Uma das imagens mais marcantes que eu trouxe dos meses que passei no Japão foi a da pontualidade absoluta do sistema de transportes. Eu disse pontualidade absoluta - I really mean it. Esqueça os britânicos. Um dia eu estava numa das estações de trem de Nagoya. Acompanhava amiga minha que ia tomar o trem para uma das cidades vizinhas. Não lembro o horário do trem dela, mas suponhamos que fosse 16:47 - não 16:45 ou 16:50, mas 16:47; eu lembro que era um número inviável para um brasileiro. Os relógios da estação eram aqueles cujo ponteiro dos minutos pula em vez de avançar lentamente. Pois bem. Assim que o ponteiro dos minutos pulou para o horário indicado na passagem, as portas se fecharam e o trem saiu da estação. Nos metrôs havia tabelas com todos os horários do dia. Você sabia que o último metrô passaria naquela estação às 23:57. Se você chegasse às 23:58, no máximo conseguiria dar tchau para o sujeito dormindo no último carro. E o metrô de Nagoya não chega a ser um metrô de Osaka ou de Tokyo. Quer mais? Nas estações de ônibus também havia tabelas de horários. Você dirá "Oras, no Brasil também tem". Só que no Japão eles funcionam - e com a mesma precisão dos trens e metrôs, a despeito das inconstâncias do trânsito, que na terra de Musashi consegue ser bem ruinzinho. Eu poderia tentar explicar essa pontualidade de diversas formas. A tecnologia pode explicar algo no caso dos trens e metrôs, mas não explica tudo, sobretudo no caso dos ônibus - estes não têm nada de especial além do conforto e do silêncio (do próprio ônibus e dos passageiros). O que pode explicar muita coisa é o profissionalismo. Cada pessoa tem consciência de seu papel e de sua responsabilidade dentro da máquina complexa que é o sistema de transportes de uma cidade como Nagoya (que naquela época tinha algo em torno de 2 milhões de habitantes). Assim fica fácil. Independentemente dos recursos e condições, cada profissional desempenha sua função tendo em vista o lugar que ocupa. "Sua tarefa é transportar passageiros com segurança, conforto e pontualidade". O sujeito vai lá e faz. Afinal, é um profissional. Pode ser um motorista de ônibus ou o engenheiro que projetou o trem-bala, são todos profissionais. * Recentemente chamamos um técnico para uma pequena manutenção aqui em casa. Telefonema. Data e horário agendados. O sujeito não apareceu. Não telefonou. Quatro dias depois ele aparece sem aviso prévio, com sua caixa de ferramentas enferrujada. Teve sorte de ter encontrado gente em casa. Teve sorte de ter sido recebido; eu estava de bom humor. Não pediu desculpas por não ter vindo no dia combinado. Não pediu desculpas por ter chegado sem avisar. Não foi o primeiro caso desse tipo e receio que não será o último. * O profissionalismo não explica tudo e não resolve tudo, mas é sempre um bom começo. Para Pindorama, seria um excelente começo.
Nota do Editor: Christian Rocha vive em Ilhabela, é arquiteto por formação, aikidoka por paixão e escritor por vocação. Seu "saite" é o Christian Rocha.
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