 30 ervas maceradas em um pilão de madeira, com mel e cera de abelhas, promessa de cura para várias doenças. Pedro conheceu na estrada a companheira Cristiana. Com ela percorre cidades baianas, pernambucanas, maranhenses, alagoanas, produzindo a poção mágica em feiras-livres e nas ruas. Faz o produto ao vivo, escolhendo os ingredientes que lhe dão na telha em sua cozinha-laboratório, estendida entre o chão e o porta-malas de seu carro. São mais de 300 garrafas vendidas diariamente, a cinco reais cada uma, em vilarejos e até cidades grandes como as capitais. Onde as pessoas, cansadas da medicina tradicional, preferem apostar na cura da mistura de ervas de Ceará. Um ruivo de olhos verdes que se veste como caubói e exerce o ofício múltiplo de curandeiro, bruxo, psicólogo e vendedor. Pedro Ceará. "Aí o senhor toma um copinho de manhã, outro de tarde, outro de noite. Agora o senhor vê a ameba, ataca o coração, ataca o figo, ô meu querido, só faço garrafada boa! Se tomá, num prestá, te dou o dinheiro de volta. É uma mixaria, só cinco reais. Se o rapaz é jovem, joga bola e malha e é cheio de tesão pra dar, vai gostar. E o véio que é viúvo, há cinco anos não dá uma, agarra até véia de cem anos! Doença do rim, grastrite. Leva garrafada, irmão. Você que fica pensando se é boa, se é ruim, faz quatro anos que eu preparo a garrafada pra vocês. É de tirar inflamação. É pra puxar reumatismo pra fora. Tosse. Catarro. Impotência sexual. Asma. Rim. Cansaço. Gripe. Um copo de manhã, outro de tarde, outro de noite, mas tem que deixar macerar três dias a garrafa pra tirar a essência das plantas. Vai erva-doce, é bom pra diarréia. Pirita vermelha, pra tosse. Semente de girassol, pra azia. Vou colocar alfazema pra fazer funcionar o intestino e tirar gase. Noz-moscada, tabeba, sausaparrilha, louro, tudo erva catalogada. O líquido pra misturar é água, mel, cera de abelha. A véia diz, vamo pescá hoje e você diz, minha véia, a vara quebrou. Mas se não funcionar então venha, Ceará-cabra-da-peste-vou-te-lascar! Muito obrigado, Deus lhe dê saúde. Vou parar agora que eu tou cheio de preguiça. E muito obrigado". (Não comprei a garrafada. Mas a maioria das pessoas que assistiu ao espetáculo insólito de Pedro, disparando seu discurso em um microfone ligado na bateria do carro, não resistiu e levou a bebida milagrosa pra casa). Nota do Editor: Débora Menezes é jornalista e fotógrafa. Trabalhou por cinco anos e meio como repórter do Guia 4 Rodas, viajando pelo Brasil para colher informações sobre hotéis, restaurantes e atrações. Já rodou mais de 100 mil km, sozinha, pelo país - literalmente do Oiapoque ao Chuí. Edita o site de turismo www.missd.com.br e se mantém como free-lancer em turismo e gastronomia. Espera editar, em breve, um livro com suas crônicas de viagem.
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