Um dos privilégios dos cronistas deste site é receber elogios e críticas de seus leitores. Elogio é bom, porque incentiva. Crítica é ótimo, porque dá raiva e afina o sangue. Num de meus últimos artigos alguns leitores me massacraram. Disseram que eu estava prestando um desserviço ao ensino da Nação ao afirmar que a maioria das regras gramaticais deveria ser abolida do currículo escolar. Um dos argumentos mais indiscutíveis apresentados foi o de que eu próprio, para escrever esses meus textos, fui bem instruído nas regras gramaticais. Compreendo e aceito, pois eu não soube apresentar com o rigor necessário a minha tese. Mas vamos adiante. Diga-me, leitor, por que um aluno deve saber se determinada frase possui um período composto por uma oração coordenada assindética e outra sindética conclusiva? Qual a importância de se saber que esta ou aquela frase contém uma oração subjuntiva objetiva direta ou indireta? Não seria mais construtivo realizar debates com os alunos para que eles contassem suas dores, seus sonhos, suas dúvidas? Se o professor souber incentivar os garotos a escreverem sobre isso, colherá frutos mais doces e consistentes que uns meros acertos na prova bimestral. O melhor da língua está nos livros dos grandes escritores, os maiores especialistas em transgredir as regras fabricadas pelos rudes gramáticos. No tocante ao uso da língua, os professores deveriam incentivar o olhar para essas deliciosas variantes, ao invés de promover a decoreba da tediosa e insossa regra. Qualquer cidadão medianamente inteligente percebe que a análise sintática não sai de dentro da escola. Isto é, não serve para nada na vida real. Talvez se possa afirmar que os costumeiros exercícios de português servem para aumentar a capacidade de raciocínio e de abstração dos alunos. Porém, convenhamos, tais artifícios não foram criados com tal fim. Foram criados ou descobertos pelos gramáticos com a mesma fanática e preciosa intenção de Leonardo da Vinci quando deu início à dissecação de cadáveres. Eles tiveram seu motivo, nobre motivo, o de conhecer em profundidade este organismo vivo impressionante, o idioma português. Não lhes tiro o mérito, pelo contrário, eu os louvo pela paciência e ousadia. Mas afirmar que todo aluno de 1º e 2º Grau deve conhecer as descobertas dos cientistas do idioma, é absurdo. Em meu artigo eu dizia que deveriam ser utilizados outros instrumentos menos ardidos para ensinar raciocínio e abstração aos alunos. Os acadêmicos (acredito que a maioria dos que criticaram o artigo eram acadêmicos) estão tão conformados com a dura e inflexível estrutura da academia que já não conseguem imaginar uma ruptura, o necessário racha neste sistema capaz de diplomar jornalistas que não sabem compor um parágrafo digno de leitura. Jornalistas que passaram anos estudando orações subordinadas subjetivas, mas que não sabem sequer o lugar da vírgula numa oração coordenada sindética adversativa! Estou falando de um necessário empenho para se produzir um outro tipo de conhecimento. Um dos leitores achou absurdo que eu tenha contestado o ensino de equações de 2º Grau. Alguém me diga, por favor, para que serve uma equação de 2º Grau na vida real! Ou mesmo para que serve todo o conhecimento técnico já produzido, se continuamos angustiados como no século 16? Afinal de contas, o que estamos procurando enquanto perfuramos a Terra e entupimos suas veias? Outra interpretação digna de registro: um leitor disse que eu estava incentivando os alunos a estudarem somente o necessário para passar no vestibular. Sim, foi isso mesmo que eu disse. Estudem somente o necessário para passar no vestibular, pois as nossas universidades, com toda a sua pomposa sabedoria, até agora não conseguiram criar um método mais humano para selecionar entre os gênios e os débeis mentais. Não é esse o resultado de um vestibular? Selecionar entre gênios e bestas? Talvez não seja essa a intenção, mas é isso que a sociedade vê. Quem reprova no teste da inteligência, não serve para a vida. É um pária! Se estivesse ao meu alcance, demoliria a instituição “universidade” e não deixaria uma única parede em pé. Essa representante do conhecimento humano está nos levando ao caos, à morte planetária. E não venham me dizer que é culpa dos ratos. A culpa é de quem detém o conhecimento e se omite, enquanto os ratos continuam furando o queijo. Os adolescentes estão sós. Já nem esperam professores amigos que falem e entendam sua linguagem. Apenas aceitam. E os professores continuam repassando os conhecimentos. Seus questionamentos são superficiais e inócuos. Na raiz da universidade brasileira está escrito que o conhecimento essencial deve vir necessariamente do Hemisfério Norte. O que se produz no Brasil não passa de complementos, com as dignas, valorosas e pouquíssimas exceções. E não me venha um professor-leitor dizer que estou vilipendiando a sua classe. A crítica jamais será capaz de atingir negativamente um bom mestre. Uma resposta a um leitor em particular: como Fernando Pessoa, também vejo o Binômio de Newton, ou mesmo as equações de 2º Grau, como verdadeiras jóias produzidas pela mente humana. Mas preferi esquecer esses conhecimentos, “raspar as tintas com que me pintaram”, como diz o poeta português, e reconstruir-me através das minhas próprias descobertas.
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